Para o bem de ambos e do Mercosul, Brasil e Argentina parecem começar a desarmar os espíritos e deixar para trás as recentes hostilidades, vocalizadas especialmente pelo presidente Jair Bolsonaro e pela contraparte, Alberto Fernández, empossado na segunda-feira. O distensionamento iniciou-se ainda durante a semana passada, com a oportuna visita do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, a Buenos Aires, quando o novo mandatário do país vizinho sinalizou ao deputado a intenção de buscar uma boa convivência com o governo brasileiro, propósito reafirmado em seu discurso de investidura no cargo.
Para Brasil e Argentina, não há outro caminho que não o da integração, que precisa passar por cima das diferenças ideológicas dos governantes de ocasião
Fernández teve os seus dias de escorregadas verbais e simbólicas, mas recobrou a sensatez. Corrigiu o rumo e agora vai na direção correta ao ressaltar que, para os dois países, unidos pela história e pelo determinismo geográfico, não há outro caminho que não o da integração, que precisa passar por cima das diferenças ideológicas dos governantes de ocasião. Mesmo que não existam simpatias pessoais, são os interesses duradouros comuns dos Estados que devem prevalecer. Na linha da moderação e da crítica à polarização, Fernández acertou ainda ao assegurar que não pretende romper com organismos internacionais e ao conclamar a população argentina a sepultar a era do ódio e do rancor.
Um clarão de bom senso também iluminou Bolsonaro, ao voltar atrás na absurda posição de boicotar a posse de seu agora colega. O equívoco histórico que estava prestes a se materializar partia mais uma vez da noção distorcida de que gostos particulares podem sobrepor-se às funções institucionais do mais alto posto da República. O comparecimento do vice, Hamilton Mourão, na posse de Fernández ajudou a restabelecer a dimensão do evento e foi um indicador de que será possível reconstruir pontes com a Argentina, um dos mais relevantes parceiros do Brasil tanto no aspecto comercial quanto estratégico. O general, aliás, tem se mostrado um exímio bombeiro das relações internacionais brasileiras, de certa forma repetindo a missão que cumpriu exemplarmente no início do ano, em viagem à China, desfazendo mal-estar criado ainda na época da campanha eleitoral.
Mourão resumiu bem a questão: Brasil e Argentina precisam se ajudar. Já bastam os problemas internos que ambos enfrentam. Não há sentido em criar e alimentar uma frente de tensão entre o Planalto e a Casa Rosada. Se o pragmatismo necessário vai mesmo triunfar, os próximos anos dirão. Mas, neste momento, deve ser saudada a busca por serenar ânimos e o aceno recíproco à cooperação.