Por Ely José de Mattos, economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS
Só o Censo Demográfico é capaz de nos contar qual é a estrutura familiar, nos mínimos detalhes, daquelas crianças que estão atrasadas na escola, ou esclarecer que tipo de trabalho têm as pessoas com deficiência, ou oferecer base amostral de qualidade para pesquisas eleitorais. Só ele é capaz de trazer esse tipo de informação para os quase 6 mil municípios brasileiros. Enfim, nos oferece o que há de mais crucial para fazer política pública de qualidade: informação.
Pois essa pesquisa está sob ameaça de ser prejudicada em nome do ajuste fiscal. O custo estimado para a operação era de R$ 3,4 bilhões (cerca de R$ 16 por habitante). Montante este que já deve ser reduzido em 25%, segundo reportagem do Valor Econômico. E a pressão parece persistir.
O ministro Paulo Guedes tem feito declarações sobre o tema, questionando a necessidade de o Censo ser tão longo – o Censo 2010 teve 49 perguntas para todos e outras 70 para uma amostra de 11% dos domicílios. Em fevereiro, na cerimônia de posse da nova presidente do IBGE, Susana Cordeiro Guerra afirmou que “o Censo de países ricos tem 10 perguntas”. Para os Estados Unidos esta afirmação até tem algum sentido. Mas a maior parte dos países desenvolvidos tem pesquisas maiores do que isso. Aliás, nos EUA também acontece uma discussão ferrenha sobre o Censo: o custo estimado para o Censo 2020 deles é de aproximadamente R$ 62,4 bilhões (usando a taxa de R$/US$ 4) – R$ 190 por pessoa, ou seja, 11 vezes mais caro que o brasileiro.
O ministro também afirmou, naquela ocasião, que se “perguntar demais, vai acabar descobrindo coisas que nem queria saber”. Ou seja, em nome do ajuste fiscal, uma opção por não saber! Sim, pois o intuito de uma pesquisa tão abrangente como o Censo é justamente descobrir o máximo possível sobre a população, em todos os confins do Brasil.
Por fim, ainda sugeriu que o IBGE vendesse parte dos seus prédios para “fazer o Censo bem-feito”. Ou seja, há o reconhecimento de que é preciso recurso para que a pesquisa seja realizada adequadamente. O que não está acontecendo é uma negociação com boa condução técnica e política por parte do ministério, para que se chegue a um bom termo. Em vez disso, a lastimável opção pela ignorância estatística – o que não é exatamente uma novidade nos últimos tempos.