Por Sergio Roithmann, chefe do Serviço de Oncologia do Hospital Moinhos de Vento
Em 1971, os Estados Unidos estavam enredados na guerra do Vietnã. Pressionado, o presidente Richard Nixon resolveu disparar um conflito mais popular: a guerra contra o câncer. Foi uma injeção imediata de 100 milhões de dólares, e depois de bilhões, em uma missão: a cura do câncer em uma década. E aonde chegamos?
Fizemos grandes progressos. Desenvolvemos a quimioterapia e a radioterapia. Combinadas com esses tratamentos, as cirurgias ficaram menos mutiladoras. Curamos algumas leucemias, linfomas e câncer de testículo. Diagnosticamos mais precocemente o câncer de mama, intestino, colo uterino e próstata. Passamos a curar três de cada quatro desses casos mais iniciais. Combatemos o tabagismo, e as mortes por câncer de pulmão diminuíram.
Desvendamos a biologia do câncer. É uma célula normal transformada, com defeitos em genes e cromossomos. Adquire superpoderes, mas tem pontos fracos. Cada câncer é diferente do outro. Estamos descobrindo medicações personalizadas. Controlamos a leucemia mieloide crônica com um comprimido tomado para sempre: esse foi um marco e indicou um novo caminho.
Se não podemos curar, podemos controlar a doença por mais tempo. Aprendemos a cuidar melhor, e os pacientes têm melhor qualidade de vida. Descobrimos o valor da imunoterapia. Estamos reprogramando nosso sistema imunológico para combater o câncer. Curamos melanomas e aumentamos o tempo de vida de pessoas com muitos outros tumores. Aprendemos a identificar famílias de risco e prevenimos muitos cânceres hereditários.
Mas os Estados Unidos não venceram a guerra do Vietnã, e Nixon não venceu a sua guerra contra o câncer. Talvez porque não seja uma guerra, e nós, médicos, pesquisadores e pacientes, não sejamos guerreiros. Somos humanos e temos nossos limites. Somos mortais e ainda precisamos digerir essa ideia. Enquanto isso, como seres inconformados, seguimos trabalhando e pesquisando intensamente para superar esses nossos limites.