* Sociólogo, professor e pesquisador da PUCRS
Na semana em que a Câmara Federal garantiu a imunidade ao presidente Temer quanto aos crimes apontados na denúncia do procurador-geral da República, dois outros fatos indicaram o que está em andamento na área da segurança pública.
O primeiro foi o evento "Brasil de Ideias", em que ministros debateram com empresários as propostas do governo para a segurança, liderados pelo ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general Sérgio Etchegoyen. As orientações dadas foram claras: teses e dissertações são inúteis; a mídia precisa ser "compreensiva" com o que tem que ser feito, pois haverá "incidentes"; em uma guerra, acontecem "coisas indesejáveis", até "injustiças". Mas não sejamos politicamente corretos, pois isso nos impede de discutir qualquer coisa. Recado dado.
Poucos dias depois, vem a público um manifesto, liderado por integrantes do Ministério Público, a maioria deles do Rio Grande do Sul (100), contra o "garantismo e a bandidolatria". Segundo o documento, juízes garantistas e professores esquerdistas de fato defendem bandidos, e propostas como audiências de custódia, controle sobre as autoridades judiciais e garantias processuais são "democidas", ou seja, visam ao extermínio do povo e à proteção e à impunidade de criminosos.
Desses luminares, não se ouve uma palavra sobre planejamento de ações de segurança integradas, qualificação da investigação policial, retomada do controle do Estado sobre o ambiente carcerário ou políticas de prevenção. Não discutem o fato de que o Rio Grande do Sul aumentou em 30% sua população carcerária nos últimos três anos, e o resultado é pífio na redução da criminalidade.
O cerco se fecha. Quando a instituição apontada na Constituição como zeladora dos direitos e garantias fundamentais se rende ao mais rasteiro populismo punitivo, e a autoridade federal que hoje dá as cartas na política de segurança já antecipa o atropelo a direitos como efeito colateral mas necessário da guerra contra o crime, e pede a conivência da mídia, já foram às favas todos os escrúpulos. E, com eles, a democracia.