A Polícia Federal deflagrou ontem uma operação destinada a apurar fraudes na polêmica Lei Rouanet, criada para incentivar a cultura, mas nem sempre utilizada com esse propósito. De acordo com os investigadores, grupos especializados conseguiam aprovar projetos no Ministério da Cultura e depois procuravam a iniciativa privada para negociar a renúncia fiscal com vantagens para as duas partes e prejuízos para o governo. Assim, por meio de superfaturamentos, apresentação de notas fiscais alteradas ou projetos simulados, conseguiam desviar recursos para os próprios bolsos.
As fraudes vêm ocorrendo há vários anos por falta de controle e fiscalização. Tanto que a Lei Rouanet já passou por uma série de questionamentos, especialmente quando artistas consagrados utilizaram recursos de renúncias tributárias em espetáculos e obras de alta rentabilidade comercial. Como a lei não faz distinção entre quem precisa do incentivo e quem não precisa, essa depuração deveria ser feita pela Comissão Nacional de Incentivo à Cultura, colegiado formado exatamente para avaliar propostas e autorizá-las ou rejeitá-las. Infelizmente, o órgão não tem cumprido adequadamente o seu papel.
Além de eventuais abusos, porém, o que mais preocupa são as fraudes, como as que agora estão sendo apuradas pela Polícia Federal e pela Controladoria-Geral da União. As investigações flagraram empresas e escritórios especializados em pagamento de propinas para produtores culturais, com o propósito de subtrair recursos públicos que poderiam ser utilizados em benefício da sociedade. A Operação Boca-Livre, como foi batizada pela Polícia Federal, escancara a incompetência do poder público para a autofiscalização. E evidencia uma verdade inquestionável: a transparência continua sendo o melhor desinfetante moral.