Por ter sido alvo da deselegância de petistas como Tarso Genro, que sugeriram sua renúncia no início do segundo mandato, porque o governo ia mal, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso deveria ser mais respeitoso com a presidente Dilma Rousseff. Sugerir que ela renuncie como um ato de grandeza é, no mínimo, uma inconveniência retórica. FHC já havia escrito isso no Facebook, mas a sua sugestão ganhou outra dimensão ao ser dita no programa Roda Viva, da TV Cultura.
Será que FHC considera mesmo um ato de grandeza a presidente renunciar para entregar o poder ao vice, Michel Temer? Ou espera que Temer também renuncie para permitir a realização de novas eleições? A se julgar pelo que escreveu em seu livro de memórias, a opinião de FHC sobre Temer não era das melhores quando estava no Planalto. Mudou Temer ou mudou o ex-presidente?
É chover no molhado dizer que a renúncia é um ato unilateral de vontade. Dilma pode até renunciar, cansada de dar murro em ponta de faca, mas não há qualquer garantia de que isso resolva a crise em que o país está mergulhado.
O mesmo FHC que sugere a renúncia de Dilma diz que ela é uma mulher honrada e insinua que não pode dizer o mesmo de Lula. Então, a mulher honrada deveria jogar a toalha e deixar a vaga para homens que o próprio ex-presidente criticava por defenderem interesses menores durante seu governo? Há algo de incoerente no discurso do príncipe dos sociólogos.
No mesmo livro, resultado de um diário de seus oito anos na Presidência, FHC confessa que pensou em intervir na Petrobras depois de ser alertado pelo empresário Benjamin Steinbruch, em 1996, de que a estatal era "um escândalo". Isso equivale a pecar por omissão, deixando a porta aberta para a roubalheira que a Lava-Jato escancarou, mas ele disse no Roda Viva que se referia a irregularidades administrativas.
Só os fanáticos pelo PT acham que o governo está bem. Não está, mas nem por isso a renúncia seria um ato de grandeza. Se Dilma entregasse os pontos, a política econômica do sucessor não seria muito diferente da do ministro Joaquim Levy. Ou alguém acha que outro no lugar dela dirá que não precisa da CPMF ou de outra fórmula para aumentar receita?