Com a suspeita de desvios de recursos de financiamentos, o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) criou um grupo de trabalho para fiscalizar o cadastro de produtores de Santa Cruz do Sul e Sinimbu no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). Os técnicos têm 45 dias, prorrogáveis por outros 45, para elaborar um relatório final.
A medida é uma das respostas do MDA às denúncias de fraudes no Pronaf investigadas no Rio Grande do Sul. Segundo inquérito da Polícia Federal, um suposto esquema operado pela Associação Santa-Cruzense dos Agricultores Camponeses (Aspac) teria lesado 6,3 mil produtores e movimentado R$ 79 milhões.
A entidade era autorizada desde 2004 pelo ministério para realizar o cadastro de produtores no programa federal por meio de um documento chamado Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP). Em Santa Cruz e Sinimbu, a Aspac credenciou 3.698 agricultores, que correspondem a 57% das DAPs dos dois municípios.
Após as denúncias, o MDA optou por descredenciar de forma preventiva a associação e determinou a verificação das DAPs emitidas. A fiscalização será realizada pelo grupo de trabalho, composto por seis integrantes, conforme a Portaria 76 de 11 de novembro de 2014, assinada pelo ministro Miguel Rossetto.
O documento autoriza a equipe a avaliar o cumprimento das normas de concessão das DAPs emitidas em Santa Cruz e Sinumbu a partir de 1º de janeiro de 2008. A fiscalização será feita com visitas às cidades, reuniões técnicas, levantamentos de dados e consultas a especialistas. O grupo tem 45 dias, prorrogáveis por mais 45, para elaborar um relatório conclusivo sobre os cadastros. Na prática, terá até fevereiro para apresentar um parecer.
"Há denúncias que, do nosso ponto de vista, são graves, porém, são localizadas. Preventivamente estamos fazendo a fiscalização das DAPs. Nosso objetivo é saber se esses agricultores habilitados pelo nosso sistema na região, realmente, são agricultores familiares", explicou o secretário-executivo do MDA, Laudemir Müller.
O secretário participou na manhã desta quinta-feira de uma audiência na Comissão de Agricultura do Senado, proposta pela senadora Ana Amélia Lemos (PP-RS), que tratou sobre as suspeitas de desvios no Pronaf. Além de Müller, compareceram membros da Controladoria-Geral da União (CGU) e do Tribunal de Contas da União (TCU). Ministério Público Federal (MPF), Polícia Federal e Banco do Brasil não enviaram representantes.
Os órgãos de controle apresentaram auditorias realizadas desde 2008 no Pronaf, nas quais verificaram financiamentos concedidos para beneficiários acima da renda estabelecida pelo programa, recursos dos empréstimos usados em outras finalidades e a liberação de mais de uma DAP por CPF, o que não é permitido. Também foi identificada baixa fiscalização dos bancos sobre a execução dos contratos de empréstimos.
"O mérito do programa não é discutido, é um programa espetacular de inclusão social e de valorização da agricultura familiar. Estamos tratando das fraudes no processo. É necessário redobrar os cuidados na fiscalização. Hoje, o documento DAP é autodeclaratório, então precisa de acompanhamento nos cruzamentos dos dados", destacou a senadora Ana Amélia Lemos.
Apesar de o governo federal ter cumprido boa parte das recomendações feitas nos últimos anos, os técnicos chamaram atenção para vulnerabilidades no preenchimento das DAPs, já que os dados fornecidos pelos agricultores não necessitam de comprovação.
"Falta um sistema de controle para verificar as informações dos usuários do programa", destacou Charles Evangelista, diretor da Secretaria de Macroavaliação Governamental do TCU.
Secretário Federal de Controle Interno da CGU, Valdir Agapito Teixeira reforçou a necessidade de aprimorar o cadastro, com o compartilhamento de bancos de dados e a troca de informações com os bancos, que liberam os empréstimos.
"Pelas dimensões, não é um programa com alto índice de irregularidades. É interessante revisitar o fluxo de informações para ver o que pode ser melhorado", disse Teixeira.