Os católicos da Nicarágua celebraram, nesta sexta-feira (29), uma via-crúcis restrita ao entorno das igrejas, devido à proibição governamental que vigora há dois anos para as procissões tradicionais nas ruas.
As celebrações da Semana Santa foram realizadas em meio a tensões entre a Igreja Católica e o governo de Daniel Ortega, após a detenção de cerca de 20 clérigos durante as comemorações do Natal e do Ano Novo. Após um acordo com o Vaticano, eles foram libertados em 14 de janeiro e enviados a Roma.
As relações entre o governo e a Igreja se deterioraram durante os protestos antigovernamentais de 2018, que deixaram mais de 300 mortos, segundo a ONU. O presidente os considerou uma tentativa de golpe de Estado, patrocinada por Washington e apoiada por parte do clero.
A polícia deve autorizar qualquer atividade pública, inclusive as religiosas.
"Penso que o importante não é tanto a distância que podemos caminhar, mas como caminhamos (...) As grandes coisas às vezes vêm em copos pequenos", disse à AFP o cardeal Leopoldo Brenes, que liderou a via-crúcis na catedral de Manágua.
Julián Pérez, um dentista de 65 anos, que durante a celebração ajudou a carregar a imagem do Jesus crucificado, disse à AFP que participou da celebração em agradecimento a milagres. "Tive covid, estive preso (por acidente), fiquei gravemente doente".
Pérez contou que até dois anos atrás, a procissão começava perto de um colégio católico e percorria várias ruas de Manágua. "Agora, tudo é aqui dentro da catedral", ressaltou.
Fátima Leytón, comerciante de 29 anos, percorreu de joelhos as 14 estações da via-crúcis para pagar uma promessa e pedir a melhora de seu esposo, que está "lutando contra o câncer".
Entre os sacerdotes que o governo libertou há dois bispos, incluindo o monsenhor Rolando Álvarez, duro crítico de Ortega, que estava detido desde agosto de 2022. Em outubro passado, outros 12 clérigos detidos já tinham sido libertados e enviados também a Roma.
Em 29 de fevereiro, um grupo de especialistas em direitos humanos da ONU disse, em Genebra, que a repressão a toda oposição real ou imaginária na Nicarágua "se tornou mais sutil" e visa "estudantes universitários, povos indígenas, povos afro-descendentes, camponeses e membros da Igreja Católica e de outras confissões cristãs".
Ao rejeitar o informe, o governo de Ortega afirmou que carece de credibilidade.
* AFP