Em vídeos amplamente compartilhados na Internet, mães e esposas de soldados russos mobilizados na ofensiva militar na Ucrânia uniram forças para exigir que o presidente Vladimir Putin cumpra suas promessas.
Depois de ordenar uma mobilização parcial em setembro, o Kremlin garantiu que os milhares de soldados alistados seriam devidamente treinados, receberiam equipamentos apropriados e não seriam enviados para as linhas de frente do conflito.
Em grande parte, essas promessas se mostraram vazias até agora: soldados mobilizados morreram no "front"; homens inaptos foram recrutados, incluindo pais de família e idosos; faltam equipamentos adequados; muitos dos recém-recrutados não receberam formação militar.
Esse recrutamento desordenado obrigou as autoridades a admitirem "erros", preocupando os familiares dos soldados enviados para a Ucrânia.
Essa preocupação, que pode levar a distúrbios sociais, colocou o Kremlin em uma posição delicada. Enquanto as autoridades reprimem implacavelmente qualquer questionamento sobre a ofensiva na Ucrânia, a voz das esposas dos soldados é sagrada e, se forem presas, o impacto sobre a sociedade seria considerável.
Em um sinal de que o governo está levando o assunto a sério, Putin deve se reunir nesta sexta-feira (25), pela primeira vez, com mães de soldados enviados à Ucrânia. Há quem avalie, porém, que o encontro estará minuciosamente organizado, sem espaço para diálogo.
Putin se reunirá com "mães tiradas da manga, que farão as perguntas certas e lhe agradecerão, como sempre", lamenta Olga Tsukanova, mãe de um jovem que presta serviço militar.
"Vladimir Vladimirovitch, responda às nossas perguntas!", lança ela, que quer garantir que seu filho, de 20 anos, não seja enviado ilegalmente para o "front", ou para a fronteira com a Ucrânia, onde também caem obuses.
Ela deixou a cidade de Samara, 900 quilômetros ao leste, para ir a Moscou com a esperança de ser recebida no Kremlin. Em vão.
"Acho que eles estão com medo que eu faça perguntas incômodas. Mas precisam resolver esse problema!", insiste.
- Pedir explicações -
O presidente russo está ciente do quão delicada é a questão dos familiares dos soldados.
Em agosto de 2000, quando o naufrágio do submarino russo "Kursk" causou a morte de 118 membros da tripulação, Putin foi muito criticado, acusado de ter demorado demais para reagir. Depois disso, endureceu com a imprensa.
Durante as duas guerras da Chechênia, um movimento de mães de soldados também incomodou o poder e reforçou o sentimento de insatisfação entre os russos.
À época, devido ao clima de repressão, os protestos das mães e esposas dos militares não questionaram, diretamente, a ofensiva na Ucrânia. Ainda assim, algumas denunciaram as condições em que seus familiares foram mobilizados.
Seus lugares de mãe e esposa de homens que foram lutar pela pátria concede a elas uma legitimidade e uma espécie de proteção contra qualquer perseguição.
Na sociedade russa, "existe o sentimento inconsciente de que as mulheres têm o direito" de exigir explicações do poder, explica Alexei Levinson, sociólogo do centro independente Levada.
Essas mulheres "pedem que o Estado cumpra seu papel de 'pai coletivo' dos mobilizados", afirma Levinson, acrescentando que, "quando o Estado, ou o Comando Militar não cumprem suas funções, as mulheres reclamam".
No momento, o movimento é heterogêneo e pouco coordenado. Nas redes sociais, espalham-se os apelos de familiares que estão passando mal no "front", e coletivos informais estão sendo criados em torno de algumas figuras de destaque. Há, no entanto, mulheres que temem ter, ou causar, problemas para seus parentes mobilizados na guerra, caso falem com a imprensa -sobretudo, estrangeira.
"Enviamos cartas oficiais às autoridades", escreveu uma delas à AFP, pedindo para não ser identificada. "Não são os jornalistas que vão tirar nossos homens das trincheiras e não queremos causar ainda mais problemas para eles", declarou.
* AFP