Encurralada, a primeira-ministra britânica, Liz Truss, finalmente renunciou nesta quinta-feira (20), depois de apenas seis semanas no poder com um programa econômico radical que causou uma crise política e financeira nacional.
"Dada a situação, não posso cumprir o mandato para o qual fui eleita pelo Partido Conservador. Falei, portanto, com Sua Majestade o Rei para notificá-lo de que estou renunciando", declarou a líder de 47 anos em frente a Downing Street, em um discurso muito curto.
Uma votação para determinar seu sucessor dentro do Partido Conservador ocorrerá "na próxima semana", acrescentou a líder conservadora, que, desta forma, torna-se o chefe de governo a ter permanecido por menos tempo em Downing Street na história moderna britânica, com apenas 44 dias de mandato.
Hoje cedo, ela ainda parecia aferrar-se ao poder, com seu porta-voz garantindo que ela estava "trabalhando" com seu ministro das Finanças, Jeremy Hunt, para preparar seu plano econômico de médio prazo, após uma quarta-feira catastrófica para ela.
Ao final da manhã, porém, reuniu-se com o deputado à frente do poderoso Comitê 1922, encarregado da organização interna do Partido Conservador - e, portanto, de um possível procedimento de substituição.
No máximo três deputados conservadores poderão se candidatar, oficialmente, à sucessão de Liz, em disputa a ser decidida pelos deputados e, possivelmente, pelos membros partidários, conforme as regras apresentadas nesta quinta pelo Partido Conservador.
"Os candidatos precisarão ter pelo menos 100 colegas (de 357 parlamentares conservadores) para patrociná-los", declarou o presidente do Comitê 1922, Graham Brady, à imprensa, acrescentando que esses "patrocínios" devem ser coletados até segunda-feira, 14h locais (10h em Brasília), para seleção até a sexta-feira seguinte.
O processo de escolha de Truss por cerca de 170.000 membros do partido no poder levou dois meses após a saída de Boris Johnson.
Logo após o anúncio de renúncia de Liz, o líder da oposição trabalhista, Keir Starmer, exigiu eleições imediatas.
"Os conservadores não podem responder à sua última confusão simplesmente estalando os dedos e mudando os que estão no topo sem o consentimento do povo britânico. Precisamos de eleições gerais (...) agora", declarou, em um comunicado.
- Rebelião nas próprias fileiras -
Nas últimas horas, o número de parlamentares reclamando sua saída não parou de aumentar.
"Liz Truss deve partir o mais rápido possível", declarou o ex-ministro conservador David Frost, em uma coluna no "Daily Telegraph".
Mais impopular do que nunca entre a opinião pública, sem um programa econômico após a humilhante renúncia aos cortes de impostos e ficando sem dois de seus ministros mais importantes, Liz Truss estava por um fio.
Em meio à crise econômica do custo de vida, com milhões de britânicos sofrendo com a inflação, o Partido Conservador relança agora uma eleição interna para encontrar um novo líder - o quinto em seis anos.
Truss foi eleita neste verão boreal, após a renúncia de Boris Johnson, em meio a uma série de escândalos em Downing Street.
Há dias circulam vários nomes para a sucessão de Liz Truss, como os de Rishi Sunak, Jeremy Hunt, Penny Mordaunt - a ministra responsável pelas relações com o Parlamento - ou ainda Boris Johnson.
O presidente de Estados Unidos, Joe Biden, prometeu continuar a "cooperação estreita" com o Reino Unido.
"Agradeço à primeira-ministra Liz Truss por sua parceria em uma variedade de questões", disse Biden em um comunicado, garantindo também que a amizade de "longa data" e a "firmeza" da aliança entre os dois países permanecerão inalteradas.
Já o presidente francês, Emmanuel Macron, disse esperar que o país recupere "rapidamente" a "estabilidade".
A diplomacia russa ironizou a renúncia de Truss e comentou que o Reino Unido "nunca havia passado por uma vergonha dessas".
- Eleições gerais -
Os conservadores decidiram evitar eleições legislativas antecipadas, que dariam vantagem à oposição trabalhista.
"Eles falham em seu dever patriótico básico de deixar os britânicos fora de suas disputas patéticas", atacou o líder trabalhista Starmer na manhã desta quinta-feira, em um discurso no Congresso de Sindicatos (TUC), em um momento em que muitos movimentos sociais agitam o país em razão da crise econômica.
Para Liz Truss, a quarta-feira virou drama. Menos de uma semana após a saída de seu ministro das Finanças, Kwasi Kwarteng, substituído por Jeremy Hunt, o novo homem forte do governo, foi a ministra do Interior, de extrema direita, Suella Braverman, que deixou o governo, devido a crescentes diferenças sobre imigração, de acordo com os jornais britânicos.
Ela foi substituída por Grant Shapps, ex-ministro dos Transportes de Boris Johnson, no que deveria ser um gesto de abertura em relação aos ex-adversários de Liz Truss na corrida por Downing Street. Shapps apoiou Rishi Sunak.
A noite foi agitada no Parlamento, onde uma votação - vencida pelo governo - sobre o levantamento da moratória sobre fraturamento hidráulico se transformou em um levante entre os conservadores.
Os deputados da maioria se recusaram a votar com o governo, apesar das represálias a que se expõem, tendo Downing Street pedido expressamente para se respeitar a instrução de voto.
* AFP