Tashi Choden não será apenas a primeira representante do Butão no concurso de Miss Universo: é também a única figura pública abertamente homossexual no país do Himalaia.
O país remoto é conhecido por sua filosofia de "Felicidade Nacional Bruta", que prioriza o bem-estar de seus cidadãos junto ao crescimento econômico.
Até fevereiro de 2021, porém, a homossexualidade era definida no Código Penal como "conduta sexual contrária às leis da natureza" e, portanto, ilegal no país budista.
Nesse sentido, a coroação de Choden como Miss Butão 2022 ganhou importância neste país de quase 800.000 habitantes e sua comunidade LGBTQIA+.
"Falo não apenas pela comunidade butanesa, mas também pela comunidade minoritária em uma plataforma como o concurso de Miss Universo", disse ela à AFP. "Eu posso ser sua voz", completou.
A jovem de 23 anos, que aos 14 perdeu os pais, contou que assumiu sua sexualidade em junho, no Internacional do Orgulho, depois de "muita pesquisa e introspecção".
Inicialmente, sentiu uma "reação muito forte" de membros de sua família religiosa e conservadora, mas considerou que era importante que fizessem parte de seu processo.
"Depois de um tempo, aceitaram, e sou muito grata por isso, porque muitas pessoas não têm a sorte de ter essa aceitação", afirmou.
"Desde que saibam que estou bem na vida, que posso ser uma mulher independente, acho que minha sexualidade não é realmente relevante para eles", acrescentou.
Embora tenha tido "algumas reações negativas" na Internet após sua coroação, o triunfo gerou apoio dentro e fora do país.
Até o primeiro-ministro do Butão, Lotay Tshering, que atua como médico nos fins de semana, parabenizou-a pessoalmente e desejou-lhe sucesso.
- Abrir caminho -
O Butão sempre traçou seu próprio caminho, baseado não apenas no crescimento econômico, mas na manutenção da saúde ecológica de seus vales e montanhas cobertas de neve.
O país é negativo em carbono, e sua Constituição exige a preservação de 60% das florestas do Butão.
Também evita o modelo de turismo global, impondo uma "tarifa de desenvolvimento sustentável" de US$ 200 por dia aos visitantes estrangeiros. Este fundo é usado para compensar sua pegada de carbono.
A televisão foi autorizada apenas em 1999, o tiro com arco é o esporte nacional, e é comum ver falos pintados nas casas para afastar os maus espíritos.
Ainda assim, membros da comunidade LGBTQIA+ relatam casos de discriminação e de estigma social, e é por isso que muitos não se assumem.
Mas a descriminalização da homossexualidade no reino em 2021 foi um sinal de crescente abertura e aceitação, diz Rinzin Galley, esteticista de gênero fluido.
"Com a descriminalização, me sinto mais confortável em público do que antes", declara Galley.
"Gosto de me maquiar e sair, mas não é normal um homem sair maquiado", comenta.
Várias mulheres transgênero mudaram seu nome e gênero em seus documentos de identidade, e a comunidade LGBTQIA+ está lentamente se tornando mais visível.
Organizações comunitárias, como Queer Voices of Bhutan e Bhutan Pride, bem como a ONG Lhak-sam, deram apoio ao setor.
E agora, com Choden representando o Butão no palco do Miss Universo, cerimônia assistida por milhões de espectadores em todo mundo, muitos estão esperançosos em relação ao futuro da juventude sexualmente diversa do país.
"Ter uma mulher gay como Miss Butão permite que o restante da comunidade sexualmente diversa, especialmente os jovens, aspirem a objetivos mais altos em suas vidas", comemora Regita Gurung, uma mulher bissexual, em conversa com a AFP.
"Esta representação abriu caminho para que o restante de nós tenha mais confiança em quem somos", acrescentou.
* AFP