Os franceses votam neste domingo (10) para eleger seu presidente, com o atual mandatário, o centrista Emmanuel Macron, e a candidata da extrema direita, Marine Le Pen, como favoritos de um disputado primeiro turno após uma campanha atípica.
O início da ofensiva russa na Ucrânia em 24 de fevereiro ofuscou a campanha eleitoral, mas o efeito nos preços da energia a devolveu ao primeiro plano, sobretudo pela inquietação sobre o poder aquisitivo.
O início da guerra impulsionou Macron, mas na reta final da campanha, sua principal adversária, Le Pen, avançou nas pesquisas, até encostar em Macron, ameaçando seu favoritismo se os dois passarem ao segundo turno em 24 de abril.
No âmbito internacional, ante Macron e seus esforços de mediação entre Kiev e Moscou, Le Pen propõe, entre outros, abandonar o comando integrado da Otan, órgão da Aliança Atlântica que estabelece a estratégia militar.
Por isso, o resultado será acompanhado de perto em todo no mundo porque uma eventual vitória da ultradireitista poderia representar um novo revés para a União Europeia (UE) e as alianças internacionais desta potência econômica e nuclear.
Dos dez candidatos restantes, o esquerdista Jean-Luc Mélenchon é o único com alguma chance de impedir neste domingo que ambos consigam passar para o segundo turno, reforçado por sua imagem de "voto útil" de uma esquerda pulverizada.
Em nível internacional, este neto de espanhóis e que foi apresentado pelo jornal conservador Le Figaro como um "Chávez francês", propõe sair da Otan em prol de "alianças altermundialistas" e quer que a França seja um país "não alinhado".
Dúvidas sobre a participação
Cerca de 48,7 milhões de eleitores são habilitados a eleger entre 12 candidatos à Presidência.
As seções de votação abriram às 08H00 locais (03H00 de Brasília) na França metropolitana para um pleito iniciado na véspera nos territórios ultramarinos e no exterior.
Os resultados serão conhecidos às 20h locais (15h de Brasília), quando as últimas seções vão fechar.
Se nenhum candidato tiver a maioria absoluta no primeiro turno, os dois mais votados se enfrentarão no segundo turno em 24 de abril.
A participação era uma das principais preocupações nos últimos dias de campanha.
Segundo dados do Ministério do Interior, a participação no meio da jornada deste primeiro turno foi de 25,48%, três pontos a menos do que em 2017 (28,54%).
A participação às 10h (7h de Brasília) foi, no entanto, quatro pontos maior do que em 21 de abril de 2002 (21,39%), ano em que se alcançou um recorde de abstenção no primeiro turno das eleições presidenciais.
Em Pantin, perto de Paris, Michèle Monnier, 77 anos, agora aposentada e que foi vigia de uma escola, votou cedo.
- As mulheres da minha época lutaram para votar, sendo assim, sejam quais forem as eleições, eu votarei - disse ao sair de uma padaria.
O primeiro turno não está isento de surpresas como em 2002, quando o ultradireitista Jean-Marie Le Pen, pai de Marine, se habilitou, contrariando todos os prognósticos, ao segundo tuno contra o conservador Jacques Chirac, que acabou se reelegendo.
A abstenção do primeiro turno então alcançou o recorde de 28,4% em uma eleição presidencial. Outra das incógnitas é saber se este percentual será superado, como acreditam muitos cientistas políticos. Em 2017, 22,2% dos eleitores não votaram no primeiro turno.
"Frente republicana"
Marine Le Pen, 53 anos, e Emmanuel Macron, 44, já disputaram as chaves do Palácio do Eliseu em 2017, que o centrista conseguiu com dois terços dos votos. Mas embora o cenário pareça se repetir cinco anos depois, o país não é o mesmo.
O coronavírus irrompeu na França no começo de 2020, confinou milhões de pessoas e deixou para trás uma primeira metade de mandato de Macron marcada por protestos sociais. A guerra na Ucrânia emergiu quando os franceses começavam a respirar.
Macron jogou, assim, a cartada de um presidente estável em tempos de crise e reformista; Le Pen se apresentou como uma defensora do poder aquisitivo, com uma imagem menos radical, evitando dar ênfase em seus temas prediletos: migrantes, islã, segurança.
Sem mudar os fundamentos da extrema direita, segundo os observadores, a candidata do Reagrupamento Nacional (RN) preferiu tentar capitalizar o descontentamento das classes populares com a política de seu adversário do A República em Marcha (LREM).
Os temas mais radicais da extrema direita ficaram nas mãos do polêmico Eric Zemmour, que com suas declarações explosivas contra os imigrantes e os muçulmanos dominou parte da campanha, pondo em dificuldades Le Pen e a candidata da direita, Valérie Pécresse.
O presidente, que entrou tarde na campanha pela gestão da pandemia e sua tentativa de mediação entre Kiev e Moscou, alertou na reta final contra o "perigo extremista". Os especialistas duvidam que o cordão sanitário em torno da extrema direita vá funcionar em 2022 como ocorreu em 2017.
Para o diretor da Fundação Jean-Jaurès, Gilles Finchelstein, a tradicional "frente republicana" de partidos não bastará para isolar Le Pen no segundo turno, já que, embora este sistema não tenha desaparecido, está desgastado.
Os candidatos socialista Anne Hidalgo, ecologista Yannick Jadot, e comunista Fabien Roussel já disseram que vão pedir votos contra a extrema direita se Le Pen passar para o segundo turno. Já Valérie Pécresse, do partido Os Republicanos (LR), não indicará voto.
Na França, as atenções também se voltarão para o alcance do aguardado fiasco dos partidos tradicionais: a direita ex-presidentes Chirac (1995-2007) e Nicolas Sarkozy (2007-2012) e os socialistas de François Hollande (2012-2017) e François Mitterrand (1981-1995).