Uma mulher grávida e seu bebê morreram depois que a Rússia bombardeou a maternidade onde ela deveria dar à luz, apurou a agência Associated Press. Imagens da mulher sendo levada às pressas para uma ambulância em uma maca correndo o mundo simbolizando o horror de um ataque aos mais inocentes da humanidade. O Ministério das Relações Exteriores ucraniano confirmou as mortes em redes sociais.
Em vídeo e fotos tiradas na quarta-feira (9) por jornalistas da AP após o ataque ao hospital, a mulher foi vista acariciando seu abdômen ensanguentado enquanto os socorristas a levavam pelos escombros da cidade sitiada de Mariupol, na Ucrânia, com seu rosto pálido refletindo seu choque com o que havia acabado de acontecer.
Este foi um dos momentos mais brutais capturados em imagens até agora na guerra da Rússia contra a Ucrânia que já completa 19 dias.
A mulher foi levada às pressas para outro hospital, ainda mais próximo da linha de frente, onde os médicos trabalharam para mantê-la viva. Ao perceber que estava perdendo seu bebê, disseram os médicos, ela gritou para eles:
— Me matem agora!
O cirurgião Timur Marin encontrou a pélvis da mulher esmagada e o quadril descolado. Os médicos fizeram o parto do bebê por cesariana, mas ele "não mostrou sinais de vida", disse o cirurgião. Então, eles se concentraram na mãe.
— Mais de 30 minutos de reanimação da mãe não produziram resultados — disse Marin no sábado (12). — Ambos morreram.
A mulher faz parte de um número de civis mortos na guerra na Ucrânia que a ONU estima em 596, embora tenha dito que "acredita que os números reais sejam consideravelmente maiores". O governo ucraniano já apontou um número de mortos na casa dos milhares.
A história da mulher ilustra a situação perigosa que as grávidas enfrentam na Ucrânia, onde pelo menos 31 ataques a instalações ou equipamentos de saúde foram documentados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) desde o início do ataque da Rússia, há duas semanas e meia.
De acordo com a ONU, "80 mil mulheres ucranianas devem dar à luz nos próximos três meses, enquanto oxigênio e suprimentos médicos, inclusive para o tratamento de complicações na gravidez, estão perigosamente baixos".
Rússia nega ataque a civis
No caos após o ataque aéreo de quarta-feira passada (9), os médicos não tiveram tempo de obter o nome da mulher antes que seu marido e seu pai chegassem para levar o corpo. Pelo menos alguém veio buscá-la, eles disseram, para que ela não acabasse nas valas comuns sendo cavadas para muitos dos crescentes números de mortos de Mariupol.
Acusadas de crimes de guerra, autoridades russas alegaram que a maternidade havia sido tomada por extremistas ucranianos para usar como base, e que nenhum paciente ou médico foi deixado dentro. O embaixador da Rússia na ONU e a embaixada da Rússia em Londres chamaram as imagens de "notícias falsas".
Jornalistas documentaram o ataque e viram as vítimas e os danos em primeira mão. Eles gravaram vídeos e fotos de várias mães grávidas manchadas de sangue fugindo da maternidade explodida, médicos gritando e crianças chorando.
A equipe da agência AP localizou as vítimas na sexta (11) e no sábado no hospital para onde foram transferidas, nos arredores de Mariupol.
Em uma cidade que está sem alimentos, água, energia ou aquecimento há mais de uma semana, a eletricidade dos geradores de emergência é reservada para as salas de cirurgia.
Enquanto os sobreviventes descreviam sua provação, explosões do lado de fora abalavam as paredes. Os bombardeios e tiros na área são esporádicos, mas implacáveis. As emoções estão à flor da pele, mesmo quando médicos e enfermeiros se concentram em seu trabalho.
A blogueira Mariana Vishegirskaya deu à luz uma menina no dia seguinte ao ataque aéreo e passou o braço em torno da recém-nascida Veronika enquanto ela contava o atentado de quarta-feira. Depois que fotos e vídeos a mostraram descendo escadas cheias de destroços e segurando um cobertor em torno de seu corpo de grávida, autoridades russas alegaram que ela era uma atriz em um ataque encenado.
— Aconteceu no dia 9 de março no Hospital nº 3 de Mariupol. Estávamos deitadas em enfermarias quando vidros, molduras, janelas e paredes se separaram — disse Mariana, ainda vestindo o mesmo pijama de bolinhas de quando fugiu.
— Não sabemos como isso aconteceu. Estávamos em nossas enfermarias e alguns tiveram tempo de se cobrir, outros não.
Mariupol sitiada
Sua provação foi uma entre muitas em Mariupol, que se tornou um símbolo de resistência à tentativa do presidente russo, Vladimir Putin, de esmagar a Ucrânia e redesenhar o mapa-múndi a seu favor. O fracasso em subordinar Mariupol levou as forças russas a ampliarem sua ofensiva em outros lugares da Ucrânia .
Enquanto isso, a cidade portuária do Mar de Azov de 430 mil habitantes, chave para a criação de uma ponte terrestre da Rússia para a Crimeia, anexada à Rússia, está morrendo de fome lentamente.
Na nova e improvisada maternidade, cada parto que se aproxima traz uma nova tensão. Uma das mães perdeu alguns dos dedos dos pés no bombardeio. Os médicos fizeram uma cesariana na sexta-feira, retirando cuidadosamente a filha e esfregando vigorosamente o recém-nascido para estimular sinais de vida.
Depois de alguns segundos sem fôlego, o bebê chorou. Aplausos de alegria ressoam pela sala. A recém-nascida Alana chora, sua mãe chora e os médicos enxugam as lágrimas dos olhos.
O conselho da cidade de Mariupol disse na quinta-feira (10) que três pessoas, incluindo uma criança, foram mortas, enquanto 17 — entre elas crianças, mulheres e profissionais de saúde — ficaram feridas. O presidente ucraniano, Volodmir Zelensky, chamou o ataque de "atrocidade".
— Que país é esse, a Federação Russa, que tem medo de hospitais e maternidades e os destrói? — Zelensky disse em um discurso em vídeo na quarta-feira.
Líderes globais condenaram o ataque , com o ministro das forças armadas da Grã-Bretanha, James Heappey, chamando-o de "crime de guerra".
Com agências internacionais.