Khalil Haqqani, membro de uma das organizações terroristas mais poderosas do mundo e um dos nomes mais procurados pelos Estados Unidos, voltou coberto de glórias ao Afeganistão. A rede Haqqani, vinculada à Al-Qaeda, foi incumbida pelo Talibã de cuidar da segurança da capital, Cabul. A informação foi confirmada pelo ex-chanceler afegão Abdullah Abdullah, que participa das negociações com os extremistas para formar um novo governo no Afeganistão.
Na sexta-feira (20), a maior mesquita de Cabul estava lotada para oração quando um grupo de combatentes do Talibã entrou. Eram membros das forças especiais que faziam a escolta de Haqqani. Eles se vestiam como os comandos das Forças Armadas do agora deposto governo afegão, com uniformes e capacetes, óculos de visão noturna, e se portavam como profissionais.
O grupo abriu espaço para Haqqani na primeira fila, onde ele observou a cerimônia religiosa com um fuzil M4 de fabricação americana ao seu lado. Depois que o sermão terminou, Haqqani levantou-se para se dirigir aos presentes.
— Nossa primeira prioridade para o Afeganistão é a segurança — disse.
— Se não há segurança, não há vida. Daremos segurança, depois daremos economia, comércio, educação para homens e mulheres. Não haverá discriminação— disse, sendo ovacionado.
A cena de sexta-feira é um lembrete de que o Talibã conta com grande apoio em muitos lugares do Afeganistão, embora seja difícil saber o tamanho desse suporte e quanto tempo ele deve durar.
Haqqani ficou exultante com a recepção calorosa. Na longa história do envolvimento dos EUA no Afeganistão, poucos grupos desempenharam um papel tão importante quanto a rede Haqqani. Fundada pelo célebre comandante mujahedin Jalaluddin Haqqani, no final dos anos 70, ela lutou contra a ocupação soviética, de 1979 a 1989, e se uniu ao Talibã, nos anos 90.
Os EUA suspeitam que a rede Haqqani tenha ajudado na fuga de Osama bin Laden de Tora Bora, em 2001. Khalil Haqqani é irmão e tio do vice-líder do Talibã, Sirajuddin Haqqani. Após a invasão americana, o clã Haqqani executou operações que complicaram a estabilização do Afeganistão. Serviços de inteligência ocidentais estimam que o grupo tenha cerca de 10 mil combatentes.
Atualmente, Khalil Haqqani integra as listas de terroristas dos EUA e das Nações Unidas. O Departamento do Tesouro dos EUA oferece uma recompensa de US$ 5 milhões por informações que levem à sua captura.
Após o sermão de sexta-feira, assim que a multidão diminuiu, Haqqani pediu para falar com um fotógrafo do New York Times que trabalha em Cabul. Ele disse que os jornalistas estariam seguros agora que o país estava em paz e garantiu que as mulheres também seriam protegidas.
— Temos boas intenções — afirmou.
Segundo um oficial da inteligência britânica ouvido sob condição de anonimato, Haqqani e a Al-Qaeda têm uma longa história juntos e "é altamente improvável que eles cortem os laços".
O ex-diplomata britânico Ivor Roberts disse à Voz da América que designar membros da rede Haqqani para supervisionar a segurança de Cabul é como "colocar uma raposa para tomar conta de um galinheiro".
Roberts, analista do Counter Extremism Project, que pesquisa grupos extremistas, ficou surpreso com a notícia.
— Do ponto de vista de relações públicas, achei que o Talibã seria mais esperto. Em vez disso, eles estão apresentando os piores elementos de sua coalizão e enviam um sinal terrível para mulheres, meninas e sociedade civil.
No domingo (15), questionado sobre um possível ressurgimento da Al-Qaeda no Afeganistão, o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, disse que seria do "interesse do próprio" Taleban não abrigar nenhum grupo terrorista que ameace prejudicar o Ocidente.
— Eles sabem o que aconteceu da última vez que deram proteção a um grupo terrorista que atacou os EUA. Não é do interesse deles permitir uma repetição disso — disse Blinken ao programa Meet the Press, da TV NBC.