A Antártica, um território que não pertence a nenhum país segundo o direito internacional, é subordinada a uma governança incomum que deixa os profissionais de turismo - uma das únicas atividades econômicas autorizadas no continente gelado - com muita liberdade para se autorregulamentarem.
Assinado há 60 anos, Estados Unidos e a então União Soviética (algo notável em plena Guerra Fria), o Tratado Antártico, ao qual o Brasil aderiu em 1975 define o continente como um território de paz e ciência, e congela as reivindicações territoriais.
O tratado foi complementado com várias ferramentas, entre outras o Protocolo de Madri sobre a proteção do Meio Ambiente, em 1991, cujo objetivo é minimizar o impacto humano.
Ao fazer da Antártica uma "reserva natural" onde a exploração dos recursos minerais está proibida, o Protocolo e seus apêndices condicionam as atividades humanas a estudos prévios de impacto ambiental.
Estes textos proporcionam um marco geral para a introdução voluntária de espécies vegetais e animais, as descargas no mar de hidrocarbonetos, lixo ou águas residuais sem tratamento e ao exigir a repatriação de resíduos.
A indústria turística criou em 1991 a Associação Internacional de Operadores Turísticos Antárticos (IAATO, na sigla no inglês), lançada por sete operadores turísticos interessados em ter uma coordenação sobre movimentos de navios, segurança e proteção do meio ambiente.
A IAATO, que reúne atualmente quase todas as empresas do setor, é convidada anualmente a reuniões dos signatários do Tratado Antártico onde apresenta um balanço do turismo na Antártica e proposta para definir as normas.
- Nem lixo, nem pichações -
As regras existentes são muito estritas. Estipulam, por exemplo, que só as embarcações com menos de 500 passageiros podem abordar o continente, desembarcando um máximo de cem pessoas por vez, em locais pré-determinados.
Os visitantes devem ser supervisionados por guias (na proporção de 1 para 20) e não devem levar alimentos, nem deixar nada. Tampouco podem levar nenhum suvenir.
"Todos saem ganhando: o meio ambiente antártico, os Estados, mas também as próprias empresas porque, ao impor padrões ambientais muito altos, aumentam a dificuldade e o custo de penetração no mercado antártico para novos atores e evitam o turismo de massa", escreve a especialista Mikaa Mered no livro "Les mondes polaires" (Os mundos polares, em tradução livre).
Este ano, umas cem empresas membros da IAATO se manifestaram a favor de medidas para evitar colisões de embarcações com baleias e restrições adicionais sobre o uso de drones. Também apoiaram o desenvolvimento de áreas marinhas protegidas.
Com exceção do criado no Mar de Ross em 2016, a criação de santuários marinhos ao redor da Antártica tropeça desde 2010 na oposição de China e Rússia.
Pequim e Moscou estão preocupados sobre os efeitos que teriam no setor pesqueiro e temem que semelhantes regulamentações ambientais podem apoiar as reivindicações territoriais dos países que as promovem, disse Mered.
Lançada por Austrália, França e União Europeia, a iniciativa de criar enormes santuários em três áreas marinhas fracassou no começo de novembro em Hobart (Austrália) na reunião anual da Comissão para a Conservação dos Recursos Vivos Marinhos Antárticos (CCRVMA).
Também parte do Sistema do Tratado Antártico, a CCRVMA assinada em 1980 regulamenta a exploração das populações de peixes, enquanto protege o meio ambiente marinho.
* AFP