Depois que sérios contratempos em abril levaram a novos casos de pólio, o Paquistão está renovando sua estratégia de vacinação em mais uma tentativa de acabar com o vírus.
O país é um de apenas três – junto com o Afeganistão e talvez a Nigéria – em que a pólio ainda é endêmica. A erradicação do vírus no Paquistão é crucial para as medidas que visam livrar o mundo da pólio de uma vez por todas.
Agora, a campanha de erradicação no Paquistão anunciou que as equipes de vacinação terão uma abordagem mais amigável, farão menos perguntas, menos visitas de acompanhamento e deixarão de registrar informações detalhadas sobre as famílias que visitam.
As pessoas se sentiam intimidadas com as perguntas, e os vacinadores passavam muito tempo preenchendo os formulários de registro introduzidos em 2016, disse Babar Atta, o coordenador da pólio do gabinete do primeiro-ministro, de acordo com a mídia local.
Um novo programa de vacinação está previsto para a segunda semana de junho; milhares de equipes vão se espalhar pelo país, tentando chegar a quase 40 milhões de crianças com menos de dez anos.
Muitos vacinadores vão de casa em casa, enquanto outros vão procurar famílias com crianças pequenas em campos de refugiados, estações de trem e ônibus e em postos de controle rodoviários.
O Paquistão teve 17 casos de pólio este ano; houve apenas três no mesmo período do ano passado, e apenas 12 ao todo em 2018.
Em meados de abril, o pânico generalizado entre os pais em Peshawar e nas áreas tribais ao norte forçou a suspensão de um programa nacional de imunização. Um vídeo alarmista, que mostra crianças desmaiando depois de receber uma dose da vacina com validade vencida, se espalhou no Twitter.
O vídeo parecia obviamente falso. Nele, os meninos caíam nas camas de hospital, em fila, após o aceno de mão do narrador; um deles chegou até mesmo a fazer caretas para a câmera. Além disso, a vacina vencida é inofensiva.
No entanto, "nossos canais de TV estavam interessados em cobrir esse absurdo", disse, em uma entrevista em Nova York, Aziz Memon, executivo do setor têxtil que lidera o envolvimento do Rotary International na campanha antipólio do Paquistão. "Tornou-se um evento nacional."
Houve rumores de que 50 crianças haviam morrido; as mesquitas usaram seus alto-falantes para dizer aos pais que levassem rapidamente seus filhos ao médico. Mais de 25 mil crianças sobrecarregaram os hospitais.
"Ninguém havia morrido. Mas tivemos de cancelar tudo", disse Memon.
A política local estava por trás de tudo, disse ele. Era o período das eleições distritais e o partido conservador Jamaat-e-Islami tentava difamar a campanha da pólio, apoiada pelo partido Tehreek-e-Insaf, do primeiro-ministro Imran Khan.
O homem que falava no vídeo foi preso. Para restaurar a confiança, acrescentou Memon, os ministros distritais de saúde e comunicações apareceram na televisão dando gotas da vacina a seus próprios filhos.
Como a suspeita continua grande em algumas áreas – os vacinadores foram acusados de marcar alvos para drones americanos –, as interações com as famílias agora serão mais breves e menos intrusivas. Os moradores só terão de responder quantas crianças moram na casa e se elas foram vacinadas.
No Paquistão, as famílias muitas vezes vivem em grandes aglomerados; anteriormente, tinham de dizer quantos casais havia ali, se eram casados, quantas crianças cada casal tinha e quem estava grávida. Houve casos em que a polícia prendeu famílias que recusaram a vacinação.
Se você leva as pessoas para a delegacia, elas se sentem insultadas. Agora, teremos uma conversa amigável. Não é preciso desafiar aquelas que se recusam; basta você ter uma conversa com elas e incentivar os líderes religiosos a convencê-las.
AZIZ MEMON
encarregado do envolvimento da Rotary International na campanha antipólio do Paquistão
"Isso não ajudou muito. Se você leva as pessoas para a delegacia, elas se sentem insultadas. Agora, teremos uma conversa amigável. Não é preciso desafiar aquelas que se recusam; basta você ter uma conversa com elas e incentivar os líderes religiosos a convencê-las", disse Memon.
No início de abril, um trabalhador da campanha, tentando persuadir uma família a ser vacinada, foi morto a tiros, aparentemente por um membro da família, de 18 anos, que depois fugiu para o Afeganistão.
Como compensação, o Rotary International deu à família do trabalhador, Wajid Ali, de 32 anos, cerca de US$ 3.300, e o governo local prometeu um emprego a seu irmão.
Em um sinal encorajador, disse Memon, o vírus da pólio não é mais encontrado em amostras de esgoto em Karachi, a maior cidade do Paquistão; portanto, a transmissão pode ter sido interrompida.
A transmissão da poliomielite nunca foi interrompida no Paquistão e no Afeganistão; a maioria dos casos está nos distritos montanhosos ao longo da fronteira, onde o controle do governo é fraco.
A Nigéria não tem um caso confirmado desde 2016, mas são necessários pelo menos três anos sem confirmações antes que um país seja declarado livre da poliomielite.
Por Donald G. McNeil Jr.