Após quatro meses de luta frontal, o governo venezuelano e a oposição acolheram o apelo da Noruega para explorar uma solução negociada, uma decisão que revela um impasse no conflito e a disposição das partes de rever sua estratégia.
Delegados do presidente Nicolás Maduro e do opositor Juan Guaidó, reconhecido como presidente interino por mais de 50 países, mantiveram esta semana discussões com o governo norueguês em Oslo.
A aproximação ocorre após uma batalha iniciada no dia 23 de janeiro, quando Guaidó se proclamou presidente interino, após o Parlamento de maioria opositora classificar de ilegítimo o segundo mandato de Maduro, iniciado dias antes.
Durante este tempo, o opositor colocou milhares de opositores nas ruas para exigir a saída de Maduro e tentar quebrar o apoio dos militares ao governo, dando quase por descartado o diálogo.
Mas o líder socialista não conseguiu o apoio da Força Armada, apesar do apoio dos Estados Unidos, que impuseram um embargo ao petróleo venezuelano, entre outras medidas de pressão.
"Há um estancamento do conflito porque as partes estão se reagrupando e analisam outros caminhos para vencer, e não porque se sentem derrotados", disse à AFP Benigno Alarcón, especialista na resolução de conflitos.
Na mais ousada tentativa para conquistar o apoio da Força Armada, Guaidó liderou no dia 30 de abril uma revolta que mobilizou apenas um pequeno grupo de militares, mas a cúpula militar se manteve fiel a Maduro.
O chavismo reagiu com uma ofensiva judicial que deteve um deputado e fez com que outros treze se refugiassem, inclusive em embaixadas.
- Oslo -
Apesar de secretas, as conversações terminaram vazando e Guaidó negou que se trate de uma negociação ou que tenha encontrado algum enviado do governo, destacando a impopularidade do diálogo entre a oposição.
Durante a gestão de Maduro, iniciada em 2013, já fracassaram quatro tentativas de negociação, algumas com apoio internacional, em meio a denúncias mútuas de violação dos acordos.
"A mediação da Noruega (...) é alentadora, mas deve-se manter as expectativas sob controle. Esperamos que a oposição tenha aprendido com os diálogos passados que o governo não costuma negociar de boa fé", disse à AFP Michael Shifter, presidente do Diálogo Interamericano.
Guaidó afirma que os contatos em Oslo fazem parte das opções para que Maduro entregue o poder e convoque "eleições livres", sob o espectro de uma intervenção militar de Washington.
"Conversações entre Estados Unidos e Maduro seriam ainda mais importantes que o diálogo em Oslo para ajudar a resolver a crise", avalia Shifter.
"Ao governo isto serve para ganhar tempo, dividir e gerar dúvidas entre a oposição, usando os efeitos tóxicos do diálogo", estima Alarcón. "Para a oposição significa tempo para se reorganizar, para um recuo estratégico, como na guerra, para ver quanto armamento tem e repensar o que fazer para ganhar".
- Estrategia múltipla -
Segundo o instituto Delphos, o máximo de apoio de 63% que Guaidó atingiu agora baixou para 59%. Maduro tem 15%, seu pior nível.
Assim, Guaidó parece disposto a combinar múltiplas estratégias: divisão militar, sanções e intervenção dos Estados Unidos e, finalmente, o diálogo.
"Estão percebendo que não podem se agarrar apenas a um caminho. Ninguém que pretende a mudança pode dizer que apenas o diálogo ou a intervenção estrangeira são suficientes", disse à AFP o cientista político Luis Salamanca.
Segundo o especialista, Maduro aceitou o diálogo "forçado pelas circunstâncias", que incluem um "desgaste da base militar". Na mesa de negociações, ele "pode esperar passar a tempestade".
"Para a oposição é mais clara a possibilidade de ganhar com a negociação: Sempre será melhor uma solução pacífica do que uma desenlace violento onde tudo se pode perder", concluiu Alarcón.
* AFP