Dallas – Em meados de 1969, Rick Armstrong tinha 12 anos e jogava beisebol na região de Little League, em Houston
Ele foi selecionado para jogar no All-Star Game, mas teve que recusar, porque estava em Cape Canaveral, na Flórida, para ver seu pai indo para a Lua.
"Não fiquei feliz com isso", disse Rick, que agora tem 61 anos.
Como o 50º aniversário da Apollo 11 se aproxima, Rick e seu irmão Mark, 55, estão leiloando cerca de três mil pertences de seu pai, Neil A. Armstrong, que morreu em 2012. Nesse processo, estão revisitando a infância e o legado duradouro do astronauta, que foi a primeira pessoa a andar na Lua.
"Racionalmente eu entendo. Mas internamente, não tenho certeza de que algum dia eu vá entender. É meio que só meu pai", disse Rick.
Os itens a serem leiloados incluem bandeiras, medalhões, envelopes carimbados e outras recordações que fizeram a viagem à Lua, quando o módulo lunar da Apollo 11 pousou em 20 de julho de 1969. Outros são anteriores, como uma carta que Neil Armstrong escreveu quando criança para o coelhinho da Páscoa.
A maioria do material ficou guardada em porões e armários durante décadas. "A gente sente que deve embarcar no processo para garantir que essas coisas permaneçam em bom estado e em algum local que seja possível conservá-las", contou Mark.
Eles poderiam ter doado tudo para um museu ou uma universidade, mas muitos itens, se não a maioria deles, teriam ficado em caixas, invisíveis e sem serem estudados. Em um leilão, cada artigo passa por uma pesquisa de modo que as pessoas saibam o que estão comprando. As fotografias de cada item permanecerão disponíveis on-line.
"Isso significa que a história do artigo em questão será preservada para que qualquer um tenha acesso mais tarde", disse Mark.
O primeiro lote de cerca de 800 itens serão vendidos nos primeiros dois dias de novembro, em Dallas. Como uma prévia, alguns itens serão exibidos até o dia 5 de outubro no Heritage Auctions, em Manhattan.
Segundo Michael Riley, diretor do departamento de exploração espacial no Heritage Auctions, muitos astronautas da NASA leiloaram objetos décadas atrás, mas não Neil Armstrong. "Ninguém nunca soube direito o que ele tinha, o que guardava, ou mesmo se guardava qualquer coisa".
Mark admitiu que não foi uma decisão fácil vender os pertences de seu pai. "É algo que resistimos em fazer. Será que ele aprovaria? Vamos ver as coisas positivas que podemos fazer", disse ele.
Embora os astronautas fossem celebridades nacionais na década de 1960, Rick relembra que sua vida era "bem normal. Não parecia particularmente extraordinária ou qualquer coisa do tipo".
Sua mãe, Janet Armstrong, era professora de nado sincronizado. Costumavam jantar exatamente no mesmo horário todas as noites. Às vezes, o pai chegava em casa a tempo de se juntar a eles. Outras vezes estava fora trabalhando para a NASA. Ir bem na escola sempre foi algo muito importante.
Nas férias, a família às vezes ia para Acapulco, no México, em um pequeno avião particular. "Ele pilotava. Minha mãe se sentava no lugar do copiloto e a gente sentava atrás. Normalmente com uma ou outra garrafa vazia onde podíamos fazer xixi", relembrou Mark.
A primeira missão espacial de Neil Armstrong, a Gemini 8, quase terminou com um desastre. Foi a primeira vez que os astronautas americanos foram bem sucedidos em por uma espaçonave em órbita. Mas um dos propulsores a bordo do Gemini 8 não funcionou e a nave começou a girar cada vez mais rápido.
Com os astronautas à beira de perder a consciência, ele fechou os propulsores e diminuiu a rotação com o sistema de backup. Só muitos anos mais tarde é que Rick e Mark souberam o quão próximo da morte seu pai esteve naquele dia.
"Não entendíamos o risco. Não entendíamos a complexidade do que eles estavam tentando fazer", Rick disse.
Os astronautas, claro, entendiam os perigos e não existia seguro de vida acessível ou disponível para eles. Isso levou a "coberturas de seguros" para cada missão.
Antes do lançamento, os astronautas autografaram envelopes comemorativos que permaneceram na Terra – uma rede de segurança financeira para que suas famílias vendessem, caso ocorresse alguma tragédia.
Mark disse: "Fomos protegidos. Nunca nos preocupamos se nosso pai voltaria ou não. Ele estava apenas em um voo. Poderia muito bem ser em um avião, como uma viagem de negócios. Uma viagem de negócios à Lua. Era assim mesmo".
Houve um aumento da atenção da mídia para a Apollo 11. O que incluiu um escritor da revista Life acompanhando a família Armstrong por alguns meses.
Durante uma missão, as casas dos astronautas eram casas abertas, com pessoas indo e vindo. Cada uma delas foi equipada com alto-falantes que transmitiam os acontecimentos da missão.
Em 20 de julho de 1969, "havia mais pessoas em casa naquele dia do que nos anteriores", disse Mark, que tinha 6 anos na época. Ele lembrou que seu pai e Buzz Aldrin pousaram na lua à noite.
"Eu tinha comido qualquer coisa e era por volta das 21 horas", ele disse e depois foi para cama. Sua mãe o acordou para assistir a transmissão da caminhada na Lua na televisão de 26 polegadas que ficava na sala de estar.
"Eu acho que era a maior TV que existia", disse Rick, que tinha 12 anos.
A bandeira mais famosa da Apollo 11 foi a que Neil Armstrong fincou na superfície lunar.
Mas os astronautas também levaram muitas bandeiras menores, parte de uma infinidade de souvenirs embalados para a viagem. (Havia também uma bandeira da Universidade de Perdue, onde Armstrong estudou, e também uma bandeira da ONU). No leilão de novembro, eles esperam vender uma das bandeiras americanas, uma de seda que mede 45 cm por 30 cm, por pelo menos U$ 300 mil ou mais.
Talvez os artefatos mais estranhos que foram para a Lua e que ficaram com Neil Armstrong sejam partes do avião original dos irmãos Wright, que fez seu primeiro voo em 1903. Armstrong pôde guardar alguns dos pedaços de tecido da asa do avião e a madeira da sua hélice. São peças que também fazem parte do leilão.
Um dia após o pouso, os astronautas da Apollo 11 deixaram a Lua e começaram a viagem de volta para casa.
Depois de mergulhar no Pacífico, eles passaram várias semanas em quarentena, para se certificar de que não tinham trazido nada perigoso da viagem. (Eles até tiveram que assinar um formulário aduaneiro sob uma rubrica que falava que "qualquer condição a bordo que pudesse levar à propagação de doenças" tinha que ser listada. A NASA forneceu uma resposta útil: "a ser determinado".)
O local para a quarentena – um trailer Airstream modificado – foi em um avião de carga C-141 para Houston, onde Mark e Rick poderiam ir ver o pai. Rick disse que não se lembra dele falando muito sobre a Lua. "Era mais algo como 'o que vocês têm feito? Vocês têm ajudado sua mãe? Vocês estão cortando a grama? Esses tipos de coisas", contou.
Rick disse que a atenção que a família teve se tornou demasiada. Eles se mudaram para Bethesda, Maryland, depois que Neil Armstrong assumiu um trabalho de liderança na sede da NASA. Em seguida, a família se mudou para Ohio, o estado de Neil Armstrong, onde ele se tornou professor na Universidade de Cincinnati. Lá, compraram uma fazenda onde podiam ter maior privacidade.
Mas ser o primeiro homem a pisar na Lua parecia que não o qualificava para ter um cartão de crédito Diners Club. Neil Armstrong tentou em 1974 e foi rejeitado.
Os filhos acabaram seguindo seus próprios caminhos. Mark se tornou um desenvolvedor de software. Rick estudou biologia marinha e se tornou treinador de animais, antes de mudar de carreira e se juntar ao irmão em uma startup de softwares.
"Eu acho que muitas vezes, o filho quer superar o pai. Soube rapidamente que eu não precisava me preocupar com isso. O primeiro homem em Marte provavelmente seria a única chance que eu teria e este não era um objetivo muito realista de carreira. Isso logo deixou de ser uma questão para mim e sinto que nunca me incomodou", contou Rick.
Neil Armstrong retirou-se da vida pública quando mais velho, mas eles discordam das percepções de que era um homem recluso. "Ele era um cara engraçado", disse Rick.
Mark se lembra de participar de uma palestra que seu pai deu na casa de ópera de Sydney, em torno de 1977. O programa da palestra dizia que Neil Armstrong não se exercitava porque achava que todo mundo tem um número definido de batimentos cardíacos e ele não queria desperdiçar nenhum – algo que ele tinha dito, provavelmente brincando, em 1969 para a Life Magazine.
Mark contou que o pai subiu ao palco e disse: "Antes de começar, quero esclarecer uma coisa". Armstrong tirou o casaco, começou a fazer flexões, depois de umas 20 se levantou, colocou o casaco, e sem nenhum comentário, começou sua palestra.
"Eu fiquei mais orgulhoso dele depois dessas flexões do que de quando ele foi para a Lua", disse Mark.
Por Kenneth Chang