A oposição venezuelana planeja reforçar os protestos no país, a partir desta terça-feira, após o presidente Nicolás Maduro anunciar a convocação de uma Assembleia Constituinte para mudar a Carta Magna. A decisão do chavista enfraquece o objetivo de opositores que defendem eleições gerais e amplia o conflito político na Venezuela.
Nas primeiras horas desta terça-feira, os opositores pretendem bloquear importantes vias do país. Um grande protesto está planejado para a quarta-feira contra o que chamam de "golpe de Estado" e "fraude constitucional".
O Parlamento, único poder controlado pela oposição, discutirá durante a tarde os alcances da decisão de Maduro e anunciará ações para tentar aumentar a pressão internacional contra o governo.
– Temos que seguir adiante. Este povo não se rende, nem vai se render – afirmou o presidente do Parlamento, Julio Borges.
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Pressionado após um mês de protestos da oposição, Maduro lançou um novo capítulo da crise política no país ao convocar uma Constituinte "popular": os 500 integrantes da Assembleia Constituinte, no entanto, não serão eleitos pelo voto universal, mas por setores sociais e comunidades.
Para justificar a convocação, Maduro citou um evento "histórico para aprofundar a revolução" e deter a "arremetida golpista" da oposição, ao assinar o decreto que ativa o processo, na segunda-feira à noite, ao lado dos ministros e da cúpula militar.
Eleições sim, mas não gerais
Maduro afirmou que pretende "reforçar" a Constituição de 1999 para estabelecer "novas formas de democracia participativa" e um modelo econômico que não dependa da renda do petróleo.
– É uma medida desesperada de um governo que sabe que não pode convocar eleições porque vai perder e recorre à polarização – afirmou o analista Diego Moya-Ocampos, do IHS Markit Country Risk de Londres, ao recordar que mais de 70% dos venezuelanos rejeitam o governo de Maduro.
Ainda não está claro o que acontecerá com o calendário eleitoral. De acordo com a Constituição, as eleições para governadores deveriam ter acontecido em 2016, mas foram adiadas. A votação dos prefeitos está programada para este ano e a eleição presidencial para o fim de 2018.
Para o analista socialista Nicmer Evans, a medida é uma "traição" à Constituição aprovada no governo do falecido presidente Hugo Chávez (1999-2013), que foi redigida por 131 constituintes eleitos por voto direto, universal e secreto.
"Gaha tempo ao custo de tudo", disse.
Maduro ainda deve enviar à Justiça Eleitoral as bases com que serão escolhidos os integrantes da Assembleia, mas já antecipou que terá forte presença de estruturas comunais, onde o governo tem grande influência.
– Não será uma Constituinte de partidos políticos nem de elites, e sim uma Constituinte operária, comunal, camponesa – explicou.
De acordo com a lei, nenhum poder do Estado poderá impedir as decisões da "Assembleia Constituinte popular" uma vez instalada.
Para o constitucionalista José Ignacio Hernández, o governo pretende "garantir o controle" sobre a "Assembleia Popular" e consolidar a "usurpação de funções" do Parlamento.
Oposição
A oposição protesta nas ruas da Venezuela desde 1º de abril, depois que o principal tribunal de justiça do país assumiu temporariamente as funções do Parlamento.
Desde então, 28 pessoas morreram em incidentes violentos. Governo e oposição trocam acusações sobre a responsabilidade pela escalada da crise. As manifestações, além disso, acontecem em meio a uma profunda crise econômica, com uma severa escassez de alimentos e remédios e uma elevada inflação, além de níveis alarmantes de criminalidade.
*AFP