Sou da geração que lutou contra a ditadura militar, românticos sonhando em construir um Brasil com justiça social. Imagina! Tínhamos como referência a Revolução Cubana; e Fidel Castro como inspiração.
Aos poucos, nossas utopias foram sendo corroídas pelo que o ser humano tem de pior – e mais forte! –: egoísmo e ganância. Perdemos a guerra, em parte por culpa nossa, em parte porque o inimigo maior estava – e continua – dentro de cada um. Perdemos para nós mesmos. Caímos todos.
Menos um soldado.
Fidel Castro levou sua luta até o último dos seus mais de noventa anos. Quis a história que eu estivesse em Cuba no dia da sua morte, no exato momento em que eu assistia a uma cantora de ópera. Conheço bem Havana, morei na cidade, escrevi um livro sobre minha interação com os havaneses.
Por isso, entendi o que estavam sentindo neste sábado, quando já não mais tocavam nos bares, não passeavam pelas ruas nem fumavam charuto ou bebiam um trago de rum encostados no Malecón. A bandeira cubana, a meio-mastro, apunhalava a esperança de que fosse apenas um mal-entendido. Comovente.
Meus amigos tão alegres não mais sorriam. Os tagarelas não tinham forças para conversar comigo, suas vozes mal saiam das gargantas. Sussurravam. Havana emudeceu. O país emudeceu. Minha geração enterrou seu derradeiro militante. Uma época acabou.
Com a morte de Fidel Castro finalmente o século XX chegou ao fim, como também a era dos líderes políticos idealistas, que colocam seus sonhos acima das conveniências circunstanciais, das alianças espúrias cujo único fim é o poder pelo poder.
Fidel foi coerente e profundo em suas convicções, com as quais podemos concordar ou não; isso é subjetivo. Mas não podemos perder a nossa essência: ter ideias e lutar por elas; e ele o fez. A história o julgará com a merecida imparcialidade.
Então, por hora, como dizia Camilo: vaz bién, Fidel.