Antes de Christopher McLarren, um veterano do Exército dos EUA, levar um grupo de turistas pelas sombrias escadas da Estação de Campo de Berlim, um antigo posto de escuta da Guerra Fria, ele pede que os participantes mantenham-se juntos e olhem onde pisam.
Indicando as paredes grafitadas e cacos de vidro projetando-se nas janelas, McLarren, de 66 anos, citou as mudanças que ocorreram desde que o Exército americano deixou Berlim Ocidental, há duas décadas.
- A palavra de ordem naquela época era segurança. Hoje, a palavra é cuidado - explicou McLarren a um grupo de estudantes universitários americanos e turistas alemães em um recente fim de semana, enquanto os guiava por uma caminhada pelas torres brancas do posto abandonado, comumente conhecido como a Colina.
Enquanto McLarren falava na torre de radar, grupos de grafiteiros usando máscaras protetoras e encapotados contra o frio criavam novos desenhos no fundo.
Muito antes da Agência de Segurança Nacional (NSA, da sigla em inglês) causar revolta na Alemanha por revelações de vigilância em massa, os moradores de Berlim Ocidental passavam seus dias cientes de que a agência e outros serviços militares americanos tinham suas antenas voltadas a muitas das conversas realizadas na cidade e em quilômetros além.
Entretanto, na geopolítica preto e branco da Guerra Fria, havia poucas dúvidas de que espionar as potências do Pacto de Varsóvia a partir da Estação de Campo de Berlim - em pleno território da Alemanha Oriental - era necessário para manter Berlim Ocidental livre e segura.
Hoje, mais de duas décadas após a total retirada dos Estados Unidos do local, as ruínas do complexo ainda mantêm uma mítica atração para fãs de História, artistas e turistas.
- Existe algo sobre a Colina que os atrai para cá. Há algo de misterioso aqui. É um lugar secreto, com um toque de história - afirmou McLarren, que serviu na unidade de inteligência do Exército, na Estação de Campo de Berlim, de fevereiro de 1973 a setembro de 1975, e hoje guia visitas ao local.
Depois da Segunda Guerra Mundial, as autoridades municipais usaram o local como ponto de desova para escombros gerados nos bombardeios a Berlim, criando uma área de 115 metros de altura conhecida como Teufelsberg, ou Montanha do Diabo.
- O lugar é como um cemitério indígena. Esotéricos que o visitaram disseram que duas correntes de energia se cruzam ali, e quando você pensa na história, é possível sentir - declarou Shalom Abraham, um cineasta de 30 anos.
Abraham dedicou horas nos últimos três anos para trazer um pouco de organização ao livre fluxo de vida criativa que prospera por aqui desde 2004, quando planos de transformar as torres em apartamentos de luxo foram abandonados pelos donos da propriedade, Hartmut Gruhl, um arquiteto de Cologne, e seu sócio, Hanfried Schütte.
Desde 2011, um grupo chamado BerlinSightOut, dirigido por Abraham e outros voluntários, vem cobrando por visitas ao local. Os ganhos são utilizados para proporcionar segurança e realizar o mínimo de manutenção, apesar da eletricidade limitada, da falta de água corrente e dos vândalos - que, quase diariamente, tentam ultrapassar a cerca ao redor da área de 4,9 hectares.
Há dois anos, o grupo organizou um festival para grafiteiros, cujas obras se tornaram uma das principais atrações.
Ao som do rap vindo de uma caixa de som empoeirada, e do chacoalhar das latas de tinta spray, McLarren descreveu seu trabalho como analista de tráfego. Ele decifrava o movimento de forças soviéticas ao reunir informações captadas de seus rádios.
Por exemplo, a informação de que 3 mil pães haviam sido solicitados por um batalhão durante um exercício de campo poderia dizer aos analistas mais ou menos quantas tropas estariam participando, e por quanto tempo.
- Se deduzíamos que eles tinham de ir embora na quinta-feira, e eles ainda estivessem lá na sexta, então tínhamos um problema - disse ele.
Por enquanto, os protestos de grupos ambientais e moradores próximos à floresta ao redor de Teufelsberg interromperam quaisquer planos de construção. Desde 2006, a região foi legalmente declarada uma floresta, impedindo até mesmo propostas de restaurar o local e transformá-lo em um museu.
Um grafiteiro, que chama a si mesmo de Bee Low, tem visitado o Teufelsberg desde a época em que a única forma de entrar era escalar a cerca. Ele disse ter sido apresentado à cultura do hip-hop enquanto crescia nas quadras de basquete de Berlim Ocidental, ao lado de soldados americanos e suas famílias, quando a Colina ainda era uma instalação fortemente guardada.
- O Teufelsberg é incrível, pois temos esse prédio surpreendente numa montanha com um lindo nascer do sol, e somos livres para fazer nossa arte aqui. Antigamente a NSA tinha sua base aqui, mas hoje este é um lugar de grafite. Muito bom - opinou ele, com um aceno de aprovação para as coloridas ruínas ao fundo.