Liz Barraclough comparou a sensação ao ato de cair nua em um canteiro de urtigas. Guy Wickett disse que a sensação era a de fazer bolas de neve sem luvas. Timothy Sutton foi mais direto, e disse: - Dói para caramba. O bom é que se você grita debaixo d'água e ninguém consegue te ouvir - .
Certo dia em dezembro, logo depois das 8h00, a temperatura da água de Brockwell Lido, uma piscina olímpica a céu aberto no sudeste de Londres, caiu para 6 graus pela primeira vez nesta temporada. Uma pequena multidão de nadadores se juntou em um pátio construído em 1930, com a respiração fazendo fumaça em meio à chuva. Contadores, professores, donas de casa, aposentados e estudantes: todos precisam de uma dose diária de água gelada.
Alguns levam roupas de mergulho na mochila. Porém, poucos as usam. A maioria prefere meias e luvas de neoprene ou chegam a usar duas toucas de natação de silicone ao invés de uma. Marianne Apherton, de 57 anos, conta apenas com um gorrinho de lã.
- Nooossa! - , gritou Lizzie McPhee, de 44 anos, uma atriz que virou coach em comunicação estratégica. Ela arrumou os óculos de natação, esfregou as mãos, aproximou-se da borda da piscina e mergulhou de cabeça.
- Faz com que eu me senta viva. É como se eu nascesse de novo - , explicou mais tarde, com os lábios roxos e o corpo rosa brilhante.
Na Grã-Bretanha, que sofre com a crise econômica, a austeridade orçamentária e chuvas frias de inverno, um número cada vez maior de pessoas está combatendo o frio e a umidade passando mais frio e se molhando mais. A popularidade do nado de inverno cresceu.
Existem 778 piscinas não aquecidas a céu aberto como a Brockwell Lido na Grã-Bretanha. Só em Londres, cinco delas funcionam o ano todo. Nadadores também mergulham em lagos públicos no Hampstead Heath, um parque a noroeste de Londres, ou no lago Serpentine no Hyde Park.
A piscina a céu aberto mais antiga de Londres, a Tooting Bec, está aberta desde 1906, e o número de associados totaliza 1.500 pessoas, comparadas às 50 nos anos 80, quando quase foi forçada a fechar. No último mês de janeiro, ela foi sede do Campeonato de Natação em Águas Frias da Grã-Bretanha. Sob uma água praticamente congelada, 575 participantes competiram, comparados a 350 deles em 2011 e 200 em 2006.
Certa vez, a piscina Brockwell ficou fechada de novembro a março. Porém, os usuários fizeram pressão e conseguiram mantê-la aberta durante o ano todo.
A explosão do nado em águas frias é parcialmente atribuído à crescente popularidade do triatlo, que também aumentou o número de ciclistas nas ruas. Contudo, há outros motivos, disse Jonathan Cowie, diretor de corridas no Clube de Natação South London.
- As pessoas praticam o nado em águas frias pelo barato, por motivos de saúde, pelas amizades que fazem e para aliviar a depressão. Porém, também o fazem como parte de um movimento direcionado a uma relação mais próxima com a natureza - , explicou Cowie.
Alguns entusiastas disseram que esse movimento tem sido reforçado pelos problemas econômicos que os fizeram perceber a natureza fugaz da felicidade material.
- Eu vejo as caras feias das pessoas debaixo dos guarda-chuvas pela manhã e penso: 'eu tenho uma roupa de mergulho na bolsa' - , disse Maureen Ni Fiann, psicoterapeuta de 61 anos. - As folhas sob a água, as árvores, o ar fresco - é tudo uma chance de escapar da esteira. -
Todas as pessoas têm uma história sobre o que a água fria faz a elas. Sutton, um retratista de 53 anos, disse que isso o faz acordar de manhã. Helen Milstein, professora de 61 anos, disse que costumava ter depressão sazonal, mas já não tem mais. - "É uma ótima ajuda durante o inverno inglês. -
Sylvia Wheeler, de 68 anos, que foi de bengala até a borda da piscina, disse ter encontrado alívio para a artrite e para os dois pinos no quadril. - Eu quase não sinto dor dentro d'água - , comentou.
Muitos alegam que isso reforça o sistema imunológico. - Eu não me lembro da última vez que tive uma gripe - , disse o marido de Milstein, Peretz, cujo apelido é Urso Polar já que passa tanto tempo na água.
Apherton diz que no único ano durante os últimos 14 em que passou nadando durante o inverno, ela teve gripe e amidalite.
Nadar no inverno é muito popular na Rússia, China e Escandinávia. Na Finlândia, quebrar o gelo para dar um mergulho e depois se aquecer na sauna é uma tradição.
Contudo, os nadadores da Brockwell sugerem que havia algo essencialmente britânico em relação à dor e aos prazeres. Esse é um país onde, até não muito tempo atrás, banhos frios eram parte dos pacotes nos colégios internos, e casas vitorianas com correntes de ar mantêm-se frias mesmo sendo aquecidas.
Na verdade, o nado em águas gélidas se presta a infinitas discussões sobre o assunto preferido por aqui: a água. Wickett, de 46 anos, que trabalha na rede de supermercados Tesco, disse que os arrepios prolongados que aprecem depois de um mergulho o fazem lembrar os treinos de rugby em Kent, onde cresceu. Para Sutton, o frio o leva de volta às férias no acampamento úmido no Lake District com os pais.
Algumas pessoas dizem não precisar de um termômetro para saber a temperatura da água.
Linda Spashett, uma aposentada de 63 anos, disse com um sorriso: - Você sabe que está muito frio quando suas, hum, partes pudendas começam a formigar. Geralmente essa é a marca dos 10 graus. - Abaixo dos cerca de 4,5 graus, segundo a maioria das pessoas, parece tudo a mesma coisa: a água é densa e a pele parece queimar.
Quando eles saem da piscina estão com a boca adormecida.
Como foi?
- No-nós adora-ramos - , disse McPhee com uma careta de desculpa. Realmente adorável. - E-eu dão gonsigo valar. - Ela apontou para os lábios e balançou a cabeça.
Mais tarde, quando todos se juntaram no café ao lado, a conversa voltou-se para as melhores formas de se aquecer. Apherton recomendou uma garrafa térmica de chá quente. Milstein recomendou um gorro e luvas para aquecer as extremidades. Os homens disseram ter usado secadores de cabelo para soprar ar quente pela camisa.
Que tal um banho quente?
- Você definitivamente não quer fazer isso - , disse Milstein.
Ao invés disso, ele aconselha: - Tome um banho frio - .
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