O primeiro-ministro turco, Recep Tayyip Erdogan, voltou a criticar nesta terça-feira o atual regime egípcio, que derrubou o presidente islamita Mohamed Mursi, depois de declarações similares que, no fim de semana, desataram uma crise diplomática.
- Não deixaremos de dizer o que é justo, nem de apoiar o povo egípcio só porque o governo que tomou o poder por um golpe de Estado no Egito se vê contrariado. Não seremos espectadores silenciosos - declarou Erdogan em seu discurso semanal ante os deputados de seu Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP).
A crise entre o Egito e a Turquia, iniciada com a destituição de Mursi e a repressão de seus partidários, agravou-se no sábado com a expulsão por parte do Cairo do embaixador turco.
Foi a medida diplomática mais drástica adotada pelo Egito após as declarações de Erdogan condenando a repressão dos islamitas pelas novas autoridades egípcias.
Erdogan, um islâmico conservador próximo de Mursi e da Irmandade Muçulmana, confraria à qual pertence o presidente destituído, chamou de "golpe de Estado" a ação militar de 3 de julho que terminou com a queda e a detenção do presidente.
No sábado, depois da expulsão do embaixador turco, Erdogan voltou a criticar o atual governo do Egito.
- Nunca respeitarei os que chegam ao poder por golpes - declarou aos jornalistas.
E acrescentou:
- Nós apoiamos a luta pela democracia no mundo. Nós nunca respeitamos os que não respeitam os direitos soberanos do povo.
Além disso, o premiê criticou a repressão sangrenta, realizada pelas novas autoridades, dos partidários do ex-presidente Mursi e a perseguição sofrida pelos membros da Irmandade Muçulmana, quase todos presos.
No domingo, Erdogan participou de um comício no norte da Turquia, no qual levantou quatro dedos, associado à repressão aos islamitas na praça Rabaa al Adawiya (em árabe, "rabaa" significa "quatro"), no Cairo. Centenas de pessoas morreram em confrontos nesse local.
Na última quinta-feira, o primeiro-ministro já havia dito não "ter nenhum respeito por aqueles que levaram Mursi à Justiça", em referência ao julgamento iniciado em 4 de novembro do único presidente eleito democraticamente no Egito por "incitação ao assassinato" de manifestantes no final de 2012.
Considerando essas declarações "provocadoras" e "uma ingerência inaceitável nos assuntos internos do Egito", o Ministério egípcio das Relações Exteriores convocou o embaixador turco Huseyin Avni Botsali, que foi informado de que é "persona non grata" no país.
Além disso, o embaixador egípcio, chamado em 15 de agosto para retornar ao Cairo, não voltará para Ancara, e o nível da missão diplomática egípcia na Turquia será reduzido a apenas um encarregado de negócios, segundo o governo.
O ministério acusou a Turquia de "apoiar (...) organizações que buscam criar a instabilidade", em clara referência à Irmandade Muçulmana, e criticou Ancara de "tentar colocar a comunidade internacional contra os interesses do Egito".
Pouco tempo depois, a Turquia declarou o embaixador do Egito, Salah ElDin, "persona non grata" e reduziu suas relações diplomáticas ao mesmo nível, como medidas de reciprocidade.
O presidente turco, Abdullah Gül, ainda tentou apaziguar os ânimos, considerando a situação como "temporária e conjuntural", e disse esperar que as "relações sejam retomadas".
Já o embaixador da Turquia no Cairo afirmou que "continuará a rezar pelo bem do Egito", porque "é da maior importância para a região e para o mundo que o Egito permaneça no caminho da democracia".
As relações diplomáticas entre os dois países estão comprometidas desde a destituição e prisão pelo Exército egípcio do então presidente Mursi, poucos dias depois de milhões de egípcios irem às ruas para exigir sua saída. Os manifestantes acusavam Mursi de querer islamizar a sociedade e concentrar o poder em favor da Irmandade Muçulmana, à qual pertence.
No dia seguinte à morte, oficialmente, de mais de 600 pessoas na dispersão sangrenta de ativistas pró-Mursi no Cairo, em 14 de outubro, os dois países anunciaram a convocação de seus embaixadores para consultas.
O embaixador turco retornou ao Cairo no início de setembro, mas o embaixador egípcio nunca mais voltou a Ancara.
Além disso, Ancara e Cairo cancelaram manobras navais conjuntas previstas para outubro.
Outros países também têm criticado as novas autoridades egípcias, sob o comando do exército.