O jovem esbelto de 22 anos, ex-guerrilheiro, tinha uma aparência de culpa, de penitente a mando da polícia da cidade local. Foi lavagem cerebral que o levou a pegar armas contra o Estado e "ir para a floresta", afirmou, e seu desejo sincero era esquecer que isso tinha ocorrido.
Na maioria das vezes, pessoas como este jovem, Dzhabrail Altysultanov, não voltam vivas, o vice-prefeito de Khasavyurt, uma cidade perto da fronteira chechena, reconheceu de modo prático, enquanto uma garçonete trazia uma bandeja fumegante de carne assada. Se Altysultanov não tivesse se rendido, disse o vice-prefeito, "teríamos de recolher os pedaços dele". O homem mais jovem baixou os olhos para o prato.
A estada de seis meses do suspeito dos ataques em Boston, Tamerlan Tsarnaev, no território russo de Daguestão no ano passado chamou atenção incomum para a questão de guerrilha em baixa ebulição no Norte do Cáucaso. Formou-se uma imagem de Tsarnaev como um forasteiro sentindo o caminho nos limites de uma insurgência que parecia muito diferente dos relatos de brigas partidárias que ele ouvira crescendo entre os refugiados chechenos.
Investigadores estão pressionando para melhor entender o que Tsarnaev estava procurando quando ele viajou para cá. Mas o que ele encontrou foi uma guerra às escuras que acontece nas fronteiras da vida comum, oculta a olho nu.
Homens jovens desaparecem de suas casas, aparecendo apenas nas contagens dos mortos após operações contundentes de contraterrorismo. Embora o número de combatentes não passe de algumas centenas, afirmam os agentes policiais, ele é apoiado por uma rede extensa e invisível - milhares de pessoas comuns, até policiais, que os auxiliam, por medo ou por simpatia. É uma sociedade envolvida em um cabo de guerra íntimo com os homens jovens que facilmente entram no ranque da insurgência.
- Quer falar sobre Tsarnaevs - disse o prefeito, um homem forte local de peito largo chamado Saigidpasha Umakhanov - Quer saber quantos Tsarnaevs temos?
Umakhanov, treinador de luta livre, ele sabe qual é a proximidade exata desses combatentes nessa guerra.
As guerrilhas recrutam atletas, e cinco dos seus alunos de destaque tornaram-se comandantes da insurgência, ou "emirs." Um de seus suplentes foi forçado a renunciar no ano passado após seu filho ser acusado de ajudar um grupo armado. Os lutadores visitam Khasavyurt para perseguir agentes policiais da cidade - 36 foram mortos desde 2009 - ou para colocar pen drives com mensagens em vídeo nas caixas de correios de autoridades ou negociantes, pedindo dinheiro, para que "Deus não puna vocês com as nossas mãos".
Em outubro, alguém teve como alvo o próprio prefeito. Uma bomba explodiu ao lado de sua carreata, deixando para trás uma cratera de 90 cm de profundidade e três metros de largura.
O Estado responde com o seu próprio trovão. Em abril, veículos de combate blindados e comandos mascarados cercaram a aldeia da montanha de Gimry, um baluarte do islamismo e do desafio à Rússia, e mandaram as mulheres e crianças evacuarem. Tropas bombardearam um desfiladeiro vizinho e depois usou cordas para suspender os corpos de três dos militantes suspeitos. Quando os moradores tiveram permissão para retornar uma semana depois, muitas casas tinham sido saqueadas, algumas reduzidas a escombros.
Em Daguestão, com a população de quase 2,9 milhões, aproximadamente 350 pessoas foram mortas em combate aqui em 2012, das quais dois terços eram de militantes e um terço de agentes policiais, segundo o serviço de notícias "Caucasian Knot". A mensagem das autoridades é clara: uma vez que um jovem participe de um ataque, é improvável que ele viva por muito tempo.
- Eles não podem retornar - não existe caminho de volta - Umakhanov disse - Esse é o problema.
É com esse pano de fundo que Altysultanov está tentando encontrar seu caminho "de volta da floresta", como dizem por aqui.
O esforço do Daguestão de reabilitar os combatentes de guerrilha foi uma experiência realizada quando Dmitry A. Medvedev, então presidente da Rússia e agora primeiro ministro, estava testando abordagens mais brandas para a violência obstinada do Cáucaso.
Analistas salientaram os problemas com a iniciativa - por exemplo, a exigência humilhante de que todos os homens confessem os seus erros e condenem a insurgência diante das câmeras de televisão com propósitos de propaganda política. Agentes policiais resistiram ao programa como excessivamente leniente, e questionaram se os homens que se entregavam realmente se arrependiam, segundo um relatório do Grupo de Crise Internacional.
Mas o obstáculo mais sério é que os jovens não confiam na polícia para garantir a segurança, afirmou Sapiyat Magomedova, advogada de Khasavyurt que representa as pessoas acusadas de ajudar os insurgentes. Ela mostrou fotografias de clientes que tinham sido espancados sob custódia da polícia, quando os agentes buscavam confissões ou suborno. Ela mesma apanhou até ficar inconsciente em uma delegacia em 2010, quando tentava ter acesso a um cliente.
- Quem está empurrando eles para as florestas? Quem? perguntou ele - São os mesmos agentes. A indignação deles envia essas pessoas para a floresta - o que fazem com seus parentes, o fato de que são torturados, eles desprezam a polícia. Saem zangados e vão para a floresta.
- A população não sabe de quem ter medo - acrescentou - Da polícia, ou dos combatentes.