Alguma coisa grande apareceu na minha visão periférica. Eu me virei para olhar melhor mas, o que quer que tenha sido, desapareceu no crepúsculo permanente do universo subaquático. Teria sido uma garoupa? Uma pequena baleia?
Tudo era possível, 9 metros abaixo da superfície do Golfo da Califórnia, que separa a Península da Baixa Califórnia do território mexicano. Mas a forma e a alta velocidade da aparição eram estranhas. Eu não pude identificá-la até que outra aparecesse, depois outra, e logo, mais de uma dúzia, virando e girando em volta do nosso grupo de sete mergulhadores, ficando cara a cara antes de partirem rapidamente: leões-marinhos.
Eu deveria ter percebido antes; eu sabia que estávamos mergulhando perto de uma colônia desses pinípedes (nome da ordem de mamíferos aquáticos que inclui focas, leões-marinhos e morsas). Mas enquanto eu observava alguns leões-marinhos acima da linha da água, refestelando-se ao sol ou arrastando seus corpos roliços de forma desajeitada de uma pedra para outra, eu não os havia imaginado transformados em esbeltos mísseis submarinos, cada um maior, mais forte e mais rápido do que um ser humano.
Eu estava mergulhando no México, no Parque Nacional Marinho Cabo Pulmo, um ecossistema de 71 m² com uma história incomum e um futuro incerto. Ao menos 226 espécies de peixes vivem no parque, que abriga o único recife vivo de corais duros no Golfo da Califórnia. Mas ambientalistas temem que o desenvolvimento de um resort enorme possa alterar significativamente essa orla delicada de Baja, tanto na superfície quanto debaixo d'água.
Embora eu tenha visitado a região durante 15 anos, eu nunca tinha mergulhado nessa área. Fui finalmente motivada a mergulhar pela ameaça de dano iminente. Hoje, Cabo Pulmo permanece difícil de ser visitado e cheio de vida marinha, mas em alguns anos, o inverso pode se tornar verdade.
Debaixo d'água, uma corrente nos levou para depois da colônia de leões-marinhos e, conforme nós começamos a subir, raios de sol iluminavam cardumes de peixes tropicais: castanhetas-das-rochas com suas listras de presidiários, "moorish idols" (Zanclus cornutus) arrastando suas nadadeiras em forma de cimitarra, peixes-falcão gigantes cobertos por linhas rabiscadas de Keith Haring. De volta à superfície, uma tartaruga verde, uma das espécies em extinção, circundou nosso pequeno barco a motor.
Depois de mergulhar, voltei à vila de Cabo Pulmo, outro ecossistema incomum. Localizado no topo do recife, esse ponto no Trópico de Câncer fica a apenas 97 quilômetros dos mega-resorts de Los Cabos, mas parece um mundo de distância. Só é acessível por uma estrada de terra que corre ao longo da baía sul da península, onde você pode encontrar tanto vacas e cascavéis quanto outros carros. Quando eu pedi a chave do meu bangalô no Cabo Pulmo Beach Resort, fui informado de que eles não as usavam.
A cidade tem, talvez, 250 habitantes, incluindo os moradores locais - descendentes de famílias de pescadores e criadores de gado - e refugiados do Canadá, Estados Unidos e México, que passam parte do ano aqui. Embora as partes vizinhas da península tenham mudado exponencialmente durante a última década, trazendo grandes lojas e expandindo rodovias pavimentadas, redes de energia elétrica e torres de celulares, Cabo Pulmo tem permanecido fora da rede elétrica. Energia solar e geradores fornecem eletricidade. A água vem de um poço ou é trazida de caminhão. Eu contei uma mercearia, cinco restaurantes e três lojas de acessórios para mergulho que abriam regularmente.
Também conhecido como Mar de Cortez, o Golfo da Califórnia é uma orla de 160.579 m² com uma lista distinta de admiradores. O explorador Jacques Cousteau a chamou de "aquário do mundo". Em 2005, a Unesco declarou 244 ilhas e áreas costeiras no Mar de Cortez, incluindo Cabo Pulmo, como Patrimônio da Humanidade.
Nos anos 70 e 80, porém, a pesca excessiva dizimou a fauna marinha da região. Os moradores fizeram pressão para proteger a área e, em 1995, o governo mexicano fez de Cabo Pulmo um parque nacional, proibindo a pesca. Isso acabou se tornando um enorme sucesso ambiental: Entre 1999 e 2009, a população de peixes cresceu 463%, de acordo com um estudo do Instituto de Oceanografia Scripps - o maior aumento do tipo já medido em qualquer reserva marinha no mundo. E também foi um sucesso econômico, já que os antigos pescadores se tornaram instrutores de mergulho, snorkel e caiaque.
Preocupações com o recife surgiram novamente no final dos anos 2000, quando um empresário espanhol anunciou planos de construir um complexo com 30 mil quartos de hotel a menos de 11 quilômetros do parque. A visão da empresa para a expansão ao estilo Cancun foi o oposto do ecoturismo discreto que tem tomado conta de Cabo Pulmo. Conservacionistas notaram que o escoamento da construção poderia matar os recifes de corais, tanto quanto muitos mergulhadores desajeitados. Uma coalizão liderada por organizações ambientais mexicanas protestou; o presidente Felipe Calderón respondeu cancelando as licenças para o mega-resort, em junho de 2012.
E deveria ser isso mesmo. Mas, apenas dois meses depois, outro empresário espanhol ressuscitou planos para um resort no mesmo lugar, arquivados pelo Ministério do Meio Ambiente e de Recursos Naturais do México, para começar uma avaliação do impacto ambiental. O projeto se chamava (sem intenções irônicas) de "Los Pericues", nome de um grupo indígena que foi extinto pela colonização espanhola.
As organizações Wildcoast e Centro Mexicano de Legislação Ambiental disseram que vão continuar com a briga. Mas nem todos os ambientalistas acham que o projeto seria um desastre.
Patrick Moore, um dos membros fundadores do Greenpeace, mora uma parte do ano em Cabo Pulmo, tendo comprado um imóvel aqui em 1999. Ele diz acreditar que um grande resort poderia, na teoria, ser feito corretamente.
- Eu acho que a maioria das pessoas aceitaria um desenvolvimento sustentável - disse ele, completando - Traria benefícios econômicos.
Alguns moradores locais não têm tanta certeza.
- O que eles estão fazendo poderia colocar muito mais pressão no recife - disse Cole Barrymore, dono do Cabo Pulmo Beach Resort, um dos hotéis mais antigos da cidade - Se o resort enorme seguir em frente e o parque nacional não impuser novas regras sobre o número de mergulhadores, não haverá mergulhos como costumava haver.
Pode ser também, que a própria natureza acabe restringindo o turismo em escala industrial. Depois de chegar a Cabo Pulmo, eu tive que esperar três dias para mergulhar por conta dos ventos fortes que afetam a área quatro meses por ano - os mesmos meses em que os vizinhos do norte do México tiram suas férias de inverno. No verão, o ar fica parado e a visibilidade debaixo d'água pode se estender a espetaculares 30 metros, mas as temperaturas em terra firme ficam acima dos 32 graus.
Dois dias depois de mergulhar com os leões-marinhos, eu fui para uma parte diferente do parque. Do barco a motor, eu vi mãe e filhote de baleias-jubarte romperem a superfície e escorregarem para as profundezas novamente. Depois que eu caí da borda do barco e comecei minha descida, um cardume de gaviões-do-mar, uma espécie ameaçada de extinção, passou por cima da minha cabeça. Peixes-anjo azuis e pretos, peixes-borboleta-bicuda amarelos e baiacus-cofre patrulhavam as respectivas porções de coral, enquanto uma moreia observava debaixo de uma pedra. Por enquanto, pelo menos, o coral estava completo.