O deputado federal Giovani Cherini (PL-RS), vice-líder do governo Bolsonaro na Câmara, se pronunciou nesta segunda-feira (17) sobre a morte de Bruno Covas. O prefeito de São Paulo faleceu no domingo, vítima de um câncer no sistema digestivo, que combatia há cerca de um ano e meio. Durante a sessão da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), o parlamentar disse:
A máscara que ele usou durante toda a campanha pode ter prejudicado o câncer que ele teve, porque as células precisam de respiração.
A máscara que ele usou durante toda a campanha pode ter prejudicado o câncer que ele teve, porque as células precisam de respiração.
GZH consultou três especialistas em oncologia para saber a opinião técnica a respeito da afirmação feita pelo deputado gaúcho.
Não procede
Para o cirurgião do aparelho digestivo do Hospital de Clínicas e professor da Unisinos Eduardo Neubarth Trindade, a afirmação do deputado federal não procede e não encontra respaldo científico.
— Não há base científica ou plausibilidade biológica pra tal afirmação. Não se encontra respaldo na literatura pra dizer que o uso de máscara tenha agravado o quadro do câncer de Bruno Covas ou estimulado a replicação celular. O câncer é, sim, uma replicação anormal de células, mas não se pode afirmar que uso contínuo da máscara seja causador dessa multiplicação.
O pesquisador e oncologista da Oncoclínicas no RS Carlos Barrios sugere um teste com oxímetro para que o público constate que o uso da máscara não impacta na concentração de oxigênio no sangue.
— As pessoas têm que desmistificar a ideia de que o oxigênio entra e vai direto para a célula. Ele entra, é filtrado no pulmão, depois circula e só então entra na célula. Um bom teste é utilizar o oxímetro, que mede a concentração de oxigênio no sangue. A pessoa vai poder observar que, independente de estar utilizando a máscara ou não, os dados do oxímetro não se alteram — afirma Barrios.
Ele reforça que o uso da máscara, no contexto da pandemia, é ainda mais importante, pois há evidências de que pacientes com câncer podem desenvolver quadros mais severos de covid-19.
— Não há absolutamente nenhuma evidência científica ou clínica de que o uso da máscara impacte na evolução de qualquer tumor. Uma afirmativa dessas cria uma dúvida desnecessária e inapropriada para todo paciente com câncer. É perfeitamente seguro e absolutamente recomendável que todo paciente com câncer continue usando máscara. Existem diversas evidências que sugerem que, em alguns doentes com câncer, a infecção por covid pode ter uma evolução pior. Um exemplo são os casos de pacientes que têm tumores pulmonares ou hematológicos — complementa o oncologista.
Carlos Eugênio Escovar, diretor do Hospital Santa Rita, ambiente especializado em oncologia da Santa Casa de Porto Alegre, fez um comparativo: segundo a lógica apresentada pelo deputado, uma série de cirurgiões, que por causa da sua profissão precisam usar máscara por muitos anos, durante aproximadamente oito horas por dia, teriam câncer.
— Acredito que o deputado, por ser leigo, fez uma associação errada, usando um mecanismo chamado hipóxia intracelular, que é a falta de oxigênio dentro da célula, que de fato pode gerar um câncer. Mas ela é causada por agentes como tabagismo, etilismo, alimentação rica em gorduras saturadas e obesidade, não estando relacionada ao uso da máscara. A máscara, inclusive, pode ser usada a vida toda — afirma Escovar.
A reportagem contatou a equipe do hospital Sírio Libanês, no intuito de ouvir a avaliação dos especialistas que trataram Bruno Covas. A instituição, no entanto, preferiu não se pronunciar sobre o tema.