Dependente quase que exclusivamente de obras públicas do município, a Companhia de Desenvolvimento de Caxias do Sul (Codeca) vive um dos momentos econômicos mais difíceis da sua história. A empresa amarga um prejuízo no fluxo de caixa de quase R$ 10 milhões — o balanço de 2017 ainda não está fechado.
O saldo negativo aumentou quase 19 vezes (ou 1.720%) desde dezembro do ano passado, quando a gestão anterior entregou a companhia com débito de R$ 549 mil. O fator responsável pelo rombo nas contas teria sido um longo período sem executar serviços de grande porte para a prefeitura, segundo a diretora-presidente da instituição, Amarilda Bortolotto. A situação é reflexo, principalmente, da contenção de despesas do município, que não requisitou quantidade suficiente de serviços para que a empresa pudesse sair do vermelho. Segundo ela, os contratos já vinham caído desde final do segundo semestre do ano passado. Neste ano, piorou com a redução de 30% dos gastos públicos, conforme orçamento aprovado ainda em 2016.
— A prefeitura é uma grande demandadora de serviços e nós estamos praticamente sem obras de grande vulto desde junho de 2016. Pequenas obras, como remendos, não têm retorno financeiro. A previsão é que algumas obras já alinhadas aconteçam em 2018 para que a gente consiga retomar um fluxo de trabalho e de retorno financeiro — explica Amarilda.
Os números do portal da transparência da prefeitura confirmam uma queda de 66% nos valores pagos neste ano à companhia por obras de pavimentação, limpeza urbana e manutenção de áreas públicas (ver quadro).
O resultado de um ano sem demanda suficiente de serviço resulta também em trabalhadores com tempo ocioso. Segundo a companhia, neste tempo em que não atuavam em obras pelas ruas de Caxias, os funcionários sem atividades nas ruas passaram por cursos e executaram melhorias na estrutura interna. O quadro de empregados da Codeca, atualmente, é de 1.080 pessoas.
— É uma situação complicada e grave. Vemos que o prejuízo já existia no ano passado, mas não era tão grande quanto este ano. Há um agravo muito importante em 2017, mas vale lembrar que há o mês de dezembro inteiro para que isto possa inverter — opina o especialista em finanças governamentais e professor da Universidade de Caxias do Sul (UCS), Tarcísio Neves da Fontoura.
Além de medidas internas para redução de gastos, a aposta é que a retomada de obras da prefeitura para 2018 possa amenizar a situação financeira da Codeca, de acordo com a direção. O negócio ainda é rentável, garante a presidente Amarilda:
— Temos sentimentos que em dezembro já houve uma reação. Nós revisamos contratos, buscamos manter redução em diversos custos, e estamos trabalhando muito conscientes e com boas perspectivas para 2018.
Crise se repete
Amargar prejuízos é uma constante na Codeca, que quase fechou entre 2004 e 2005. Na época, as dívidas giravam em torno de R$ 6 milhões _ valor que, atualizado de acordo com o Banco Central, representaria algo em torno de R$ 13 milhões. É uma prova que a situação é difícil, porém contornável. Na época, para que tributos e outras despesas pudessem ser quitadas, uma das saídas foi a injeção de recursos por parte da prefeitura. Por enquanto, esta medida não é cogitada pela diretora-presidente, que diz não ter feito nenhum pedido de verba ao prefeito Daniel Guerra (PRB).
— O que a gente tem conversado é dentro de linha de obras para o próximo ano. Não foi feita nenhuma solicitação de aporte — confirma Amarilda.
Outras iniciativas adotadas nos anos 2004 e 2005 também foram responsáveis pela recuperação financeira da empresa. A criação de um comitê com 70 funcionários que avaliava e dava ideias de como reduzir despesas era um dos trunfos que a antiga administração atribuía à recuperação financeira. Outras medidas também foram fundamentais como revisões de despesas como telefone, energia elétrica e horas extras.
A crise financeira da Codeca é alvo de críticas e avaliações dos vereadores durante sessões da Câmara com bastante frequência, especialmente do ex-presidente da empresa, Adiló Didomenico (PTB). Ele solicitou, inclusive, um pedido de informações, que resultou na divulgação do demonstrativo de fluxo de caixa, onde está descrito o prejuízo de quase R$ 10 milhões. O vereador é taxativo ao dizer que parece haver interesse da prefeitura em enfraquecer a companhia:
— A Codeca tinha um faturamento mensal de R$ 8 milhões que caiu para R$ 6 milhões. Ao cortar abruptamente o faturamento da empresa, sem derrubar despesas e não dando reajuste sobre os contratos, você deixa de dar e ainda tira (dinheiro). Não há milagre. Sem haver respaldo da prefeitura, não há milagre — defende Didomenico.
ENTENDA
O que teria causado o rombo financeiro na Codeca
:: A companhia depende basicamente de obras públicas da prefeitura de Caxias do Sul para se manter. No ano passado, a contratação de obras por parte do Executivo já vinha reduzindo. Segundo a gestão atual da Codeca, o Executivo fez um corte de 30% nos gastos públicos para o orçamento de 2017, o que impactou na contratação de mais obras.
:: Os números do Portal da Transparência confirmam essa redução drástica. Em 2016, o Executivo, por meio de secretarias e do Samae, pagou R$ 67,03 milhões para a Codeca executar pavimentação, limpeza urbana e manutenção de áreas públicas. Neste ano, o valor pago pelo mesmo tipo de serviço caiu para R$ 22,3 milhões.
:: O faturamento da empresa, que girava em torno de R$ 8 milhões mensais no ano passado, hoje está em torno de R$ 6 milhões. Conforme a companhia, despesas com pessoal (salários e benefícios) correspondem a 71% do faturamento. Somente os salários, consomem R$ 2 milhões todos os meses.
O que a companhia está fazendo para conter o déficit
:: Uma das medidas é reduzir o custo extra na folha de pagamento. Houve diminuição de 56% do total de horas extras (antes, chegava-se a 10 mil horas extras por mês) e o desligamento de 17 dos 28 cargos de confiança (CCs).
:: Com pouco dinheiro em caixa, há menos investimentos: duas vans e três caminhões foram adquiridos em 2017, ao custo de R$ 1,3 milhão.
:: A companhia não cogita, por enquanto, demissões de funcionários.
:: Para 2018, está prevista a retomada de obras públicas em Caxias, segundo a Codeca, o que poderá sanar o prejuízo ao longo do ano.
SAIBA MAIS
:: A Codeca é sociedade de economia mista na qual há participação entre o município de Caxias do Sul e particulares. O município tem participação majoritária e direito a voto. Os funcionários são regidos pelas normas da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
:: 99,7% das ações da companhia pertencem à prefeitura. O restante ficam em poder de três integrantes do conselho de administração, incluindo o diretor-presidente. Quando muda a gestão da empresa, as ações são repassadas aos novos gestores por determinação da acionista majoritária, que é a prefeitura.
:: Diariamente, a Codeca coleta 450 toneladas de resíduos. Deste total, 360 toneladas são orgânicos (sendo destinadas ao aterro sanitário) e 90 toneladas são seletivos.