A relação estável do presidente Michel Temer com o Congresso chega ao final do ano ameaçada. Descontentes com a interferência do Planalto a favor de Rodrigo Maia (DEM-RJ) na disputa pelo comando da Câmara, partidos do centrão não garantem fidelidade à reforma da Previdência. Dentro da base, ainda pesa a insegurança quanto ao futuro do governo com a delação da Odebrecht.
Um dos pilares de Temer na Câmara, o centrão tornou pública sua insatisfação ao dificultar a votação da admissibilidade da PEC da reforma da Previdência na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa. O bloco partidário (PSD, PP, PR, PTB, PRB, PSC, SD e nanicos) reúne cerca de 200 deputados.
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Contemplado com André Moura (PSC-SE) na liderança do governo, o centrão disputa poder com PSDB, DEM e PPS. A eleição da presidência da Câmara, em fevereiro, e a vaga na Secretaria de Governo estão no cerne da peleia. O bloco é contrário à recondução de Maia, abençoada pelo Planalto, em dobradinha que reserva a vaga de ministro a Antonio Imbassahy (PSDB-BA). O centrão acha que é espaço demais para tucanos e democratas.
– Somos considerados os impuros, mas seguramos o tranco quando o governo precisa, por mais impopular que seja a votação – diz Jovair Arantes (PTB-GO).
Um dos nomes do bloco para a sucessão na Câmara, Jovair precisa vencer a concorrência com Rogério Rosso (PSD-DF) e Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). Apesar do apoio a Maia, oficialmente o Planalto se apresenta neutro na eleição.
– Todos os pré-candidatos são da base e vão trabalhar com o presidente Temer – afirma Darcísio Perondi (PMDB-RS).
Ciente de que precisa dos votos do centrão para aprovar a reforma da Previdência em 2017, Temer avalia abrir espaço na Esplanada para Jovair ou um aliado. Contudo, a PEC é alvo de críticas em todos os partidos da base.
A baixa popularidade de Temer também reduz o ímpeto de parlamentares na discussão da Previdência. Em conversas reservadas, deputados comentam que o risco do presidente não concluir o mandato é real. O Congresso entra em recesso com prognósticos de que em fevereiro e março a instabilidade pode se ampliar com as revelações da Odebrecht. Mesmo blindado de investigações anteriores ao mandato, o peemedebista ficaria sem condições políticas de governar.
Alerta ligado
No Senado, onde o governo costuma ter vitórias folgadas, a redução dos votos no segundo turno da PEC do Teto ligou o alerta do Palácio do Planalto. Os protestos contra o limite de despesas, a baixa aprovação de Michel Temer e a expectativa de novas turbulências com a delação da Odebrecht ameaçam a estabilidade da base do presidente.
O primeiro sinal de eventuais defecções se deu na terça-feira, quando a PEC do Teto foi aprovada com 53 votos favoráveis e 16 contrários. No primeiro turno, o placar registrou 61 a 14. No mesmo dia, o democrata Ronaldo Caiado (GO) comentou que a crise institucional pode exigir um "último fato para preservar a democracia", que seria a renúncia de Temer e a realização de eleições gerais – para tal, o presidente teria de deixar o cargo até o final do ano.
Apostando que a baixa popularidade de Temer enfraquecerá a base, a oposição começa a se aproximar dos descontentes. Para evitar deserções, o governo conta com a força de Renan Calheiros (AL), Eunício Oliveira (CE) e Romero Jucá (RR), que aglutinam outras bancadas. Em outra frente, Temer negocia para ampliar a presença do PSDB na Esplanada. Ontem, tucanos almoçaram com o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Depois do encontro, Aécio Neves (MG) reforçou o compromisso de aprovar a agenda econômica do palácio.
Os três pilares da base de Michel Temer
PMDB – Partido do presidente da República, tem a maior bancada do Congresso – 66 deputados e 19 senadores. Não deve ter candidato à presidência da Câmara e pretende manter o controle do Senado.O Planalto trabalha para que Eunício Oliveira (CE) suceda Renan Calheiros (AL). No Senado, o peso e o poder de influência da bancada são maiores nas votações.
Centrão – O bloco que era liderado pelo ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) atua na Câmara. Trata-se de uma coalizão de partidos (PSD, PP, PTB, PR, PRB, PSC, SD e outros nanicos), com dissidências nas bancadas. Projeções indicam que reúne cerca de 200 deputados e tem força na maior parte das comissões, porém, a soma varia de votação para votação.
Antiga oposição – Reúne na Câmara PSDB, DEM e PPS, que formavam a oposição original ao governo Dilma Rousseff. No Senado, tucanos e democratas também atuam conectados. Com espaço generoso na Esplanada, o grupo tem 84 deputados e 16 senadores. No Senado, já lida com dissidências, como Ronaldo Caiado (DEM-GO), que defende a renúncia de Michel Temer.
PROJETOS AMEAÇADOS
Disputa na Câmara e impacto da delação da Odebrecht ameaçam a estabilidade da base de Michel Temer e a aprovação de projetos prioritários
Reforma da Previdência
É considerada vital para o equilíbrio das contas. O tema encontra resistência na Câmara e no Senado. Entre as medidas constam a idade mínima de 65 anos para aposentadoria e a exigência de 49 anos de contribuição para se aposentar com o teto a que tem direito.
Reforma trabalhista
Considerada uma das prioridades do governo quando Temer assumiu a Presidência, foi deixada para o próximo ano. A equipe econômica não fechou a proposta, que pretende modernizar a legislação trabalhista e facilitar negociações entre sindicatos e patrões.
MP do Ensino Médio
Aprovada na Câmara, a medida que modifica o Ensino Médio foi enviada ao Senado, que tem até o início do próximo ano para referendar as regras. A tendência é ser aprovada. Currículo flexível e aumento da carga horária constam na reforma do Ensino Médio.
MP das concessões
Para tentar destravar concessões, o governo editou medida que prevê, para rodovias e ferrovias, renovação de contratos em andamento mediante novos investimentos. Concessões em dificuldade seriam devolvidas. Deve passar na Câmara e no Senado.