Em mensagem aos auditores que colocaram à disposição postos estratégicos e cargos de confiança no Fisco, o secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, apontou para os "muitos interessados no não funcionamento, na desorganização, no enfraquecimento da Instituição". Rachid disse que, ao deixar a função que se ocupa ou mesmo ameaçar fazê-lo, ficam frágeis as linhas de responsabilidade e comando da Instituição e perde-se a funcionalidade do órgão.
"Um navio não chegará mais rapidamente ao seu destino com o abandono de seus comandantes. Pelo contrário, restará à deriva e correndo o risco de naufragar. Cabe equilíbrio emocional e serenidade neste momento", sugeriu o secretário, dramaticamente.
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A carta de Rachid, endereçada a delegados e a superintendentes, busca estancar a maior crise da história da Receita, deflagrada por um qualificado e numeroso corpo de auditores insatisfeitos com o que chamam de graves distorções no texto original do Projeto de Lei 5864/2016, sobre a carreira tributária. Eles repudiam o partilhamento da quase totalidade das prerrogativas que são privativas do cargo de auditor fiscal.
Na primeira grande reação às alterações do projeto, na quarta-feira, um bloco de 57 auditores ameaçou renunciar às funções de confiança da 8ª Região Fiscal (São Paulo), a que mais arrecada tributos em todo o país, na ordem de R$ 500 bilhões por ano.
Na sexta-feira, a crise chegou ao seu grau máximo – 400 auditores, entre subsecretários, superintendentes regionais, coordenadores-gerais e especiais, delegados e inspetores, divulgaram manifesto contra os efeitos nocivos do substitutivo aprovado pela Comissão Especial da Câmara que analisou o projeto 5864/2016.
"Estamos assistido movimentos de entrega de cargos na Receita Federal como manifestação de insatisfação com a tramitação do PL nº 5.864/2016", escreveu Rachid a seus pares. "Os efeitos desta linha de ação serão o empobrecimento produtivo e intelectual da Receita Federal; o enfraquecimento institucional no plano efetivo e o desgaste de sua imagem; e, a consequência mais grave, a derrocada dos servidores devido à desindentificação dos quadros funcionais com a Instituição e seus valores".
"Sem desconsiderar, o colapso do respeito mútuo e dos laços de amizade, efeitos perversos que podem perdurar indefinidamente".
O secretário faz uma reflexão: "Há algum resultado positivo derivado desse imenso sacrifício no qual, no limite, imola-se a própria Instituição? ê isto que a sociedade espera da Receita Federal?"
Rachid seguiu, "alguns esperam que o Poder Executivo se sinta com a faca no pescoço e tome providências e que o Congresso Nacional se sensibilize. No entanto, como se pode imaginar que, para fortalecer uma campanha reivindicatória, deva-se promover a ruptura hierárquica, favorecendo o enfraquecimento e desmonte da Instituição? Ainda mais quando o Poder Executivo demonstra empenho em buscar solução para o pleito".
Faz uma ressalva, "é bom lembrar que o processo legislativo ainda está em sua primeira etapa". Depois, uma previsão. "Um navio não chegará mais rapidamente ao seu destino com o abandono de seus comandantes. Pelo contrário, restará à deriva e correndo o risco de naufragar".
Ele sugeriu que "cabe equilíbrio emocional e serenidade neste momento".
"Ora, se tal estratégia parece tão negativa, sob tantos aspectos, então por que vem sendo disseminada? Qual é o substrato que a alimenta? O que pode levar uma Instituição a sua autodestruição? Na raiz deste fenômeno, será que não reside um processo de desmoralização, de opressão da autoestima e de desvalorização dos seus quadros funcionais (bandeira sempre defendida na retórica de alguns)? Não é possível perceber um verdadeiro mantra da desvalorização profissional, soando todos os dias e em todos os lugares?".
Ele abordou, ainda, "a quem, internamente, interessa a desorganização e o enfraquecimento da Receita Federal? Aos que trabalham e que identificam nos seus processos de trabalho e projetos grande significado para sua própria realização pessoal? Aos que se consideram moralmente obrigados a prestar um melhor serviço aos contribuintes em troca da remuneração que aceitaram receber ao ingressarem nos seus quadros sem prejuízo do direito de buscar melhorias? Certamente, não".
Sem citar nomes, o secretário destacou, "externamente, poderiam ser identificados muitos interessados no não funcionamento, na desorganização, no enfraquecimento e no fatiamento da Receita Federal. Mas, internamente, só podemos listar como interessados os que querem um lugar jamais uma organização sem responsabilidades pessoais, sem controles, e que estimulam outros servidores a adotarem prática que parece ser heroica, mas que é apenas destruidora."
Apontou para um cenário sombrio, "ou alguém honestamente considera que será possível reerguer a Receita Federal que admiramos e onde nos realizamos profissionalmente depois de transformá-la em escombros, ao romper o respeito coletivo, profissional e os laços de amizade com os colegas? É provocando o desrespeito por parte da sociedade que vamos valorizar a Instituição?".
"Assim, julgo que estão enganados aqueles que, ao argumento de que a Instituição está sendo atacada (desmonte da Receita Federal), deve-se entregar o comando (as funções) como forma de manifestação de repúdio".
Por fim, insistiu que "é precisamente o contrário. Trata-se de conduta extremamente equivocada. O momento exige lucidez. É hora de mostrar a vitalidade da Instituição, mantendo a energia e o comando necessários para defender a Receita Federal. No campo da estratégia, não é razoável que se abandone o combate, que pode ser longo, ao revés da primeira batalha!".
*Estadão Conteúdo