O marqueteiro João Santana, que coordenou as campanhas presidenciais de Lula (2006) e de Dilma (2010 e 2014), retificou em 2015 todas as Declarações de Imposto de Renda Pessoa Física (DIRPF) dos anos-calendário de 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014. Ele incluiu em sua prestação de contas à Receita a participação societária em empresas de comunicação constituídas em El Salvador, na República Dominicana, no Panamá e na Argentina.
A retificação ocorreu em meio ao avanço da Operação Lava-Jato, inclusive quando o próprio marqueteiro e supostos repasses de propinas de empreiteiras para o PT – seu maior cliente –, em forma de doação eleitoral, já eram alvos da Polícia Federal. Os dados tributários de Santana constam do documento intitulado Informação de Pesquisa e Investigação, produzido pela Receita e encartado nos autos da Operação Acarajé, deflagrada na segunda-feira por ordem do juiz federal Sérgio Moro.
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Santana e sua mulher, Monica Regina Moura, estão presos. O rastreamento da Receita atendeu à ordem de Moro, de 21 de outubro de 2015, que deferiu a quebra de sigilo fiscal do marqueteiro e da esposa no período compreendido entre 1.º de janeiro de 2004 a 21 de setembro de 2015. No relatório da Receita, eles constam como "indiciados". São alvos do mesmo procedimento duas agências de João Santana, a Polis Propaganda e Marketing Ltda e a Santana & Associados Marketing e Propaganda Ltda.
O documento destaca o capítulo "Declarações Retificadoras". Qualquer contribuinte pode, a qualquer tempo, adotar tal procedimento, mas chamou a atenção dos investigadores da Acarajé o fato de Santana ter feito a retificação em 2015, no auge da grande investigação sobre o esquema de corrupção na Petrobras. Em sua retificação ele acrescentou empresas no exterior que não foram comunicadas nas Declarações originais.
Na declaração de 2010, o marqueteiro registrou participação na empresa Polistepeque Comunicaciony Marketing S.A., estabelecida em El Salvador e constituída em 4 de junho de 2009, com capital de US$ 2 mil. Santana informou o Fisco que sua parte é equivalente a 60% do capital da empresa, ou US$ 1,2 mil. Na mesma Declaração (2010), segundo o relatório da Receita, o marqueteiro incluiu sociedade na Polis Caribe Comunicacion Y Marketing, localizada na República Dominicana, no valor de R$ 3.383,10.
Na Declaração de 2013 acrescentou participação no capital da Polis America S.A. na República de Panamá, cujo capital social é de US$ 10 mil. A Polis America, segundo a informação do próprio João Santana, foi constituída em 11 de junho de 2013 e sua participação é de 60% do capital social, ou US$ 6 mil. Além das empresas sediadas no exterior que foram acrescentadas na Declaração de Imposto de Renda Pessoa Física retificadora ele declarou ser proprietário da empresa Polis Propaganda localizada na Argentina, aberta e, 1.º de abril de 2003, com capital social de R$ 80 mil – sua parte é de 90%.
A Receita destaca em outro trecho do relatório Informação de Pesquisa e Investigação um empréstimo de R$ 2 milhões que João Santana fez à mulher, Monica Moura, em 2011, período em que o marqueteiro apresentou movimentação financeira de apenas R$ 92.288,28.
– Portanto estes recursos não circularam por sua conta corrente. Esta dívida foi baixada no ano de 2012, sem mencionar a forma que foi quitada. No ano de 2012 o contribuinte não apresentou nenhuma movimentação financeira em seu CPF, portanto, este pagamento, se houve, também não circulou em conta bancária – assinala o documento.
Em outro capítulo, intitulado "Recebimento de Lucros e Dividendos x Movimentação Financeira", os auditores chamam a atenção para "a baixa movimentação financeira do contribuinte em relação a seus rendimentos declarados". Em 2012, Santana não teve movimentação alguma em seu CPF. Nos demais anos, foi sempre muito inferior aos rendimentos – remuneração pelo trabalho, lucros e dividendos, aplicação financeira.
– Nesse caso, também cabe a observação, de que se houve o recebimento efetivo destes rendimentos, não circularam pela conta bancária do contribuinte.
A Receita aponta que nas Declarações apresentadas destacam-se sempre os altos valores declarados relativos a dinheiro em espécie: R$ 200 mil (2010); R$ 300 mil (2011); R$ 300 mil (2012); R$ 300 mil (2013); R$ 300 mil (2013). Outro fato que chamou a atenção em relação a capacidade econômico-financeira de Santana relaciona-se à Declaração de Operações com Cartões de Crédito (Decred).
As administradoras de cartão de crédito estão obrigadas a prestar, por intermédio da Decred, informações sobre as operações efetuadas com cartão de crédito, compreendendo a identificação dos usuários de seus serviços e os montantes globais mensalmente movimentados.
– O contribuinte apresentou nos anos de 2011 e 2012 valores elevados de gastos com cartão de crédito e baixa ou nenhuma movimentação financeira, portanto, estes valores não estão circulando pela conta bancária do contribuinte – assinala o relatório, que traz um quadro com os valores da movimentação financeira via cartões de crédito.
Em 2011 ele gastou R$ 328.734,78 com cartões, mas apresentou apenas R$ 8.152,17 de movimentação financeira. Em 2012, R$ 520.118,23 gastos nos cartões, com R$ 0,00 de movimentação financeira. A defesa do casal não foi localizada para comentar o relatório da Receita.