A escritora americana Harper Lee, autora do clássico O Sol é Para Todos (1960), morreu nesta sexta-feira, aos 89 anos.
Harper destacou-se com um único romance, de sucesso imediato. Publicado em 1960, O Sol é Para Todos – história do advogado Atticus Finch, que defende um homem negro da acusação de estupro na racista e antiquada cidade de Maycomb, Alabama – foi vencedor do Pulitzer e ganhou adaptação cinematográfica em 1962, com Gregory Peck no papel de Finch.
A rápida popularização da obra e sucesso advindo da premiação garantiram a Harper seu nome no panteão de grandes romancistas norte-americanos e deixou uma legião de fãs à espera de nova obra – uma espera que durou até 2015, quando foi lançado Vá, Coloque Um Vigia. O romance seria a primeira versão de O Sol é Para Todos, que foi rejeitada pela editora – que teria sugerido que a história fosse contada pelo ponto de vista da pequena Scout, que de fato tornou-se narradora.
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Virtualmente reclusa após o estrondoso sucesso de seu livro, pouco sabia-se sobre a vida pessoal de Harper. Sabe-se, no entanto, da grande amizade entre ela e Truman Capote, iniciada ainda na infância, quando o escritor foi viver com parentes em Monroeville. Uma das personagens da autobiografia de Capote, baseada nela, foi o que a teria motivado a largar a carreira no Direito que veio a perseguir (primeiro na Universidade do Alabama, depois em Oxford) para ir atrás do sonho de ser escritora em Nova York.
A escritora também colaborou com Capote, em 1959, na pesquisa sobre o assassinato de uma família de fazendeiros na cidade de Holcomb, Kansas, trabalho que se tornou o livro-reportagem A Sangue Frio. Antes disso, sem conseguir publicar nada, ela foi apresentada por amigos de Capote, em 1956, ao agente Maurice Crain, que, juntos deram-lhe de Natal um ano inteiro de salário para que ela escrevesse "o que quisesse". Foi assim que surgiu o primeiro manuscrito de O Sol é Para Todos, aceito pelo editor Tay Hohoff, da JB Lippincott & Co, em 1956.
A história original contava o retorno de Scout, uma mulher adulta, à cidade onde cresceu para visitar o pai, Atticus. Hohoff então convenceu Harper a reescrever o romance sob o ponto de vista de Scout.
O lançamento da obra foi explosivo: O Sol é Para Todos tornou-se um best-seller imediato, aproveitando o momento pivotal em que se encontrava o movimento pela igualdade racial nos Estados Unidos. O prestígio culminou com a premiação do Pulitzer de ficção, um ano depois, quando a escritora tinha 35 anos. Em 1962, sai a adaptação cinematográfica do romance, elogiada pela escritora. Na ocasião da estreia do filme, em que Gregory Peck interpreta Atticus Finch, ela se disse satisfeita com o resultado da adaptação e assustada com a perspectiva de escrever uma segunda obra. O filme veio a ganhar três Oscars: de melhor ator para Peck, de melhor roteiro adaptado e de melhor direção de arte.
Assista ao trailer de O Sol é Para Todos (1960)
Pouco depois, com a ascensão de Truman Capote, a amizade entre os dois arrefeceu e Harper entrou no ciclo de reclusão em que permaneceu até o fim da vida. Sua escrita viria a aparecer em cartas – ela respondeu a uma secretaria de educação de um condado do Estado da Virginia que queria banir seu romance por ser "imoral" e, em 2006, escreveu para a revista O, da apresentadora Oprah Winfrey, para falar sobre o valor dos livros de papel. "Algumas coisas deveriam aparecer apenas em páginas suaves, não em metal frio", escreveu, à época.
Em 2007, a autora foi conduzida à Academia de Artes e Letras dos Estados Unidos. No mesmo ano, em novembro, fez uma rara aparição pública quando foi presenteada com a Medalha Presidencial da Liberdade por George W. Bush. Semanas depois, sofreu um derrame que a deixou confinada a uma cadeira de rodas e com grau avançado de cegueira e surdez. Ela vendeu então seu apartamento no Upper East Side, em Nova York, e mudou-se de volta para sua cidade natal, onde a irmã, Alice, então com 95 anos, cuidou-lhe até sua morte, em 2014. Em 2013, Alice ajudou Harper a reconquistar os direitos autorais de O Sol é Para Todos, à época pertencentes ao genro de seu agente literário, alegando que o homem teria se aproveitado de sua fragilidade após o derrame. As partes entraram em um acordo.
Foi só em 2015 que Vá, Coloque um Vigia, foi publicado, causando controvérsia quanto ao estado de saúde da autora e sua concordância sobre a publicação.