O governo atribuiu a derrota no primeiro teste do impeachment à atuação do vice Michel Temer, que comanda o PMDB. Na avaliação do Palácio do Planalto, o clima de rebelião na Câmara dos Deputados piorou com o vazamento da carta escrita por Temer à presidente Dilma Rousseff. A presidente e o vice vão conversar na noite desta quarta-feira, mas assessores dos dois lados afirmam que a oficialização do "divórcio" é apenas uma questão de tempo.
Nos bastidores, ministros culparam Temer pelo agravamento da crise política e disseram que o gesto dele, rompendo com o governo, funcionou como um gatilho para que alas do PMDB e de outros partidos da base aliada se rebelassem contra Dilma. Menos de 24 horas após a divulgação da carta, o Planalto sofreu um revés na Câmara, quando o plenário aprovou uma chapa majoritariamente contrária a Dilma para a Comissão Especial que analisará o impeachment. À noite, porém, uma liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu essa decisão.
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- Eu não estou rompendo com o governo, mesmo porque sou o vice-presidente. Fiz apenas um desabafo, que já deveria ter feito há muito tempo - afirmou Temer a amigos com quem se reuniu, na terça-feira, no Palácio do Jaburu. - Fiquei indignado com o vazamento de uma carta que era dirigida à presidente e a mais ninguém.
Na correspondência, Temer se queixou de "menosprezo" e afirmou ter passado os quatro primeiros anos de governo como "vice decorativo".
Após se dizer "perplexa", Dilma enviou dois emissários para conversar com Temer e saber o que poderia ser feito para recompor o relacionamento institucional. O primeiro foi o ministro-chefe da Advocacia-Geral da União, Luís Inácio Adams, recebido pelo vice após a meia-noite de segunda-feira. Depois foi a vez do ministro da Casa Civil, Jaques Wagner.
No diagnóstico do Planalto, o vice não apenas não vai mover uma palha para ajudar Dilma a enfrentar o impeachment, como deixou claro que pretende se juntar ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ao dizer que o pedido para o afastamento dela tem "lastro jurídico".
- Quem apertou o botão do impeachment foi o PT, e não o Temer - reagiu Cunha.
Depois de muitas idas e vindas, os três deputados do partido no Conselho de Ética decidiram votar contra o presidente da Câmara, acusado de manter contas secretas na Suíça com dinheiro desviado da Petrobras. Cunha nega as acusações e aponta "perseguição" do Planalto.
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O tom duro da carta de Temer provocou tanta tensão no governo que, ao longo do dia, auxiliares da presidente e do vice se acusaram mutuamente pelo vazamento. "Jamais eu ou o PMDB fomos chamados para discutir formulações econômicas ou políticas do país; éramos meros acessórios, secundários, subsidários", escreveu Temer. Ele iniciou a carta com uma expressão em latim (Verba volant, scripta manent), que significa "a palavra voa, o escrito permanece".
A ordem no Planalto foi não reagir, mas o governo passou o dia medindo a temperatura da nova crise, com monitoramento das redes sociais. A conclusão foi a de que tanto Dilma quanto Temer saíram perdendo com o episódio.
Um lado culpa o outro sobre vazamento de carta
O vazamento da carta gerou versões desencontradas entre aliados dos dois ocupantes do Palácio do Planalto. A assessoria do vice divulgou uma nota no Twitter dizendo que Temer se "surpreendeu com o vazamento", já que carta era "confidencial" e foi enviada em "caráter pessoal" à presidente.
Segundo versão de um aliado do peemedebista, Dilma recebeu a carta às 17h34min em seu gabinete e, quando Temer desembarcou em Brasília, por volta das 20h, o conteúdo do documento já era público. O vice escreveu a carta quando ainda estava em São Paulo para cumprir agenda no fim do dia e a encaminhou por e-mail para sua chefe de gabinete enviar à Dilma.
Para aliados do vice, a divulgação da carta foi vista como um gesto de "deseducação política" da presidente. Já auxiliares de Dilma afirmam que a divulgação do texto não saiu do gabinete presidencial. A análise é de que não faria sentido o Planalto tornar público o conteúdo de uma carta que deixa claro o afastamento entre o vice e a presidente, justo no momento em que ela buscava se aproximar dele.
* Estadão Conteúdo