Qualquer que seja o desenlace da crise política que engoliu o governo federal nas últimas semanas, o PMDB está pronto para permanecer no poder.
Enquanto mantém os fiapos de governabilidade, na figura do vice­presidente e articulador político Michel Temer (SP), o partido tem alas negociando com o PSDB e instigando um eventual impeachment da presidente Dilma Rousseff.
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A postura dúbia deriva das divisões do PMDB, uma federação de caciques regionais, que atualmente vive a disputa por hegemonia interna entre Temer - que preside a sigla -, Eduardo Cunha (RJ) e Renan Calheiros (AL), presidentes da Câmara e Senado. Ao projetar candidatura própria ao Palácio do Planalto em 2018, o partido trabalha com diferentes cenários.
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Em um deles, ajuda Dilma a encerrar o mandato em troca de mais espaço e orçamento na Esplanada. A presidente promoveria reforma ministerial para dotar seu fiador de pastas com caixas mais irrigados. As trocas beneficiariam aliados de Temer e Renan, além de deputados que abandonarem Cunha.
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Outros cenários indicam ocaso de Dilma e ascensão de Temer. A presidente sofreria impeachment no Congresso ou renunciaria ao cargo - hipótese considerada pouco provável. Dilma demonstra não estar disposta a abrir mão da votação recebida no ano passado. Na sexta-feira, em discurso, disse ser uma pessoa que aguenta pressão e ameaças:
- Aliás, sobrevivi a grandes ameaças a minha própria vida.
Em seguida, ressaltou que a democracia tem de ser respeitada:
- Voto é a fonte da minha legitimidade e ninguém vai tirar essa legitimidade que o voto me deu.
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O cardápio de alternativas para o futuro é degustado em jantares em Brasília. Na segunda-feira, Cunha discutiu com a oposição e parte da base aliada o impeachment em manobra na qual ele rejeitaria o pedido e os colegas recorreriam ao plenário, que aprovaria a abertura do processo.
Declaração de Temer gerou diferentes interpretações
Na terça-feira, foi a vez de Renan se reunir com tucanos, entre eles Aécio Neves (MG) e José Serra (SP), no apartamento do também senador Tasso Jereissati (CE). Já na quarta­-feira, um grupo de 11 deputados do PMDB, que inclui Osmar Terra (RS), sentou-se à mesa do restaurante do hotel Mercure para discutir a saída de Dilma. Eles entendem que a renúncia seria o caminho mais rápido para acalmar a situação política e recolocar a economia nos trilhos. E apostam em Temer.
- O problema é a credibilidade que a presidente perdeu. A situação política e econômica se deteriora rapidamente. A solução é Michel assumir um governo de união - afirma Terra.
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Reconhecido pelo estilo diplomático e a concisão nas entrevistas, o vice se converteu no personagem da semana. Após reunião com líderes partidários e ministros, na quarta, ele fez um apelo à base, defendeu o governo e admitiu a gravidade da crise, mas escorregou nas palavras.
- É preciso que alguém tenha a capacidade de reunificar a todos - disse.
A frase preocupou petistas e animou a oposição com a interpretação de que o "alguém" é o próprio Temer. Contudo, os aliados do paulista asseguram que se tratou apenas de um "ato falho". A polêmica, somada à derrota vexatória do governo na votação em primeiro turno da PEC que aumenta os salários da Advocacia-­Geral da União (AGU) e dos delegados federais e estaduais, levou o vice a colocar a função de articulador político à disposição de Dilma, que rejeitou a oferta.
- Michel, você fica - teria dito a presidente.
Prestigiado, Temer também se beneficia dos desdobramentos da Operação Lava-Jato e das possíveis denúncias do Ministério Público Federal contra Cunha e Renan, aguardadas ainda para agosto. A delação premiada de Fernando Baiano, apontado como operador do PMDB no esquema de corrupção da Petrobras, agravaria o quadro para os presidentes da Câmara e Senado.
Vice-presidente prega aliança com Renan
Apesar do prenúncio de dificuldades para Renan, o vice patrocina a ideia de ministros petistas que pregam a reaproximação do Planalto com o alagoano para assegurar a governabilidade e barrar a pauta-bomba da Câmara, um conjunto de projetos que aumentam gastos públicos.
A base avalia que a Lava-Jato será mais implacável com Cunha, que perderá força aos poucos - por isso a pressa dele em fomentar um impeachment. Cauteloso, Temer age para evitar que o rótulo de "golpista" fique com a legenda. Com o fim prematuro ou a continuidade do governo Dilma, o PMDB tenta construir uma imagem de partido "eficiente na gestão", necessário para a estabilidade do Brasil. Quer seguir no poder.
Cenários avaliados pela sigla
Com Dilma
- A presidente controla a crise e termina o mandato. No caminho, realiza reforma ministerial ampliando a força do PMDB. Hoje no comando de sete pastas, o partido quer mais orçamento livre. Abriria mão de alguns ministérios em troca de caixa mais volumoso em áreas como Educação e Transportes. A reforma contemplaria Renan, pois o palácio vê no Senado a fórmula de manter a governabilidade. A permanência no governo seria reavaliada após as eleições de 2016, já que o PMDB ensaia candidatura própria em 2018.
Sem Dilma
- Traída pelos aliados, a presidente sofre impeachment no Congresso baseado na rejeição de suas contas ou, em uma hipótese menos provável, negocia a saída por meio de renúncia. A articulação para retirada de Dilma levaria Temer ao poder em um governo com discurso de reconstrução nacional, semelhante ao de Itamar Franco em 1992. Temer tentaria trazer para a base o PSDB e siglas independentes, a exemplo do PSB, a fim de pavimentar uma candidatura forte, sua ou de outro nome do PMDB, para 2018.