Em menos de uma semana após a RBS TV revelar um esquema que altera quilometragem de veículos da Assembleia Legislativa, a reportagem da Rádio Gaúcha foi conferir oficinas mecânicas especializadas em velocímetros e nos chamados odômetros, equipamento no painel usado para medir justamente as distâncias percorridas.
Sem saber que falavam com repórteres, os responsáveis por três locais confirmaram que faziam o serviço. Depois disso, um deles, após contato por telefone e sabendo que se tratava da Rádio Gaúcha, negou.
Investigação do Tribunal de Contas do Estado (TCE) indica que assessores de alguns deputados têm adotado esta prática, mas os nomes ainda não foram revelados. Eles estão enviando esses veículos até mecânicos para aumentar artificialmente a quilometragem, já que os parlamentares recebem indenização por quilômetro rodado.
Na última sexta-feira, a equipe da Rádio Gaúcha foi na mesma oficina da Avenida Sertório que aparece nas imagens da TV fazendo a fraude. A equipe disse que queria vender um carro e, para ter maior preço de mercado, queria fazer o contrário que os deputados são acusados, então o objetivo era diminuir a quilometragem.
Em um primeiro momento, o responsável disse que não estava fazendo mais, mas quando a reportagem disse que iria embora, o responsável destacou que um amigo fazia a adulteração do odômetro, sendo necessário apenas trazer o painel do carro na própria oficina e que o valor seria de R$ 100, R$ 20 a mais do que cobrou para a equipe da televisão. Para não induzir ou cometer uma irregularidade, o serviço não foi realizado.
Outras oficinas
Não é qualquer mecânica que trabalha com odômetros: somente as especializadas no assunto. Na avenida Farrapos, a Rádio Gaúcha foi em uma destas oficinas, mas o proprietário, aparentando desconfiança, negou que fazia a adulteração. Depois, a equipe foi na Zona Sul da cidade, na avenida Otto Niemayer. O dono da mecânica disse que não fazia este serviço irregular, mas informou quem estava fazendo. Em uma oficina especializada na avenida Campos Velho, a chamada faixa preta, no bairro Cristal, o responsável pelo local confirmou que diminuia a quilometragem.
- Meu irmão, eu consigo baixar a quilometragem do velocímetro de uma Fiorino?
- Que ano é?
- 2010.
- Tá aí ela?
- Não, não tá...
- Acho que consegue sim.
- Eu consigo baixar o quanto eu quiser, quanto sai pra fazer isso?
- 80 pila.
No sábado, a reportagem da Rádio Gaúcha se identificou e ligou para a mesma oficina da Avenida Campos Velho, mas a resposta foi outra:
- Meu nome é Cid da Rádio Gaúcha, tudo bem?
- Tudo.
- Nos informaram que vocês estariam adulterando os odômetros, isso é verdade?
- Não, não.
- Não fazem isso?
- Não.
- Tem certeza disso então?
- Sim.
A reportagem seguiu procurando outras oficinas especializadas em odômetros. Na Rua Caldre Fião, bairro Santo Antônio, o responsável pela elétrica dos carros disse que fazia a adulteração, cobrando R$ 70 e que era só levar o veículo até o local.
Adulteração
Mecânicos que trabalham com este tipo de equipamento disseram que, nos últimos dias, a fraude diminuiu um pouco devido à denúncia feita pela RBS TV. Mas destacaram que a prática é muito comum, envolvendo inclusive revendas de veículos usados. Quem frauda o odômetro ou vende carros adulterados comete crime contra as relações de consumo, previsto na lei 8.137/90. A pena pode variar de dois a cinco anos de prisão.
Como tentar evitar
Para evitar esse tipo de problema, disseram que alguns cuidados têm de ser tomados, como ficar atento ao estado geral do carro usado a ser comprado. Verificar pneus, lataria, motor e principalmente o odômetro, pois é nele que aparece a quilometragem desde a fabricação do veículo. Hoje, nos carros modernos, todos são digitais.
E preste a atenção: em condições normais de uso, um carro roda entre 12 mil e 15 mil quilômetros por ano (pode ser maior se a pessoa fizer longas e constantes viagens ou se for carro de empresa. Também pode ser menor se for um segundo ou terceiro carro de uma família, ficando o mesmo muito tempo parado em garagens). Então, um carro adquirido pelo primeiro dono em janeiro de 2014, teria hoje em média 18 a 21 mil quilômetros.
Se tiver menos, desconfie. Mas repito, veja se é um carro chamado de "garagem" e verifique outros itens. Ouvir barulho do motor e do fechamento de portas, conferir se o motor foi lavado e se lacre dos parafusos do motor e das portas foi substituído.
Uma vistoria minuciosa também é importante e neste caso, para evitar que você caiu em uma fraude, a maneira mais segura de se conhecer a quilometragem real de um veículo é levando-o a uma oficina autorizada e com alta nível de especialização. Tem que solicitar que passe o módulo central do automóvel por um aparelho chamado scanner. Esse teste vai apresentar o número exato de quilômetros rodados pelo carro.
* Rádio Gaúcha