O radialista e vereador João Carlos Maciel (PMDB) resolveu falar sobre os acontecimentos recentes que se abateram em sua vida pessoal e política - desde 26 de março quando foi preso em flagrante, sob a suspeita do crime de tráfico ilícito de medicamento controlado. Ele ficou 39 horas na penitenciária, após cumprimento de mandado, durante a Operação Medicaro, na sede de seu programa social.
Na tarde de sexta-feira, por cerca de 35 minutos, o peemedebista recebeu o Diário em seu gabinete, no Legislativo. Maciel, que vive em Santa Maria há em 16 anos, soltou o verbo. Desiludido com a política e com o seu partido, Maciel falou sobre a prisão na Medicaro, seu trabalho social, futuro político e admitiu, pela primeira vez, que o sonho de ser prefeito chegou ao fim. Mas pode começar uma carreira de escritor.
Confira, abaixo, a íntegra da entrevista de Maciel.
Diário de Santa Maria - Qual a sua relação com a Operação Medicaro?
João Carlos Maciel - Não há relação alguma. Nada. Quem diz isso não conhece o meu trabalho. Te asseguro isso. A imprensa, a Polícia Federal já disseram que eu não tenho ligação alguma com isso.
Diário - A Polícia Federal encontrou muitos medicamentos na sede do seu programa social. Qual a procedência deles? O senhor foi ingênuo?
Maciel - Quando se tem um sistema de doação, tu tens, por exemplo, a dona Maria que liga e diz que tem aquele medicamento que uma determinada pessoa precisa. E, claro, não é apenas uma pessoa que tem aquele medicamento. Dezenas de pessoas ligam e levavam esses remédios para a sede do programa social. E tu, obviamente, não vai jogar fora isso. Até porque amanhã ou depois, esses medicamentos seriam úteis para outras pessoas e quem precisaria, com uma receita médica, poderia tirar o remédio. Podia, né...Tudo com muita responsabilidade. Clínicas, médicos, profissionais da saúde me ajudavam com doações. Todas (doações), obviamente, com procedência legal e comprovada. Estou aqui há 16 anos e te digo que o sistema de doação dos medicamentos sempre existiu ao longo desses 40 anos de trabalho social. Nunca fui notificado por alguém que me dissesse que é crime ou que é proibido. Primeiro, que esses medicamentos eram recebidos por doação de pessoas que iam "ao ar" (em referência ao programa de rádio). Meu objetivo era ajudar quem precisa.
Diário - O senhor tem afirmado que irá deixar a política. Vai mesmo?
Maciel - A política me trouxe muitas tristeza e decepções. Eu tenho um trabalho maravilhoso, um público enorme e posso fazer mais e melhor com a minha inteligência e as ideias que tenho frente aos projetos que desenvolvo. Eu tinha tudo para ser um líder. Quando eu vou aos bairros tu não faz ideia de como eu sou abordado. Eu, sim, estou nas vilas, nos bairros. Eu ouço o povo por vocação e não por estar na condição de vereador. Por isso que eu falo e me comporto como o povo. Eu poderia ser um grande líder, mas o partido não quis. Essa é a minha primeira decepção. Por três votações fui o mais votado do partido e, em um das eleições, fui o mais votado da cidade. E nunca, nunca o partido sequer olhou ou sinalizou para essa liderança. Não quiseram dar espaço para consolidar uma nova liderança em detrimento de alguma conveniência dos caciques do partido. Sou uma liderança morta. Mataram em vida um líder.
Diário - Em caso de uma eventual saída sua da política, como ficaria o seu projeto social?
Maciel - Eu teria um pouco de dificuldade para manter a estrutura. Eu realizo esse trabalho porque eu quero ser útil à sociedade de forma coletiva e não de forma isolada. Eu ajudo a inúmeras famílias. Eu sou mais útil tendo um substancial para manter isso. Te digo seguramente que tudo que eu ganho é investido no trabalho social. Tudo: sede, caminhões. Agora, a partir do momento em que eu não for mais (vereador) vou ter que manter tudo isso com o meu trabalho de rádio. Mas vou continuar fazendo ainda que de forma mais lenta. E com menor intensidade e com volume menor. Mas essa é uma missão que tenho e que seguirei fazendo. Por três mandatos como vereador consegui desempenhar de forma espetacular esse trabalho.
Diário - Há quem diga que o senhor faz assistencialismo e, por consequência disso, é um campeão de votos. Não lhe preocupa ser acusado de compra de votos?
Maciel - Tenho, hoje, uma grande audiência e me propus a ajudar as pessoas ao longo de 40 anos. Como que eu iria saber, quatro décadas atrás, que eu seria vereador? (risos). Não tem como, né? Essa acusação, de quem quer que seja, atinge a minha alma. A dignidade e a decência do meu trabalho foram colocados em xeque. Entrei na vereança para manter esse trabalho social. Quem vota em mim é quem me ajuda a auxiliar os outros. Nem sempre quem recebe (a ajuda) vota em mim. Isso é notório. Tenho um trabalho social honrado, legal, leal. Se o poder público atendesse às demandas dos carentes eu não precisaria fazer o que faço. Eu atuo na falha dos poderes constituídos. Talvez por notarem que eu estou ao lado do povo e não do partido e, inclusive, por eu não dançar conforme a música eu acabei sendo preterido. O meu programa de rádio não tem filtro, eu fui perseguido por eles (administração municipal). Eles imaginavam que eu iria levantar a bandeira do PMDB ou que eu defenderia este ou aquele.
Diário - O senhor se ressente por ser preterido dentro do partido e, inclusive, por ser chamado de fogo-amigo?
Maciel - Eu tenho, acima de tudo, responsabilidade política. É o que muitos não têm. Eu sou agente político e tenho responsabilidades. Não sou de encobrir erros ou artimanhas. Esse é o lado é péssimo da política. Os acordos, os conchavos da política são nefastos. Não compactuo com isso.
Diário - O senhor veio para SM pelas mãos de Cezar Schirmer. Como é a relação de vocês hoje?
Maciel - Nós somos amigos. Temos uma relação amistosa. Só que ele mesmo sabe que a nossa relação política não houve correspondência por parte dele. Não houve um compartilhamento de ele estando no poder de me auxiliar e atender as minhas reivindicações na condição de líder do governo. Agora, é aquilo: se tu não dá apoio para o teu líder tu acaba por matar esse líder. Fui líder de governo e aí sou ignorado. Ele não deu bola para as críticas construtivas que fiz sobre a administração municipal.
Diário - E o sonho de ser prefeito. Como fica isso agora? O senhor pode deixar o PMDB e ir para outra sigla?
Maciel - O que eu quero, neste momento, é paz. Esse sonho de ser prefeito morreu, eu abdiquei disso. Porque um líder é criado pelo próprio partido e a sigla deve projetar esse líder. O que não aconteceu. Meu trabalho é aqui em Santa Maria. Quis ser vereador para poder manter o meu trabalho social aqui nessa cidade. Não tenho ambição política. Não tenho escalonato político, não tenho a ideia, de muitos, de fazer carreira na política. Não. Nada disso. O que procuro é o substancial para poder manter o meu trabalho social. O que é perfeitamente entendível.
Diário - O senhor não teme perder o mandato em decorrência do caso que, em tese, o senhor teria pedido a entrega de parte do salários de seus assessores, em 2009. Não lhe assusta a possibilidade de perder o mandato ou, até mesmo, ficar inelegível?
Maciel - Não. Eu nem acredito que acreditem nisso. Quem me conhece, quem me acompanha no dia a dia e quem trabalha comigo sabem da minha seriedade e da minha idoneidade.
Diário - O senhor pediu parte do salário deles?
Maciel - (risos) Não sei nem o que dizer. Eu acredito que tudo isso seja uma vingança por alguma coisa. Quando eu presidi a Câmara, em 2009, eu cortei muitas coisas aqui dentro. Dei fim às horas-extras e em tantas outras regalias. E aí eu mexi com um vespeiro e essas duas pessoas que trabalharam comigo, na Presidência da Câmara, trabalharam com aqueles que, por algum motivo, foram prejudicados pelos cortes que eu fiz. Isso foi uma vingança, algo combinado para me atingir. É manobra política.
Diário - Seus adversários dizem que o sr. tem muitos processos na Justiça. Isso é verdade?
Maciel - Não. Quem diz isso age de má-fé.
Diário - O sr. se sente injustiçado?
Maciel - Hoje eu trabalho e durmo a base de tranquilizantes. Quando alguém cresce, como eu - com audiência elevada, com um trabalho reconhecido, com votação expressiva, com doações crescendo e com uma equipe de voluntários expressiva - acaba sendo alvo de inveja.
Diário - Como foram as 39 horas na prisão?
Maciel - Isso vai dar um livro. Vou escrever um livro sobre isso. O título será "39 horas". O que eu vi e presenciei é a falência do sistema penitenciário, o estresse que os dois lados passam: o que está preso e os agentes penitenciários. O sistema carcerário não recupere ninguém. Alguns (presos) que estavam ali me diziam "se tivesse um curso aqui para a gente se ocupar, tudo seria diferente". Ali eu vi a crueldade e a dificuldade de um sistema que não consegue recuperar quem quer se inserir na sociedade. O sistema em si, aquele formato de prisão, não recupera ninguém. É preciso reformular e rever o que se tem hoje. Há presos que sequer sabem da sua situação. Ou seja, quanto tempo tem de pena a ser cumprido.
Diário - O que o senhor pensa sobre a possível abertura de uma subcomissão na Câmara para investigar se houve quebra de decoro de sua parte (em referência à Operação Medicaro).
Maciel - (suspiro). É mais uma tentativa de destruição do nome e da minha imagem. Mas estou pronto para responder tudo.