A Defensoria Pública instaurou um procedimento contra o comandante dos Bombeiros de Pelotas Sandro da Cunha Euzébio por improbidade administrativa. O oficial tem uma página na internet que oferece um manual para montar plano de prevenção contra incêndio, o PPCI. Escrever livros não é ilegal, mas prestar consultoria privada, sim. O site garante poder tirar dúvidas direto com o autor.
O defensor Igor Menini desconfia da oferta: “em tese, teríamos alguém dando assessoria privada ou esclarecendo dúvidas de forma paga a terceiros e ao mesmo tempo julgando depois os planos de prevenção a incêndio.”
Para acessar o livro online, é preciso pagar uma taxa de R$ 100 e mais uma anuidade de R$ 50. Segundo o artigo 26 do estatuto da corporação, comercializar é vedado aos bombeiros, sob pena máxima de perda do cargo. O site é registrado no nome do major e tem e-mail e celular pessoal dele. A Gaúcha, se passando por cliente, conseguiu contato às 16h30, em horário de serviço – enquanto alguns comerciantes relatam chegar a comparecer mais de 10 vezes nos bombeiros para conseguir um horário na agenda dele.
O caso é de tamanha repercussão que, ano passado, até foi feita uma denúncia interna para o comando de Porto Alegre. Mas o mais grave é que o comandante poderia estar beneficiando àqueles que comprassem o material dele para dar preferência na hora de conceder o PPCI. A Defensoria cruza os dados para conferir a denúncia. Comerciantes depuseram que os Bombeiros não só induziriam a comprar o manual, como também a , supostamente, adquirir material em determinada loja: “o que nos causou surpresa é o relato de testemunhas informando que haveria uma facilitação mediante compra em determinados locais e compra da apostila”, informa Igor.
O fato é que hoje existem 12 mil pedidos parados no batalhão. A preocupação é que micro e pequenas empresas estão falindo ou atuando na ilegalidade – porque o PPCI é pré-requisito para conseguir alvará de funcionamento da prefeitura. A média de espera é de 4 meses, mas há relatos de gente que aguarda desde 2010. Para maquiar as estatísticas, os bombeiros estariam cancelando pedidos e abrindo novos protocolos a cada mudança exigida.
O comando ainda ficou famoso ao interditar no dia da abertura três grandes eventos da cidade – a expofeira de 2013 por novas demandas 3 dias antes da abertura da feira, o carnaval, que teve de ser adiado e causou tumulto entre os foliões e a fenadoce ano passado e deste ano, que abriu com atraso após vistoria de última hora dos Bombeiros.
A repercussão é tanta que as sete maiores entidades representativas da cidade – como sinduscon e associação rural – pediram ao vice-governador, por escrito, a saída do comandante neste ano por má gestão. O problema é antigo: em 2013, o 3º comando já havia solicitado a Porto Alegre uma abertura de sindicância. Entidandes reclamam que a cada visita, uma nova exigência é feita. Duas audiências foram feitas na Câmara de Vereadores, o que levou o comando regional a formar uma força tarefa para tentar entender o problema e agilizar os processos.
Contraponto
Por e-mail, o major Euzébio disse que "meu manual possui registro e reconhecimento pela corporação, que inclusive estimulada a elaboração de manuais técnicos, os quais contribuem para o progresso na carreira. Evidentemente que não cometo nenhuma das ações questionadas". Ele ainda salientou a importância da obra: "O Manual PPCI Fácil tem servido nossa sociedade, sendo inclusive que foi utilizado como referencial teórico no Inquérito Policial Militar do incêndio na Boate Kiss".