1)Por que o acordo foi fechado agora?
Em novembro de 2013, o Irã e os países que compõem o grupo P5+1 (Estados Unidos, Rússia, China, Grã-Bretanha, França e Alemanha) acertaram que, até junho deste ano, negociariam um acordo amplo para limitar o programa nuclear iraniano. Ficou decidido que o Irã suspenderia o enriquecimento de urânio além de 5% e neutralizaria seu estoque de urânio enriquecido a 20% em troca do abrandamento das sanções contra o país. Em novembro do ano passado, ficou decidido que os países signatários do acordo definiriam, até 31 de março deste ano, as linhas políticas gerais do acerto, dando prazo de três meses (até junho) para que fossem especificados os detalhes técnicos.
2) O que está em jogo?
Em 2002, fontes que permanecem não identificadas tornaram pública a existência de um amplo programa nuclear no Irã. Notificado, o país não aceitou uma inspeção ampla e detalhada de suas instalações, afirmando que, nos termos do Tratado de Não-proliferação Nuclear (TNP), do qual é signatário, tem o direito de desenvolver atividades nesse terreno para fins pacíficos.
No auge do impasse, o governo do presidente Mohammad Khatami ofereceu às grandes potências o que ficou conhecido como "A Grande Barganha": o Irã suspenderia, na prática, seu programa nuclear em troca da normalização das relações com o Ocidente e do reconhecimento de seu status de potência regional. Os EUA, sob o governo George W. Bush, não aceitaram a proposta. Em 2005, o candidato apoiado por Khatami foi derrotado nas eleições presidenciais por Mahmoud Ahmadinejad, alinhado com a ala mais conservadora do regime iraniano. No ano seguinte, os Estados Unidos e a União Europeia deram início a uma série de rodadas de sanções contra indivíduos e setores da economia iraniana.
A partir desse momento, os EUA se desinteressaram em dialogar com o Irã, e a iniciativa diplomática ficou nas mãos da União Europeia (Alemanha, França e Grã-Bretanha). Os europeus criaram o grupo que passaria a ser chamado de P5+1, atraindo EUA, Rússia e China. Em 2009, primeiro ano do governo Barack Obama, uma nova tentativa de retomar o diálogo fracassou, com Irã e EUA se responsabilizando mutuamente pelo malogro.
No ano seguinte, com discreto incentivo dos EUA, Brasil e Turquia intermediaram um acordo pelo qual Teerã se comprometia a entregar aos turcos 1,2 mil quilos de urânio enriquecido a mais de 20% como primeiro passo para restabelecimento da confiança e busca de um acordo futuro. Embora os EUA tenham rejeitado formalmente a iniciativa, esse foi o primeiro indício de que os canais diplomáticos poderiam ser desobstruídos.
Em junho de 2013, os iranianos elegeram para a presidência Hassan Rouhani, que tinha uma plataforma clara de retomada das negociações (sua campanha foi feita contra "aqueles que puseram o Irã de joelhos", ou seja, a ala pró-Ahmadinejad). Obama considerou que valia a pena aproveitar a oportunidade, e em setembro os dois se falaram por telefone durante a ida de Rouhani a Nova York para participar da Assembleia Geral das Nações Unidas. No mês seguinte, foi deflagrado em Genebra o processo de negociação que conduziu a Lausanne.
3) Quem se opunha ao acordo?
Nos EUA, os adversários do acordo são, basicamente, os integrantes da oposição republicana, que, em novembro do ano passado, assumiram o controle das duas casas do Congresso (Câmara de Representantes e Senado). Essa rejeição à aproximação com o Irã deve-se, especialmente, a razões políticas e ideológicas internas: para os republicanos, Obama é um líder fraco que retirou depressa demais as forças americanas do Iraque e é o único responsável por todos os desastres da política externa do país. No exterior, os republicanos encontraram aliados valiosos no premier israelense, Binyamin Netanyahu (que cunhou a expressão "eixo Teerã-Lausanne-Iêmen", numa analogia óbvia com o Eixo Berlim-Roma-Tóquio da II Guerra Mundial, a coalizão liderada por Hitler e Mussolini), e na monarquia da Arábia Saudita. Para todos esses setores, o Irã é malicioso e apenas um novo regime em Teerã, dócil aos EUA, será digno de confiança.
4) Se havia tanta oposição, como foi possível fechar um compromisso?
A partir da eleição de Rouhani, Obama compreendeu, em primeiro lugar, que existia na opinião pública iraniana um estado de espírito favorável ao acordo e que a linha dura do regime, avessa a qualquer tipo de concessão no que diz respeito ao programa nuclear, poderia ser isolada. Em segundo, entendeu que, ao se opor ao acordo, os republicanos cavalgavam um cavalo cansado: os americanos estão fartos das complicações do Oriente Médio depois das invasões do Iraque e do Afeganistão e não se oporiam à normalização das relações. Em terceiro, é cada vez mais difícil esconder da opinião pública dos EUA o fato de que ninguém desrespeita mais os direitos humanos e de minorias no Oriente Médio do que alguns dos maiores aliados do país, como a Arábia Saudita e o Egito, e que Israel, sob o governo Netanyahu, não está seriamente empenhada na resolução do conflito com os palestinos. Por último, União Europeia, Rússia e China, cada um por suas próprias razões, têm pressa em integrar o Irã a suas redes de relações comerciais, diplomáticas e militares.
5) O que prevê o acordo?
O Irã entregará todo o seu urânio enriquecido a mais de 3% a 5% em "caução" (guarda) a um país estrangeiro, fechará mais de dois terços de suas centrífugas (equipamentos de alta tecnologia utilizados para enriquecer urânio) e suspenderá o enriquecimento por 10 anos.
Não serão construídas novas centrífugas por 15 anos. Os iranianos desmantelarão o reator de Arak, que pode produzir plutônio, também utilizado em armas nucleares. Estados Unidos e União Europeia suspenderão a aplicação de todas as sanções econômicas e financeiras contra o Irã assim que a Agência Internacional de Energia Atômica (Aiea) verificar a aplicação das medidas anteriores.