Eu estava no jantar de Pessach, na sinagoga, quando soube: um antropólogo escrevera, em ZH, que o "batuque" é perseguido por sacrificar animais, enquanto a "poderosa comunidade judaica" não sofre tal recriminação. Pessach é a Páscoa judaica. Fala em travessia e vida. Seu repasto é o mesmo compartilhado por Jesus e seus apóstolos na Santa Ceia. Primeiro: não se matam animais nas sinagogas, salvo algum ritual ortodoxo tido como bizarro.
Segundo: referir-se a judeus como poderosos remete a uma forma rasteira de antissemitismo, praga que parece em alta. É difícil para um judeu abordar assunto tão doído, mas o artigo do antropólogo e outros episódios recentes, como seminário numa universidade sobre o "apartheid de Israel", levaram-me a um basta. Sou autor do livro Coligay - Tricolor e de todas as cores, um grito pela diversidade. Falar de antissemitismo me é especialmente ardido, como tocar numa ferida de cicatrização precária. Então, vamos por tópicos:
1) Dá para definir o judaísmo num tuíte? O sábio Hillel digitaria: "Não faças ao próximo o que não queres que façam a ti". No mais, há "70 formas" de interpretar a Torá, e deve-se ter a fé monoteísta.
2) Judeus são poderosos? Perseguidos por manter sua cultura em detrimento da fé dominante, a esse povo de intensa coesão étnica era proibido, na Idade Média, trabalhar a terra. Restavam-lhe atividades como a médica e a bancária, vedadas aos cristãos. Pronto: bruxos e usurários! Quando a nobreza se endividou, a solução foi matar o credor, recorrendo à Inquisição, uma das tantas perseguições antissemitas.
3) Têm presença forte na mídia e no entretenimento? Muitos aderiram a essas atividades em razão de uma afeição atávica pelo conhecimento ("um tesouro que ninguém te tira", dizia minha avó sobrevivente do Holocausto) e por serem as que lhes restaram, como no item anterior.
4) Há apartheid em Israel? Os negros, na África do Sul, não tinham extremistas querendo aniquilar uma nação, e os árabes participam da democracia israelense. Sou um entre tantos judeus que defendem dois Estados e discordam das colônias erguidas pelo governo de Israel na Cisjordânia - mas reivindicam o direito de defesa.
5) Alguma conclusão? Os judeus foram expulsos de Israel pelos romanos em 70 d.C. Passaram por perseguições que culminaram no Holocausto. O sionismo, movimento de libertação nacional confundido perversamente com ideários pouco edificantes, preconiza a paz e um Israel seguro - ao lado da Palestina. Ajudem-nos a terminar com tanta incompreensão.
Artigo
Léo Gerchmann: basta de antissemitismo
Leia o artigo publicado na ZH deste sábado
Léo Gerchmann
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