A investigação da morte do torcedor do Novo Hamburgo, Maicon Doglas de Lima, 16 anos, no dia 1º deste mês, já levou quatro policiais militares (PMs) para trás das grades. Destes, três são suspeitos de terem feito os disparos que atingiram o jovem, morto por dois tiros pelas costas. O quarto teria participado da troca de uma das balas removidas do corpo do rapaz. Desde 2012, é o maior número de PMs presos por participação em ações com morte.
Os disparos de munição letal foram admitidos apenas pelo soldado Fabiano Assmann. No dia 4, ele e outro policial, Moyses Stein, tiveram prisão decretada e foram levados para o Presídio Policial Militar. Na sexta-feira, a Justiça autorizou a prisão de mais dois PMs, Angela Peppe Christofari e Ulisses de Matos Quos, por indícios de que podem ter saído da arma deles os tiros que acertaram Lima. Os quatro são do 25º Batalhão de Polícia Militar (BPM) de São Leopoldo.
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Titular da 1ª Vara Criminal de São Leopoldo, o juiz José Antônio Piccoli justificou a prisão afirmando que "novos elementos surgiram nos autos, dando conta de que mais dois policiais efetuaram disparos contra a vítima".
Comando do 3º BPM nega erro de planejamento
O subcomandante-geral da Brigada Militar (BM), coronel Paulo Stocker, não quis comentar as novas prisões. Em entrevista a ZH no dia 4, Stocker disse os PMs são treinados para "o uso progressivo da força e a decisão do tiro".
"Depois que o PM atira, sentença está dada", afirma comando da BM
O tenente-coronel Luiz Fernando Rodrigues, comandante do 3º BPM de Novo Hamburgo, que conduz inquérito policial militar sobre o caso, discorda que a suspeita de três PMs terem atirado configure erro de planejamento:
- Nossa guarnição (do 3º BPM) estava com balas de borracha. Eles (25º BPM) vieram em apoio pela gravidade da ocorrência, por isso tinham munição comum, o que é normal na nossa atuação. Infelizmente, ocorreu esse incidente.
Maicon fazia parte de uma torcida organizada do Novo Hamburgo (Reprodução)
BM contesta necessidade de prisões
A prisão de quatro policiais militares, resultado da investigação da morte de Maicon Doglas de Lima, de 16 anos, é contestada pela Brigada Militar. Apesar da suspeita de que três PMs teriam disparado contra o rapaz, o tenente-coronel Luiz Fernando Rodrigues, comandante do 3º BPM, que conduz inquérito policial militar (IPM) sobre o caso, afirma que as detenções não eram necessárias.
- A essa altura do inquérito, também já tinhamos essa informação, mas não haviam requisitos para a prisão. Não é porque são brigadianos. A prisão é pedida quando há risco de fuga ou de o suspeito atrapalhar a investigação, mas não é esse o caso. O delegado, porém, tem autonomia para pedir e, se a Justiça tem concedido, nós apenas cumprimos a decisão - comentou Rodrigues.
O comandante afirmou ainda que apenas a perícia poderá atestar de qual arma partiram os disparos que atingiram o jovem, mas não há prazo para conclusão do IPM.
A Delegacia de Homicídios de São Leopoldo também aguarda os laudos para confirmar outra suspeita: a que os PMs teriam substituído um dos projéteis retirados do corpo do adolescente. A tese ganhou força quando surgiram imagens das câmeras de segurança do Hospital Centenário mostrando que quatro brigadianos tiveram acesso à sala onde o jovem foi atendido. Veja:
ENTENDA O CASO
- No dia 1º de fevereiro, após o empate em 2 a 2 entre Novo Hamburgo e Aimoré, em São Leopoldo, estourou uma briga entre as torcidas, na estação Santo Afonso, do trensurb, que se estendeu até o bairro Santos Dumont.
- A BM chegou para conter o tumulto. Conforme a ocorrência, os PMs teriam sido recebidos a tiros e revidaram. Os brigadianos do 3º BPM estariam equipados com balas de borracha, porém, guarnições do 25º BPM, que foram apoiar a ação, estavam com munição letal.
- Após a dispersão do tumulto, Maicon Doglas de Lima, 16 anos, foi encontrado na Rua Gaspar Silveira Martins, ferido com dois tiros pelas costas. Levado ao Hospital Centenário, ele não resistiu.
- No início da investigação, em depoimento à Polícia Civil, apenas um PM admitiu ter feito disparos com munição comum, alegando legítima defesa. Surgiu ainda a suspeita de que um dos projéteis retirados do corpo do jovem teria sido trocado pelos brigadianos.
- No dia 3, a polícia divulgou um vídeo de câmeras de segurança do Hospital Centenário, mostrando que quatro PMs entraram na sala onde o adolescente foi atendido. Um médico e uma enfermeira disseram à polícia que eles trocaram a bala com sangue por outra com marcas de concreto.
- No dia 4, a Justiça decretou a prisão de dois PMs envolvidos no caso: Fabiano Francisco Assmann e Moyses Augusto Ribeiro Stein foram levados para o Presídio Policial Militar, na Capital.
- Na última sexta-feira, outros dois PMs foram presos. A Justiça determinou a detenção de Angela Peppe Christofari e Ulisses de Matos Quos por suspeita de que eles também efetuaram disparos contra o adolescente.
ATRÁS DAS GARDES
Nos últimos três anos, apenas um caso provocou a prisão de pelo menos quatro PMs
Dezembro de 1998
- Sete PMs de Novo Hamburgo são presos preventivamente sob suspeita de matar Giovani Konrad, 14 anos, porque o jovem teria executado o soldado Adelar Weber. O policial tinha participado de um confronto que resultou na morte do irmão de Giovani, Odair, de 17 anos. Os sete PMs permaneceram presos por nove meses. Levados a julgamento, três foram condenados.
Março de 2012
- Suspeitos de uma chacina que vitimou quatro pessoas em julho de 2011, quatro PMs de Alvorada são presos temporariamente. As execuções teriam ocorrido para evitar que as vítimas testemunhassem contra um dos PMs, investigado pela BM por cometer crimes. Os PMs fariam parte de um grupo de extermínio que teria matado 10 pessoas na cidade entre 2008 e 2011.