O agricultor Leonir Caldato, 61 anos, deve encaminhar nesta terça-feira uma ação de reintegração de posse da propriedade que possui em Sananduva, no norte do Estado. A área de 7,5 hectares foi invadida por cerca de cem índios na segunda-feira. O grupo permanece no local e, segundo a Brigada Militar, não descarta a possibilidade de invadir novas áreas.
Caldato afirma que tinha a intenção de encaminhar o pedido à Justiça ainda na segunda-feira, pois precisa da terra para trabalhar. Ele e o filho cultivam trigo na propriedade, localizada na comunidade Bom Conselho, e planejavam aplicar fungicida na lavoura nesta semana:
- Se não cuidarmos bem do trigo, não teremos boa produtividade. Com os índios lá, não podemos trabalhar - relata o agricultor.
Os indígenas também invadiram uma residência que estava vazia na propriedade. O grupo reivindica a demarcação de uma área de 1,9 mil hectares em Sananduva e em Cacique Doble. Conforme a Brigada Militar de Sananduva, eles entraram no local armados com flechas e lanças por volta das 18h30min. Antes da invasão, o grupo estava acampado em uma área particular de Cacique Doble.
A Brigada Militar monitora a segurança no local, que é a segunda propriedade invadida no município em menos de três meses. Em julho, os um grupo de 50 índios invadiu uma propriedade na comunidade São Caetano. Uma semana depois, um protesto dos agricultores terminou em uma briga generalizada. O conflito, que teve tiroteio e pedradas, deixou pelo menos quatro pessoas feridas. Três agricultores e um indígena tiveram de ser encaminhados ao hospital.
Vizinhos temem que propriedades sejam invadidas
Os outros moradores da comunidade Bom Conselho temem que suas propriedades também sejam invadidas.
- Uma família está isolada, pois para sair da propriedade eles teriam de passar pela área invadida. Todos estão com medo de que inicie um novo confronto - afirma Sidimar Luiz Lavandoski, representante da Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região Sul do Brasil (Fetraf-Sul) no município.
As entidades representantes dos agricultores se reuniram no final da tarde de segunda-feira para tratar do tema e um novo encontro foi marcado para esta terça-feira. O grupo espera que a Justiça acate o pedido de reintegração de posse e, caso a situação não seja resolvida, deve organizar protestos.
Entenda do caso:
- Cerca de 110 famílias de agricultores de Sananduva e Cacique Doble, no norte do Estado, temem perder 152 propriedades devido a demarcação de terras indígenas nos municípios.
- ­Os índios reivindicam 1,9 mil hectares, onde residem e trabalham agricultores familiares, com propriedades de 12 hectares em média.
- A Fundação Nacional do Índio (Funai) iniciou o estudo preliminar da área em Sananduva e Cacique Doble em 2005 e concluiu o documento em 2009.
- Em 2011, o Ministro da Justiça assinou a portaria que declarou a área como terra indígena.
- Em março deste ano, iniciou o processo de demarcação. Os agricultores, que têm escrituras com mais de cem anos, pretendem lutar na Justiça pelas áreas.
- No início de julho, um grupo de 50 índios invadiu uma propriedade na Comunidade São Caetano e acirrou o conflito agrário no município.
- Uma semana depois, um protesto dos agricultores, com o bloqueio das estradas que ligam o Centro de Sananduva com a comunidade de São Caetano, terminou em uma briga generalizada entre índios e agricultores. O conflito, que teve tiroteio e pedradas, deixou pelo menos quatro pessoas feridas. Três agricultores e um indígena tiveram de ser encaminhados ao hospital.
O conflito agrário no Estado:
- Em todo o Estado, os indígenas reivindicam 100 mil hectares em novas áreas e ampliações de propriedades já delimitadas - o equivalente ao dobro do tamanho de Porto Alegre. Segundo a Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região Sul do Brasil (Fetraf-Sul), isso representaria o desalojamento de pelo menos 10 mil famílias de agricultores.
- As novas áreas e ampliações praticamente dobrariam as terras indígenas já regularizadas ou em regulamentação, contabilizadas em 108 mil hectares. No total, somariam mais de quatro vezes a dimensão da Capital.
- O Rio Grande do Sul é o Estado que apresenta o maior número de áreas indígenas sujeitas a conflito no país, conforme um levantamento do Conselho Indigenista Missionário (Cimi). O relatório demonstra que 17 dos 96 territórios classificados como em situação de risco ou conflito estão localizados em solo gaúcho, o que representa 17,7% do total nacional.