Eles se conheceram naquele clima romântico característico das filas de banheiro. Ela chegou apertada, tomou-lhe primeiro a vez, depois o braço. E, entrelaçados, foram se conhecendo em uma noite de festa que logo teve fim. Foi tão somente por um deslize que se perderam por quatro meses e 17 dias.
Ele achou que ela tivesse fugido. E fugiu mesmo. Só que uma centena de dias se passou, e ela não se esqueceu da barba, do sorriso e da camisa xadrez. E nesses mesmos dias, uma tendência chegou ao Brasil e, nesta semana, agitou timelines de jovens de todo o Rio Grande do Sul. Eram os spotteds, as páginas de Facebook que, como os antigos correios do amor, tentam concretizar relacionamentos platônicos.
Funciona assim: alguém cria um spotted para unir corações de determinado local. É o Spotted+NomeDoLugar. O mural de paixões desencontradas ganha vida na medida em que as primeiras mensagens chegam. Conforme a página vai crescendo, arrebanha legiões de apaixonados e cupidos. Eles se reúnem em uma força-tarefa na procura dos desejados. Uma espécie de "trago a pessoa amada em segundos" (e sem sair de casa). Ah, e é bom que se saiba: admiradores secretos e administradores de spotteds trabalham no anonimato. É por isso que a história que segue omite alguns nomes.
Separamos algumas cantadas de spotteds gaúchos. Vote na sua preferida
Então, como íamos falando, para sorte da garota-fugitiva, duas moças tiveram pressa para entrar nessa onda. E, na segunda-feira, abriram uma oficina de reparo para corações que pararam de bater em alguma festa da Av. Independência, em Porto Alegre. Uma mão na roda para ele que voltou para casa sem saber como se chamava a criatura que derretia na pista de dança; uma segunda chance para ela que até anotou o nome da musa, mas percebeu que bebeu demais quando o que encontrou foi um "Sbshsahn Ahsha" indecifrável no celular.
Nascia o Spotted Independência. E, como centenas de jovens têm feito, a mocinha-fugitiva se arriscou e mandou um recado ao melhor estilo "procura-se". Nele, contava a história do encontro com o garoto da camisa xadrez, que sorria de um jeito bonito, gostava de New Oder e dava aulas de História.
- Vem pra mim!! - ordenava a moça, no pé da declaração.
Instantes, um comentário humorado ingressaria na conversa. Ordem cumprida.
- Oui, c'est moi! (Sim, sou eu!) Sem rancores pela fuga - apresentava-se Lucas La Bella Costa, 22 anos.
Ela o adicionou aos contatos do Facebook. Era mesmo o rapaz. Conversa vai, conversa vem, marcaram um cinema para este fim de semana. E pode ser que, neste exato momento, estejam por aí, entrelaçados pela segunda vez, em um segundo encontro, que Lucas sabia como viria ser:
- Com cara de primeiro!
Mais detalhes ele certamente terá de contar aos usuários do Facebook que rastrearam a rede social e, como resultado, trouxeram cinco possíveis Lucas para a garota. Os cupidos virtuais agora esperam pelas primeiras linhas do segundo capítulo dessa talvez-história.
Uma febre nas universidades gaúchas
Se esta história de recados anônimos pela internet ainda parece confusa, lembre-se das antigas barraquinhas do amor (Alô, Festa Junina!). Como nos antigos redutos dos caipiras tímidos, a essência segue sendo o mais puro sentimento (ou a mais escrachada das cantadas, a mais voraz das intimadas...). A fórmula já é não é novidade.
Talvez seja por isso que trocentas de páginas rapidamente surgiram assim que três estudantes criaram, na noite do último domingo, a Spotted UFRGS, pioneira no Estado. A tendência logo seguiu rumo ao Interior (Spotted UFSM), centralizou interesses de um bairro (Spotted Cidade Baixa), tornou-se relevante para amores certos que desceram na parada errada (Spotted EPTC) e, para todos os outros nichos ainda não contemplados, pode estar por vir sob o título "Spotted Qualquer-Coisa".
No entanto, são poucos os spotteds que atingem a marca de 10 mil likes em menos de quatro dias, como aconteceu com o Spotted UFRGS. Os idealizadores sabem que a abrangência de uma universidade contribui na medida em que concentra interesses parecidos e uma área restrita, que não é grande como uma cidade, nem tão pequena como uma faculdade. Mas creditam o sucesso a um raciocínio bem mais simples:
- São poucos os que esperam um retorno concreto. A maioria está ali para se divertir e massagear o ego dos outros, numa expectativa de que, um dia, possa abrir o Facebook e encontrar alguém massageando o seu também - resume um dos administradores.
Onde tudo isso irá parar? Ainda é cedo para saber. Mas, na dúvida, não pense que sua subversão ao "pegar duas porções de mamão no restaurante universitário" passará despercebida. Não passou. Saiba que alguém estará de olho quando você "complementar o café do bar com água gelada" (já estão comentando no Facebook). E jamais, J-A-M-A-I-S, desdenhe do poder de "uma encoxada descompromissada no ônibus", às 18h, rumo à universidade.
Em tempos de spotted, o melhor é abrir o olho. Numa dessas... PIMBA!