Jorge Luis Martins já teve de se contentar com restos de comida e chegou a ser enxotado de todos os lugares onde procurou abrigo.Dos 10 aos 16 anos,viveu na rua. Até os 13 em Novo Hamburgo, onde nasceu, e o restante em Porto Alegre, para onde foi levado. Em mente, um só objetivo: sobreviver.
O estado deplorável rendeu-lhe o apelido de"Múmia Paralítica". A boa índole, herança da criação que recebeu da avó, Elvira, atraiu pessoas bem-intencionadas. O menino que dormia em uma caixa de sapato assim que nasceu,prematuro de sete meses,ansiava por trabalhar.
Assim que conquistou a primeira oportunidade, não largou mais. A força de sua história fez dele um escritor. A intensidade de sua luta o tornou empresário, dono de uma locadora de veículos, de uma casa de dois andares e terraço,de quatro imóveis para aluguel no Litoral Norte, de um violão e de passaporte carimbado para destinos turísticos desejados.
Aos 53 anos, depois de cursos de teatro e aparições em longas-metragens, Jorge fala da sua trajetória em terceira pessoa. A emoção só bate quando lembra dos parceiros que dividiam concreto na mesma praça no centro de Novo Hamburgo:
- Nunca mais encontrei ninguém. É possível que estejam todos mortos. Eu mesmo fui desenganado, mas me agarrei na promessa que havia feito à minha avó de que não iria virar um marginal.
No colégio,ficou apenas até a quarta série. Depois de adulto, de ter conquistado casa e trabalhado nos mais diversos ofícios - engraxate, taxista, motorista de Kombi escolar, garçom, vendedor de bala e frutas, gerente de hotel a corretor de imóveis - voltou a estudar. Fez supletivo com quase 30 anos, curso de inglês e se formou em Administração, em 2007.
- Meu primeiro emprego foi no restaurante da Assembleia Legislativa, com 14 anos. Ainda dormia na rua, mas dava para pagar uma pensão vez ou outra. Sabia que só o trabalho poderia me salvar - reforça.
Das chances de ser corrompido, Jorge Luis poderia montar um catálogo. Viveu entre traficantes e prostitutas e passou uma temporada de um ano e dois meses no presídio, em 1979.
- Essa foi a única vez em que pensei em tirar a minha vida, fugir para que atirassem em mim. Eu estava preso por uma bobagem, um crime que não cometi.
Nuanças como essas são narradas no livro Meu nome é Jorge, lançado em 2010, pela editora O Sonho da Traça, da qual também é proprietário. A autobiografia já está na terceira edição e o motivou a escrever a segunda obra: O Menino da Caixa de Sapatos, já na gráfica. Seu percurso virou documentário em vias de ser veiculado e já foi sondado para virar filme. O terceiro livro, A Magia do Relacionamento, promete para 2013.
- Reverti todos os sentimentos ruins e as maldades que me fizeram para o bem. É o que tento demonstrar hoje através das palestras. Luto para tentar salvar alguém através da literatura e do meu dia a dia - completa Jorge.