Didi Louzada queria apenas comer uma boa refeição com os amigos. O racismo e o preconceito não permitiram. O jogador da seleção brasileira de basquete e do Sydney Kings relatou em sua rede social o episódio ocorrido há 10 dias em um restaurante na Austrália. Os detalhes prefere não relembrar. Em entrevista exclusiva ao Estadão, o atleta de apenas 21 anos usou a sua voz para se unir ao movimento para combater o mal que sofreu e que é algo, infelizmente, ainda corriqueiro no mundo.
"O racismo existe pela ignorância. Com informação e atitudes, vamos conseguir mudanças", afirmou o jogador, que está tomando providências sobre o episódio, mas que não quer expor os detalhes pela imprensa. Escolhido no Draft da NBA de 2019, sendo trocado pelo Atlanta Hawks para o New Orleans Pelicans, o brasileiro comenta sobre como imagina que será a sua segunda temporada no basquete australiano (ainda sem previsão para começar), da seleção brasileira que ainda luta para ir aos Jogos Olímpicos de Tóquio e da expectativa de ser chamado para atuar na maior liga de basquete do mundo.
O que fazer para combater o racismo, algo que está enraizado na sociedade?
O racismo é algo que precisa ser combatido, eliminado da sociedade. Mas não é fácil. Infelizmente, é um comportamento que está enraizado na sociedade, como você falou, e precisamos conscientizar as pessoas do mal que isso provoca, da dor e da tristeza que causa em milhões e milhões pelo mundo. Não é apenas um ato. E não é "só" um ato. Racismo, preconceito ou discriminação, seja lá contra quem for, pela cor, pelo credo, pela opção sexual, isso é inadmissível nos dias de hoje. E acontece todos os dias. Todos temos que levantar a voz, especialmente para os mais jovens, mostrar que precisamos acabar com as diferenças, porque não somos diferentes. Precisamos agir.
Neste sentido, como viu o comportamento dos jogadores da NBA, que atuaram fortemente contra o racismo na última temporada (principalmente na bolha), inclusive boicotando um jogo?
Foi importante. Foi necessário. A liga se posicionou, as equipes se posicionaram e isso aconteceu por uma motivação dos atletas. É mais do que um comportamento, é um exemplo de entendimento, de respeito. Tivemos muitas vozes ativas e me orgulho de estar num esporte que dá exemplo, vendo como os atletas, que são cidadãos antes de serem esportistas, se posicionaram, como conseguiram construir um movimento que ganhou o mundo e fez diferença. O "Black Lives Matter" foi um marco, foi histórico. O racismo existe pela ignorância. Com informação e atitudes, vamos conseguir mudanças. Não há mais espaço para esse tipo de comportamento.
Falando agora de basquete, como está sua expectativa para o início da temporada na Austrália?
Não vejo a hora de entrar em quadra e jogar. Estou com saudade da bola. Esse foi um ano difícil para todo mundo, mas é bom ver que, aos poucos, mesmo com todas as limitações, com os cuidados que precisamos ter nessa rotina que mudou bastante, as coisas estão voltando. Estou muito motivado para essa temporada, um ano de compromissos importantes não apenas aqui na Austrália, mas com a seleção brasileira também.
Acredita que já é o momento de voltar? Como lidou com o momento mais crítico da pandemia?
Acredito que a competição só comece com um planejamento bem feito, com protocolos que não ponham riscos equipes e todos os profissionais envolvidos. Temos muitos exemplos de esportes, em vários países, que estão retornando, recomeçando, a própria "bolha" da NBA, que servem de exemplo e passam segurança. Eu saí daqui de Sydney poucos dias antes das coisas fecharem, do "lockdown", para voltar ao Brasil. Assim que cheguei no Espírito Santo, fiquei em quarentena em casa, tomando todos os cuidados. Consegui adaptar uma programação para treinar sozinho por alguns meses e me manter ativo, isso foi importante demais para que eu amenizasse as perdas por não ter um treinamento adequado em razão da pandemia.
O que aprendeu em sua primeira temporada por aí?
Aprendi muito dentro e fora de quadra. Aprendi bastante com a experiência de ser um estrangeiro, na questão da cultura, da língua, do dia a dia, e aprendi muito dentro de quadra, com relação ao jogo, ao entendimento, estou trabalhando forte para melhorar em vários aspectos e me tornar um jogador cada vez mais completo. Todos me receberam muito bem, jogadores, equipe, torcida, estou muito feliz.
Como encarou a decisão do New Orleans Pelicans de deixá-lo mais uma temporada na Austrália?
Tenho conversado sempre com o pessoal dos Pelicans, eles estão acompanhando os meus passos aqui na Austrália. Quero aproveitar ao máximo essa temporada pelos Kings, continuar o que construímos no ano passado para chegar em condições de disputar o título da temporada.
Está ansioso para jogar na NBA? Há um plano de quando isso vai acontecer?
O meu foco está apenas no Sydney Kings nesse momento. Tenho o objetivo de chegar à NBA, claro, mas estou concentrado aqui na Austrália, motivado para fazer uma grande temporada. A NBL é uma liga forte, muitos jogadores estrangeiros, um nível altíssimo de competitividade e estou evoluindo o meu jogo. Tenho muito a crescer ainda e vou trabalhar ainda mais forte esse ano.
Tem conversado com o técnico Aleksandar Petrovic? Qual sua expectativa para o Pré-Olímpico?
Estou bem confiante. Temos um time forte, de muita qualidade e muito unido, jogadores mais experientes, com muita bagagem, outros mais jovens, mas já com rodagem, uma mescla que é importante para o grupo. O Pré-Olímpico vai ser duríssimo, é um torneio curto, adversários fortes e não podemos errar. Tenho certeza de que vamos fazer uma excelente preparação, temos condições de conquistar a vaga para levar o Brasil aos Jogos de Tóquio.
Como vê o fato de ser apontado até pelo Petrovic como o futuro da seleção brasileira?
Fico feliz, agradeço muito pelo carinho e pela confiança que o Petrovic deposita em mim. Tenho muito orgulho em representar o Brasil, era um sonho que eu tinha quando mais novo e uma honra poder fazer parte da seleção brasileira. Tenho apoio de todos, aprendo muito a cada convocação, em especial com os mais experientes, e o Petrovic tem uma atenção especial com os mais jovens, dando apoio e passando confiança.