Vá a qualquer canto das Filipinas. Qualquer vilarejo. Qualquer praia. Mesmo uma igreja. É provável que você veja uma camiseta de basquete. "Muitas vezes, ele é descrito como uma religião", declarou, durante uma entrevista, Carlo Roy Singson, diretor administrativo da NBA Filipinas. De fato, o basquete está enraizado na cultura filipina e tem sido assim por mais de um século.
O esporte se difundiu nesse país de cerca de 105 milhões de pessoas no fim dos anos 1800, quando a Espanha cedeu as Filipinas aos Estados Unidos, em 1898, após a Guerra Hispano-Americana.
Uma faceta importante da introdução do jogo incipiente foram os missionários cristãos, que faziam parte da YMCA, ou Associação Cristã de Moços. O inventor do jogo, o dr. James Naismith, concebeu o esporte no que era então conhecido como a Escola Internacional de Treinamento da YMCA, em Springfield, Massachusetts.
Naismith imaginara um jogo em que um objeto redondo seria lançado dentro de um aro, uma empreitada capaz de construir o caráter de uma pessoa. Logo depois de sua invenção, missionários começaram a difundi-lo ao redor do mundo, particularmente no Extremo Oriente e nas Filipinas, em áreas controladas pelos Estados Unidos – uma espécie de imperialismo esportivo.
A NBA e seus jogadores, reconhecendo a popularidade do esporte nas Filipinas, têm investido tempo no país nos últimos anos. Em 2013, as equipes Houston Rockets e Indiana Pacers jogaram uma partida da pré-temporada lá.
De acordo com um porta-voz da liga, a página da NBA no Facebook tem 7,3 milhões de seguidores das Filipinas, o maior número fora dos Estados Unidos. Stephen Curry já visitou o país múltiplas vezes.
Seu colega de equipe, Klay Thompson, gravou uma mensagem de vídeo em 2015 direcionada especificamente aos fãs filipinos. Diversas emissoras, incluindo Fox Sports e Solar, transmitem 30 jogos ao vivo por semana durante a temporada regular. Dois dos nomes mais notáveis de descendência filipina na NBA são Jordan Clarkson, defesa do Cleveland Cavaliers, e Erik Spoelstra, técnico do Miami Heat.
Tudo isso começou no início dos anos 1900, quando o basquete foi introduzido nas escolas do país. Em 1913, o primeiro Campeonato do Extremo Oriente – versão embrionária do que hoje é conhecido como Jogos Asiáticos – se realizou em Manila, com a participação de muitos países do Ásia Oriental competindo no estilo olímpico, com muitas modalidades, incluindo o basquete. Foi o primeiro de dez eventos bienais, até que conflitos entre os países desmantelaram os jogos. As Filipinas levaram o ouro em nove deles.
No Campeonato mundial da Fiba de 1954, as Filipinas ganharam uma medalha de bronze, a melhor colocação de um país asiático. Duas décadas depois, em 1975, foi criada a Associação Filipina de Basquete, primeira liga de basquete asiática.
A população do país adotou em massa o basquete. Em 1936, a seleção nacional conseguiu disputar os jogos Olímpicos e chegou ao quinto lugar, terminando em 4-1 no torneio. No Campeonato mundial da Fiba de 1954, as Filipinas ganharam uma medalha de bronze, a melhor colocação de um país asiático. Duas décadas depois, em 1975, foi criada a Associação Filipina de Basquete, primeira liga de basquete asiática. Esses jogos mantiveram o esporte na linha de frente da cultura filipina e ajudaram a aumentar o interesse ao longo do século XX.
"Isso é a minha vida! Isso é a minha vida!", proclamou um fã de basquete, Teddy Garces, após seu time, o Rain or Shine Elasto Painters, ganhar o Jogo 6, empatando a série de semifinais da Copa da Associação de Basquete Filipina de 2019 com o Magnolia Hotshots Pambansang Manok em uma noite de sexta-feira em abril. Garces, fã do jogo há 30 anos, passou a maior parte da noite em movimento, pulando da sua cadeira na primeira fileira para cima dos painéis de publicidade toda vez que um jogador do Rain or Shine pontuava.
Do outro lado da quadra, Ehla DeJesus, de 17 anos, e sua irmã, Rochellyn, de 9, se mexiam em contraponto a Garces. As irmãs pulavam e dançavam cada vez que o Magnolia Hotshots acertava uma cesta. A energia de Garces, das irmãs DeJesus e dos outros sacudiu o Ynares Center, na cidade de Antipolo, até o último lance da partida.
Mais cedo naquele dia, os devotos do basquete do país inteiro pararam por causa do Jogo 6, a mais de 12.875 quilômetros de distância, quando o Denver Nuggets enfrentou o San Antonio Spurs na primeira rodada das eliminatórias da NBA.
Em Tondo, uma favela de Manila, o pescador Joel Galigar tentava desesperadamente conectar a antena da TV para que pudesse assistir ao jogo com sua família. Acompanhar jogos da NBA de manhã cedinho é seu ritual quase diário.
Mas, após tentar e não conseguir ajustar a antena, e finalmente receber a ajuda de um vizinho que chegou para o resgate com um caixa de cabo emprestada, Galigar e sua família de seis pessoas assistiram ao jogo no minúsculo barraco em que vivem e que mal se sustenta de pé. Logo depois do início do jogo, os vizinhos começaram a se aglomerar em volta do local, tentando ver um pouco do jogo.
Durante toda a semana, cenas parecidas são vistas em Quezon e Manila. Nas manhãs com partidas da NBA, quase todas as casas visitadas por Lee estavam assistindo ao jogo. Empresas viram a oportunidade. Em 2013, a Nike levou LeBron James ao país para uma visita curta. Curry fez nas Filipinas a primeira parada da turnê Under Armour Asian. Foi sua segunda visita.
Em uma manhã recente de sábado, em um beco estreito e debaixo de uma grande quantidade de varais de roupas, Randy Fausto estava vestindo a camisa de Curry enquanto jogava a versão filipina da sinuca e assistia a um jogo do Golden State Warriors por uma janela.
Fausto disse que a camisa era um amuleto da sorte. Quando o jogo do Warriors terminou, os homens se dirigiram a uma quadra próxima, a Asamba Covered, onde Romeo Naguiat estava jogando. Naguiat está desempregado e joga diariamente, inclusive em uma liga local.
De volta ao centro de Manila, Gil Tandoc, seu filho de sete anos, Michael, e a filha de nove, Elgene, trabalhavam na loja de conveniência da família, ao lado do Complexo Penitenciário Municipal de Manila. A loja vende bolas de basquete.
Enquanto Michael e Elgene atiravam incansavelmente a bola de basquete contra a cerca ao redor da entrada do presídio, detentos e guardas dentro da cadeia estavam ocupados se preparando para o torneio de basquete deles.
Subindo pela costa, chega-se à cidade de Navotas, onde outras partidas se realizam nos lugares mais improváveis. À medida que o sol começa a se pôr e o calor fica mais ameno, os jogadores – tanto adultos quanto crianças – saem para jogar no Cemitério de Navotas entre os "conjuntos de tumbas", caixas de concreto empilhadas usadas para abrigar os mortos.
Foi ali que Renalto AbAdies, de 21 anos, morador de uma favela adjacente ao cemitério, jogou em uma noite recente. "Não tenho medo dos mortos", garantiu AbAdies, que contou ter passado a vida inteira jogando ali.
Nas Filipinas, o jogo está em todos os lugares.
Por Sopan Deb