Um dos maiores nomes da história do tênis, o espanhol Juan Carlos Ferrero está em Porto Alegre. Líder do ranking mundial da ATP e campeão de Roland Garros em 2003, o ex-jogador trabalha como técnico, além de ter uma academia de tênis há mais de duas décadas.
Com 39 anos recentemente completados e aposentado desde 2012, Ferrero é responsável pela carreira do jovem Carlos Alcaraz, 15 anos, que é apontado como uma das grandes promessas para o futuro do esporte. Antes, ele chegou a treinar o alemão Alexander Zverev, um dos expoentes da nova geração do tênis mundial.
Em 14 anos como profissional, o espanhol acumulou quase US$ 14 milhões em prêmios, venceu 16 torneios de ATP e ainda disputou outras 18 finais. Viveu o auge em 2003, quando ganhou seu Grand Slam na França e, durante oito semanas, liderou o ranking mundial.
No intervalo entre os jogos e treinos na Associação Leopoldina Juvenil, uma das sedes da Brasil Juniors Cup, a antiga Copa Gerdau, que está sendo disputada esta semana em Porto Alegre, Ferrero conversou com GaúchaZH e falou sobre sua relação com o Brasil, as memoráveis semifinais de Roland Garros contra Guga, o atual momento do esporte e também elegeu o melhor de todos os tempos.
O que você faz no momento, após 14 anos como jogador profissional?
Eu tenho minha academia na Espanha faz 25 anos, e de lá já saíram alguns jogadores profissionais. Desde setembro passado, eu tive a oportunidade de trabalhar com Carlos Alcaraz, que é natural de Murcia. Ele tem muita qualidade, um grande nível, apesar de ter apenas 15 anos. Trabalhar com um garoto de 15 anos desde tão pequeno é algo que me motiva, depois ter trabalhado com o Zverev, que à época era o número 5 do mundo. Trabalhar com um jogador assim, a margem de erro é bem pequena.
Quais as principais diferenças entre trabalhar com um profissional e um juvenil?
Com um jogador que já está pronto, as coisas são mais profissionais. O circuito é mais profissional, se joga torneios que são muito bons, a forma de viajar é diferente, os treinamentos são diferentes. Com um jovem, se faz um trabalho completo físico, porque está crescendo, mentalmente tem que trabalhar muito, e em quadra também.
Você enfrentou o Guga em cinco jogos e venceu três, incluindo a final do Masters de Roma de 2001. Mas as derrotas foram nas semifinais de Roland Garros.
As duas derrotas que tive foram muito, muito importantes. Foram duas semifinais que me custaram dois Grand Slams. Acredito se tivesse ganho estas duas semifinais, eu seria favorito nas finais, assim como o Guga, que me ganhou e venceu os dois Roland Garros.
A sua relação com o Brasil vai além dos confrontos com o Guga, não?
Eu tenho uma casa na Bahia, na praia (Costa do Sauípe). É um país a que venho bastante. Minha relação com o Guga sempre foi muito boa. Agora, sempre nos vemos quando vamos a Roland Garros. O Brasil é um país muito próximo, pelo idioma, pela forma de ser das pessoas, muito parecida com a Espanha, e por isso os espanhóis aqui se sentem muito bem.
Voltando aos jogos contra o Guga em Roland Garros, é possível dizer que a derrota na semifinal de 2000, quando você vencia por 2 a 1 e depois liderou o quinto set em 3/1, foi a mais doída?
Foi uma partida em que estive bastante perto da vitória. Já na segunda semifinal, apesar que durante a partida estive sempre à frente, porém no final dos sets, ele acabava me ganhando e me venceu por 3 sets 0. E, no final, foi um jogo mais fácil para ele do que o primeiro.
Você ganhou um Grand Slam (Roland Garros de 2003) e foi vice outras duas vezes (Roland Garros de 2002 e Aberto dos EUA de 2003). O que vencer um torneio desses muda na carreira de um jogador?
Eu acredito que, quando alguém ganha um Grand Slam, torna-se um jogador um pouco diferente. Um Grand Slam é o objetivo principal de todos os jogadores. Eu acredito que ser número 1 do mundo é uma consequência de estar jogando bem, ganhar muitas partidas, títulos. E naquele ano (2003), ganhei Roland Garros, fui finalista do US Open. Acredito que para um jogador é mais importante ganhar títulos do que ser número 1 o tempo todo.
Se pegarmos os maiores nomes da história, como Federer, Nadal, Djokovic, Borg, Sampras e outros, é possível elaborar um ranking?
Eu creio que não. Os jornalistas são muito de números. Eu acredito que cada época tem sua forma de jogar, os materiais que se utilizam nas quadras, as bolas são diferentes. Existem muitas coisas que têm que se ter em conta, não só o nome. Então, as épocas são muito diferentes. Hoje, os jogadores são fisicamente muito mais fortes do que antes, porque o mundo evolui, os filhos são cada vez maiores e o tênis hoje em dia perdeu um pouco o valor da construção das jogadas na quadra. Hoje, joga-se muito para destruir, com pouca tática, e o jogo se perdeu taticamente, se pensa pouco para ganhar algumas partidas. Tem muita gente que só joga de uma maneira. Se está bem, ganha. Se está mal, perde. Eu acho que antes se jogava diferente. Jogadores como Federer, Rafa (Nadal) e Djokovic, que começaram a jogar 10, 12 anos atrás, jogavam de uma maneira e foram crescendo, evoluindo. O Rafa agora joga muito mais agressivo, porque os jogadores jogam muito mais rápido, e isso não o beneficiou para jogar, por exemplo, contra o Federer. Jogar tão rápido é melhor para Federer e para Djokovic. Antes, ele jogava com mais spin, alto e mais lento, e isso o ajudava a ganhar mais partidas. Mas são épocas, e fazer comparações sobre quem foi melhor, se Borg, Federer, Lendl, Edberg ou outro, a mim pessoalmente não agrada.
Sem ranking, então. Qual foi o jogador mais completo que você viu dentro de uma quadra?
Para mim, Federer é o melhor da história. Não só pelos números, mas pelo nível dos golpes, tecnicamente, mental é muito bom. Por isso, é o jogador mais completo que vi. Apesar de que, quando o Djokovic está 100%, é um jogador muito, muito difícil de ganhar, inclusive para Rafa, que é um jogador canhoto, que incomoda sempre este tipo de jogadores. Mas, para mim, o melhor da história é Roger (Federer).
Você acredita que a experiência que teve em quadra ajuda na hora de orientar jovens jogadores?
Eu acredito que um treinador que tenha jogado, que tenha sido bom, tenha um pouco de vantagem. Pode perceber algumas coisas que quem não esteve jogando não pode viver. Todo momento que meu jogador está sentindo na quadra, eu creio que é bom passar todas as experiências que tive para que ele não venha a passar e sentir como novidade, como por exemplo jogar finais de torneios importantes, ou na hora de começar Challengers, um Grand Slam. Todas estas experiências eu vivi e sempre é mais fácil de passar.