Enquanto o esporte paraolímpico de ponta do Brasil recebe altos investimentos – somente em 2016, o Comitê Paraolímpico Brasileiro (CPB) trabalhou com um orçamento de R$ 114 milhões vindos das loterias federais (Lei Agnelo/Piva) –, as associações que revelam jovens talentos do paradesporto gaúcho vivem em uma realidade bastante diferente. A baixa adesão da iniciativa privada aos projetos e a burocracia do poder público são alguns dos obstáculos apontados pelos profissionais que atuam nessas entidades. Para enfrentar esse cenário, parcerias e criatividade são recorrentes.
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Na Associação de Cegos do RS, o judô sobrevive graças a uma parceria com a UFRGS, pelo projeto de extensão Bugre Lucena. Como a Acergs não tem locais próprios de treinamento, a equipe utiliza as instalações da Faculdade de Educação Física, Fisioterapia e Dança (Esefid). Toda a estrutura de professores e coordenadores pertence à universidade. Em caso de lesão, a clínica de fisioterapia é utilizada pelos paratletas.
– Quando a associação recebe verba de algum projeto em que ela se inscreve, e, no momento, não estamos sendo contemplados com nenhum, a gente consegue oferecer material e remunerar professores. O custo das passagens para as competições do judô do segundo semestre do ano passado, por exemplo, foi bancado pela própria UFRGS. Aqui em Porto Alegre, temos alguns atletas do judô que também treinam no Grêmio Náutico União – diz Glailton Wincler da Silva, vice-presidente da Acergs.
Futebol de 5, futebol de baixa visão, goalball e atletismo também são oferecidos pela entidade, em esquema semelhante de parcerias. Desde o ano passado, a Associação luta para destravar uma verba da lei de Incentivo ao Esporte, do governo federal, que está parada: cerca de R$ 300 mil.
– Tínhamos um projeto que contemplava a remuneração de professores, custeio de passagens aéreas e compra de materiais. Era um edital do Ministério do Esporte, que vencia em março de 2016. Como sobrou esse valor, apresentamos um pedido de aditivo. Em abril, recebemos a autorização. Só que, com a troca do governo, a documentação ficou trancada e hoje esse dinheiro está parado na conta – conta Glailton.
Na ONG Esporte +, que Alexandre Barbosa representa, seis professores atuam de forma voluntária e se revezam entre as três modalidades disponibilizadas: natação, atletismo e bocha paraolímpica. Os treinos são nas piscinas do Lindoia Tênis Clube e na pista do parque Alim Pedro, ambas cedidas sem custos. Por ter apenas um ano de fundação em ata, a ONG ainda não pode participar de editais governamentais – o tempo mínimo exigido são dois anos.
– Para adquirir os materiais, a gente organiza feiras, rifas, recolhemos lacres de latinhas para vender. Conseguimos tudo na base da parceria. As pessoas que nos ajudam confiam no nosso trabalho. Até porque mostramos muito a nossa cara. Tudo que envolve a ONG é muito aberto. Nossos treinos, por exemplo, são abertos para quem quiser acompanhar. E a gente faz questão que as pessoas que se propõem a nos ajudar estejam sempre por perto. Então, acho que isso gera credibilidade e a corrente do bem acaba crescendo – diz Fernanda.
A ONG RS Paradesporto também depende de parcerias para seus treinos, já que não tem sede própria. São cinco os esportes paraolímpicos oferecidos aos jovens: basquete, tênis de mesa, bocha, atletismo e rúgbi. Cíntia Moura, diretora-técnica, queixa-se da falta de investimento no Estado:
– Não existe nada de incentivo. Não temos bolsa-atleta. A verdade é que o nosso Estado é muito mal visto no movimento paraolímpico, justamente por essa falta de investimento. Temos excelentes atletas, mas não temos apoio. Muitos que se destacam acabam sendo contratados para competir por outros Estados.
A Secretaria Estadual de Cultura, Turismo, Esporte e Lazer (Sedactel) rebate a versão de que não investe em paradesporto. Gelson Pires, diretor de esportes do órgão, afirma que, além de um calendário anual de competições, as entidades têm à disposição recursos do Pró-Esporte – programa por meio do qual o governo abre mão de ICMS para que as empresas da iniciativa privada invistam em projetos esportivos. Gelson, no entanto, reconhece que é preciso um trabalho de sensibilização junto aos empresários para aumentar o número de patrocínios no Estado.
– Estamos definindo com as entidades ligadas ao paradesporto ações para que as empresas que já investem em esporte patrocinem também as atividades esportivas voltadas para as pessoas com deficiência. Por outro lado, é importante que as associações apresentem projetos viáveis. Em 2016, por exemplo, foi aprovado pela Câmara Técnica do Pró-Esporte apenas um projeto – argumenta Gelson.
Sobre o fato de o RS não pagar bolsas a seus atletas – paradesportistas ou não –, Gelson Pires diz que a ideia está sendo discutida pelo governo. Os recursos viriam de um fundo do Pró-Esporte.
Já no âmbito nacional, o governo oferece bolsas para atletas, divididas nas categorias base, estudantil, nacional, internacional, olímpico/paraolímpico e pódio. Para fomentar o paradesporto no país, há ainda a Lei de Incentivo ao Esporte, que permite que empresas e pessoas físicas invistam parte do que pagariam de Imposto de Renda.
* ZHESPORTES