A direita continua afiada como sempre, mas a nova esquerda, demolidora, nem o recordista de títulos de Grand Slams esperava que provocaria tamanho estrago no outro lado da quadra.
Depois de seis meses afastado por lesão no joelho esquerdo, um renovado Roger Federer vem assombrando o circuito de tênis, ao exibir novos golpes aliados a uma forma física invejável até mesmo para garotos saídos dos juvenis.
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Reverenciado como o Goat (Greatest of All Time, o maior de todos os tempos, em inglês) por fãs espalhados pelo mundo, o suíço de 35 anos já conquistou os três principais torneios da temporada – Aberto da Austrália e Masters 1000 de Indian Wells e Miami – e deixou um exemplo no esporte: até mesmo os gênios devem perseguir a evolução.
E pensar que o fim da carreira do suíço quase foi precipitado por um prosaico incidente doméstico em janeiro do ano passado. Durante o preparativos do banho das filhas gêmeas Myla e Charlene, então com sete anos, Federer ouviu um estalo no joelho esquerdo.
Após Wimbledon, em agosto, o tenista decidiu encarar a mesa de cirurgia pela primeira vez na carreira e encerrar a temporada. Com dúvidas em relação ao futuro nas quadras, o próprio Federer revelou recentemente que pensou em pendurar as raquetes:
– Tive uma conversa com minha mulher (a ex-tenista Miroslava Vavrinec, a Mirka) e apenas perguntei: "O que você acha, eu devo parar?". E ela respondeu: "Não, de jeito nenhum. Porque você não vai parar desse jeito, preparando um banho para as meninas".
Ao mudar de equipamento e de técnico e adotar uma postura agressiva, jogando ainda mais dentro da quadra e batendo na subida da bola, Federer praticamente anulou um de seus pontos vulneráveis, o backhand (movimento da raquete com as costas da mão virada para frente).
Foi justamente explorando a chamada esquerda do suíço que Rafael Nadal, seu adversário mais temido, conseguiu vencer dois a cada três duelos travados contra ele.
Isso até Federer mostrar o novo repertório. Nos últimos três confrontos, o tenista da Basileia bateu o espanhol com autoridade e reduziu a antiga freguesia – a vantagem ainda é de Nadal: 23x14. O que era o calcanhar de Aquiles de Federer virou arma mortal.
Na final do Aberto da Austrália, disparou 14 winners (bolas vencedoras) com o backhand, superando o velho rival nos pontos mais importantes.
Parte da explicação dos ótimos resultados na 20ª temporada de Federer entre os profissionais se deve ao uso de uma raquete com cabeça maior, que aumenta a potência mas reduz a precisão dos golpes, uma desvantagem compensada com o talento incomum da atual número 4 do mundo.
Sob orientação do croata Ivan Ljubicic, um ex-adversário das quadras, o suíço também aprimorou a devolução dos saques e próprio serviço. Para especialistas, o "novo" Federer é ainda mais completo do que o "velho" Federer, responsável por levantar 12 troféus de Slam e permanecee 237 semanas consecutivas na liderança do ranking da ATP entre 2004 e 2008 .
– Tecnicamente, ele evoluiu. Emocionalmente, também, pelo jeito que está brigando pelos pontos. Além disso, está muito bem preparado fisicamente, mostrando que não tirou férias (após a cirurgia) – afirma o diretor do site Tenisbrasil, José Nilton Dalcim, que acompanha o circuito há mais de 30 anos.
Tenista que mais tempo ficou no topo do ranking, Federer dá sinais de que a retomada do posto não está entre suas prioridades no momento. Depois do título em Miami, há duas semanas, anunciou que só volta às quadras em Roland Garros, no fim de maio. Com isso, saltará toda a temporada de saibro europeia, incluindo três torneios Masters 1000. O objetivo é se preservar para Wimbledon – seu torneio preferido – e o Aberto dos EUA.
Na avaliação do ex-tenista e atual comentarista da ESPN Fernando Meligeni, a busca por novos títulos nos maiores torneios é o que realmente motiva o suíço:
– Não tenho a menor dúvida, ele está lutando para ampliar seu recorde. O que realmente vale para os tenistas, o que mais respeitamos, é o número de títulos de Grand Slam, não é que ficou mais tempo na liderança do ranking.
*AFP