Prestes a completar 10 anos de serviços prestados como dirigente do Juventude, o empresário Roberto Tonietto foi eleito na noite deste terça-feira pela primeira vez como presidente do clube. Em 2006, ele começou como diretor financeiro, e no ano seguinte tomou frente de um projeto que prometia ser ainda maior do que tinha sido a parceria com a Parmalat, iniciada nos anos 1990 e que rendeu os três maiores títulos da história centenária do Ju: campeão da Copa do Brasil de 1999, campeão gaúcho de 1998 e campeão da Série B do Brasileirão em 1994.
A frustração na negociação quase selada com a Red Bull fez o dirigente se afastar por alguns anos, até voltar em 2010, justamente na temporada em que o clube foi rebaixado para a Série D nacional. Em 2012, foi convidado para participar da gestão do atual presidente Raimundo Demore, novamente com liberdade para criar novos projetos. Então, em 2013 veio a segunda frustração de uma parceria milionária não fechada com a OAS.
Aos 49 anos, Tonietto não se deu por vencido. Apesar de relutar o cargo de mandatário alviverde nos últimos dois meses, aceitou o desafio de salvar o Esporte Clube Juventude de um colapso financeiro. Desta vez, com um projeto próprio e sem depender dos milhões de multinacionais. Pela mudança no estatuto do clube, o mandato do novo presidente será de um ano. Tempo que ele espera encerrar com um futuro promissor para o Juventude.
Pioneiro: Todos sabem que a situação financeira do Juventude é terrível. Qual é o planejamento para recuperar o clube?
Roberto Tonietto: Faz dois meses que estamos trabalhando e buscando alternativas para o clube. Inclusive já contratamos uma empresa de consultoria de Porto Alegre. Fizemos um plano de curto prazo, outro de médio prazo e um plano de longo prazo. O Profut caiu muito bem porque vai nos dar todas as negativas necessárias do nosso patrimônio para fazermos os negócios que queremos. A área do Estádio Alfredo Jaconi, por exemplo, está avaliada em R$ 90 milhões. A área do CT, nas margens da Rota do Sol, vale uns R$ 30 milhões. O clube não consegue se sustentar porque tem muita coisa para manter. Não podemos ter esse patrimônio todo para gerar despesas com manutenção. Precisamos é gerar renda. Não é vender o patrimônio, é gerar renda. A gente pode negociar um terreno para o mercado imobiliário e ficar depois com 50% das salas construídas pelo empreendimento, por exemplo. Se pegarmos só a área do estádio para fazermos negócios com empreendimentos imobiliários, podemos projetar uma renda mensal de cerca de R$ 450 mil. Com essa renda e mais outras receitas, o clube se torna sustentável, perene, e não dependeria mais de resultado de campo para sobreviver. Esse é o plano a longo prazo, fazer o patrimônio que hoje é imobilizado gerar renda.
Como isso tudo vai funcionar na prática?
- Nós temos três opções para salvar o Juventude: a primeira é continuar com o Estádio Alfredo Jaconi, modernizar o entorno e usar só essas áreas em volta do estádio para fazer negócios com empreendimentos imobiliários. A segunda opção é desmanchar o estádio para negociarmos com um grande empreendimento imobiliário e construirmos uma arena só do Juventude nos terrenos desabitados do CT. A terceira opção é fazer uma arena única em Caxias do Sul em parceria com o Caxias, com a prefeitura e quem mais quiser, para que cada clube possa negociar seu estádio. Eu, Roberto Tonietto, acho uma bobagem a gente ter dois estádios em Caxias do Sul. Fazendo uma conta rápida, nós jogamos umas 30 partidas por ano aqui, o que equivale a 60 horas de uso em 365 dias. Isso com um nível de ocupação no estádio de 17%. Agora, isso tudo vai ser estudado, documentado e depois levado para votação no Conselho Deliberativo. Não sou eu quem vai decidir, é o Conselho. Mas esse é um projeto a longo prazo, de uns cinco anos para estar no meio do caminho ou concluído. Não conversamos com o Caxias e nem com a prefeitura, ainda não é o momento para isso. Primeiro, vamos fazer um estudo e depois, conforme for, buscar essa aproximação. Claro que nada impede de termos conversas informais antes disso.
A venda de talentos da base costuma salvar o clube quando ele está no sufoco, mas o custo é muito alto. Qual é o plano para a base nesse processo de reestruturação?
- O plano a médio prazo é aumentar o ganho com a categoria de base. Nos últimos anos, nosso gasto médio foi de R$ 1,8 milhão por ano com a base. Agora, estamos baixando esse custo para R$ 1,3 milhão. E a receita é R$ 2,2 milhões, que gera um lucro de cerca de R$ 400 mil, o que consideramos pouco por ano. O problema não é o custo, é a venda. Pela produção que a gente faz, por revelar jogadores para a dupla Gre-Nal, é o custo que se paga mesmo. O problema é que somos obrigados a negociar novos talentos por valores baixos para tapar os furos imediatos, como salários atrasados e tal. Nós pretendemos buscar uma parceria com um clube grande, seja ele do centro do país ou da Europa, para viabilizar a categoria de base. O clube investidor, que poderia colocar, por exemplo, 100 mil euros por mês, ficaria com parte do percentual dos atletas. Nós não venderíamos no sufoco e lucraríamos com vendas maiores depois. A ideia é fechar com um parceiro já em 2016 ou, no máximo, em 2017. Estamos fazendo conversas preliminares, mas precisamos fazer o material para mostrarmos os números para o investidor quando o interesse surgir de fato.
O que é possível fazer para resolver as pendências financeiras a curto prazo?
- O plano a curto prazo é o que mais nos deu dor de cabeça. Fechamos agora o quarto mês de salários atrasados. Nós temos 40 hectares no CT, mas muito disso está penhorado por questões trabalhistas. Temos 15 hectares de área não construída e que podemos mexer, nas margens da Rota do Sol. Estou criando um grupo de investidores a toque de caixa para fazer uma parceria com o clube. Não é comprar os terrenos, é uma parceria com o Juventude. Esse grupo vai colocar um dinheiro imediato no clube que vai nos permitir pagar todos os atrasados e outras coisas, e a partir daí vai investir na área para construção de alguns empreendimentos, que ainda não estão definidos os ramos de atuação. Mas o resultado de toda essa operação vai gerar depois de pronta uma renda de 50% de tudo para o Juventude.
E como ficam os problemas imediatos, como salários atrasados?
- Outra questão a curto prazo é o corte no orçamento. Teremos redução salarial dos jogadores, baixando a folha em cerca de 20%. No clube todo, a redução vai ser de 30%. Vamos fazer um grande corte na estrutura do clube. Infelizmente, não é uma coisa legal para ninguém, mas temos que fazer. Alguns casos de salários estão fora do padrão, de funcionários antigos e tal. São pessoas honestas, trabalhadoras, mas é uma questão de sobrevivência do clube e vamos ter que demitir. Isso me dói, mas não tem mais o que fazer. O Paulo Baier, por exemplo, não vai ficar para o Gauchão, não houve acordo. Ele tinha contrato até o final do Estadual, mas vamos fazer a rescisão agora. O teto salarial de um atleta vai ser de R$ 17 mil. Ninguém vai vir por mais do que isso. Com o Profut, ou o clube se readequa ou não dá para seguir. Não vamos entrar zerado para 2016 porque temos questões trabalhistas e cíveis para resolver, mas pretendemos colocar em dia as questões salariais e pagar as primeiras rescisões.
Quanto o Juventude precisaria hoje para pagar salários atrasados e rescisões de funcionários?
- R$ 3 milhões, mas não vamos ter isso tudo agora. Acho que de 70% a 90% vamos conseguir pagar. O resto vai ter que ficar para janeiro, início de 2016.
Se for escolhido desmanchar o Estádio Alfredo Jaconi para fazer negócios imobiliários, certamente vão aparecer diversos críticos. Muitos torcedores não vão gostar. Como lidar com isso?
- Daqui a uns 10 anos esse torcedor vai passear com seu netinho na frente onde era o Jaconi, que não vai ter mais porque foi todo penhorado, e vai dizer assim: "aqui existia o estádio e um time de futebol". A história vai ser essa. Infelizmente, de história ninguém vive. Se não tomarmos uma atitude agora, o clube não vai sobreviver.
Dessas três opções para salvar o Juventude, qual é a de sua preferência?
- O meu gosto é o que der mais lucro para o clube. Eu acho que vai ser a arena, mas é preciso ver o que vai indicar o estudo. No achismo não dá para afirmar nada. Também não quer dizer que sejam essas três opções. Essas são do meu modo de ver. Talvez o estudo que vai ser feito por essa empresa de consultoria, uma empresa conceituada, que mexe com cerca de R$ 20 bilhões, aponte outras opções. Podem não ser três ideias, mas quatro, cinco ideias. Tudo vai depender de números.
Como está o quadro social e quanto isso vai ajudar nesse novo planejamento do clube?
- Se os sócios derem uma ajuda para nós, esse plus do associado entraria direto na veia do futebol. Temos pouco menos de 4 mil sócios ativos. A ajuda do sócio é vital nesse processo.
Há dois meses você declarou que não seria o presidente. O que o fez mudar de ideia?
- Não tinha intenção de continuar no Juventude e nem de ser presidente. Inclusive, a minha empresa fez uma fusão recentemente e me perguntaram se eu ia continuar no Juventude ou não. Mas é que essa situação do clube me deixou muito incomodado. Isso estava acabando comigo, de chegar no clube e já ver o porteiro com salário atrasado. Isso estava acabando comigo. E largar o clube nessa situação, seria pior ainda. Aí comecei a pensar, pensar, passei domingos em reunião. A ideia era achar uma solução, fazer um projeto, mas aí veio a pressão para que eu assumisse e fui convencido.
Você já participou de negociações frustradas do Juventude com grandes empresas, como a Red Bull e a OAS. Há um temor de fracassar nesse novo planejamento?
- Agora, a diferença é que isso está nas minhas mãos, nas mãos do Juventude. Não depende da Red Bull, não depende da OAS, depende do Juventude. Então, é muito mais fácil alcançar isso aqui. É um plano menor do que a Red Bull tinha, é um plano menor do que a OAS tinha, mas agora é um plano do Juventude. É uma solução caseira.
Qual é o objetivo principal para 2016? Conquistar o acesso ou resolver a questão financeira?
- Jamais vou dizer que não é o acesso, mas o meu objetivo é deixar o clube sanado financeiramente ao final de 2016. Para mim, isso é mais importante do que o acesso. Se perguntar agora o que eu gostaria de ganhar de presente, se o acesso à Série B ou o clube sanado, eu respondo que quero o clube sanado. Com isso, o resto vai vir depois, fica um legado para novas gestões.
Gestão para 2016
Novo presidente do Juventude, Roberto Tonietto tem planos para negociar parte do patrimônio do clube
A curto prazo, o mandatário vai fazer cortes de 30%. A longo prazo, sonha com uma arena
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