O martírio começou quando veio a escalação, com Bernard no lugar de Neymar. Essa escolha é o emblema do conceito que precisa ser revogado para os próximos aniversários do 7 a 1 doerem menos. Não pelo pobre Bernard, que não tem culpa de nada e pode até voltar à Seleção. O futebol é coletivo. Refiro-me ao que a escolha representa. O Tulio Milman, sentado ao meu lado no Mineirão, é testemunha. Levei um susto.
Só poderia dar certo na base do pensamento mágico, foi o que disse ao Tulio. A camisa 20 era a mesma usada por Amarildo em 1962, quando Pelé se lesionou e a Seleção, ainda assim, triunfou no Chile. Tal lembrança criou asas nas tribunas de imprensa e logo se espalhou pelo estádio. O jogo era em BH, casa de Bernard. Os torcedores rapidamente lembraram que seu conterrâneo é driblador. Como Garrincha, há meio século.
Fazia todo o sentido. Fé. Hino. Lágrimas escorrendo pelos vincos de milhões de rostos emocionados. O complexo de viralatas às avessas. Brasil. A pátria de chuteiras condenada ao êxito. Pra Frente, Brasil!
Só que a alegria nas pernas tinha virado melancolia durante a preparação na Granja Comary. Se Bernard marcou dois gols em rachão foi muito. Repeti isso algumas vezes em meus boletins na TVCOM, quando perguntado sobre o azougue de um ano antes, na enganosa Copa das Confederações.
A reserva no Shakhtar abafara aquele driblador ligeiro do Atlético-MG. Sua escolha para substituir Neymar passou por cima deste dado real, prático, científico, da rotina dos (poucos) treinos. Uma miserável olhada nas anotações do dia-a-dia em Teresópolis, se é que havia anotações, chegaria a esta conclusão.
A escolha por Bernard se baseou também na arrogância. Magia + arrogância = 7 a 1. É quase como decidir o substituto do craque se baseando em feitiçaria e superioridade no DNA. Carlos Alberto Parreira, no primeiro dia de trabalho na Granja, vendeu a ideia - comprada e repetida por todos - de que o Brasil era favorito. Com a torcida cantando ouviram do Ipiranga às margens plácidas? É nóis, mano. Por que, então, se reforçar com Paulinho, para marcar a máquina que troca passes em progressão, recheada de jogadores de habilidade forjados em uma década de execução de um criterioso plano de reinvenção do seu futebol?
Como dissera Zagallo em 1974, a Holanda é que tem de nos marcar. Lá, igualmente não vimos a cor da bola. Só houve o rosário humilhante de gols tipo Micronésia, mas o fiasco foi parecido. Dezenas de jornalistas, eu entre eles, disseram antes, em seus espaços, que Paulinho ao lado de Luiz Gustavo e Fernandinho era exigência da sensatez naquela circunstância dramática. Mas isso implicava calçar as sandálias da humildade.
O Brasil perderia com Paulinho, mas duvido que naquele clima de vira em cinco, acaba em 10. A vida se faz de escolhas. A Seleção fez a sua, há um ano. Está na hora de outra, que pode ser transformadora: chega de tanta prepotência. Não somos mais os melhores, e temos de nos comportar como tal. O futebol brasileiro é medíocre, mediano mesmo. É minha modesta sugestão para o exorcismo do 7 a 1.
Acorda, Brasil.
*ZHESPORTES