Aos oito anos de idade, após dois lutando contra um problema na visão, Ricardo Steinmetz Alves ficou cego. Na época, acreditava que era o fim do sonho de ser jogador. Hoje, aos 25, o melhor do mundo do futebol para cegos, recém sagrado campeão mundial pela segunda vez na carreira, utiliza-se da memória visual da infância para fazer os movimentos que o transformam em craque.
- Fora do esporte eu lembro de muita coisa: cores, formato das coisas...Para o futebol, acho que isso me ajudou muito, porque as pessoas sempre me dizem: "parece que tu tá enxergando.." - afirma Ricardinho, atleta da Associação Gaúcha de Futsal para Cegos (Agafuc) e da seleção brasileira, em entrevista a ZH. Ele completa:
- Quando eu comecei a treinar, tinha aquilo bem vivo na minha memória. Mesmo sem enxergar, eu aplicava o mesmo movimento. O jeito de chutar a bola, dar um passe, um drible. Aquilo ficou em mim. Tenho certeza de que todo o atleta cego que já enxergou tem muita vantagem sobre os outros.
Para que Ricardinho chegasse ao patamar de hoje, seu pai teve participação decisiva. Por conta da deficiência do filho, trouxe toda a família de Osório para Porto Alegre. Queria inscrevê-lo no Instituto Santa Luzia, referência no ensino em braile.
Foi lá que o craque reencontrou o futebol. Nas escolinhas do Santa Luzia, logo ficou evidente que Ricardinho estava acima da média. Aos 12, já atuava contra meninos de 15, 16, 17 anos. Com 15, foi convocado pela primeira vez para a seleção brasileira. Um ano depois, em 2006, foi eleito revelação e melhor jogador do Mundial, vencido pela Argentina.
Daí em diante, a carreira decolou. Em 2010, foi campeão mundial pela primeira vez. A essa altura, sua rotina era totalmente dedicada ao futebol. Atualmente, treina em dois turnos, com forte ênfase na preparação física e no aprimoramento técnico:
- Eu me dedico só para o futebol. O negócio está totalmente profissionalizado, com preparação física muito forte, o pessoal está priorizando muito isso. Todo o acompanhamento é bem profissional.
A dedicação de Ricardinho e seus companheiros resultou em mais uma conquista, o Mundial encerrado nesta segunda-feira, em Tóquio, no Japão, com direito a vitória sobre a rival Argentina na final.
- Foi um jogo muito duro. Tem muita rivalidade, sem dúvida. Não teve deslealdade, mas foi muito pegado nas divididas. E aquela catimba do lado deles. Eles procuram sempre um fator adicional, gostam de alguma coisa além do "jogo jogado" - relembra.
Um gol de Jefinho na prorrogação foi suficiente para despachar os hermanos e assegurar a quarta conquista brasileira na competição. Tudo com a participação decisiva de Ricardinho, algo que ele não poderia imaginar quando ficou cego.
- Eu tinha esse sonho de ser jogador quando tinha cinco, seis anos. Na época, eram duas coisas difíceis para mim: perder a visão e pensar que eu não poderia mais jogar futebol. Aconteceu tudo muito rápido na minha vida - surpreende-se.